45. Liberdade! Liberdade!
Jober Rocha*
“Liberdade! Liberdade! Abre as asas sobre nós e que a voz da igualdade seja sempre a nossa voz...”, assim iniciava o samba enredo da Escola de Samba Imperatriz Leopoldinense, no carnaval do Rio de Janeiro de 1989, samba este de autoria dos compositores Niltinho Tristeza, Preto Jóia, Vicentinho e Jurandir.
O sentimento de liberdade, como nós podemos ver, é intrínseco a todos os indivíduos e tem sido cantado em prosa e em verso ao longo da História Humana; muito embora, como tal, estejamos fadados a jamais sermos livres da forma como entendemos e pretendemos.
Esta ideia de liberdade que temos, nós devemos tê-la trazido conosco do mundo espiritual. Devido ao fato de que, quando encarnados, perdermos todas aquelas características possuídas enquanto sob a forma de espírito, sentimos falta da principal delas constituída pela liberdade, que desfrutávamos na dimensão de onde viemos.
Assim é que, quando encarnados, passamos a ter um corpo a impedir que nosso espírito percorra, imediatamente, as mais longínquas distâncias e as mais distantes épocas, bastando, para tal, apenas, desejar estar presente em algum lugar e em alguma época. Temos em nosso corpo cinco sentidos que, por serem poucos e não muito desenvolvidos, ao mesmo tempo em que nos possibilitam perceber o mundo material que nos cerca, nos escondem inúmeros aspectos etéreos da criação, aspectos estes que apenas percebemos quando sob a forma espiritual; já que, nossos sentidos não são suficientes para detectá-los.
Por outro lado, quando encarnados, não sabemos mais qual a nossa missão naquela existência (para preservar o nosso mérito individual) e, por não sabê-la, seguimos caminhos que muitas vezes nos conduzem ao sofrimento, nosso e daqueles com quem convivemos ou interagimos.
Ademais destas limitações físicas pelas quais passa o nosso espírito ao encarnar, ainda conta ele com as limitações impostas pela vida social. Em sociedade, dada a natureza dialética do processo de evolução, a tônica é a existência de conflitos entre os seres humanos; conflitos estes que, superados, conduzem, em síntese, a nossa evolução material e espiritual. Para balizar os conflitos que surgem, naturalmente, na vida em sociedade, existe todo um aparato de normas, de leis e de costumes, que delimitam direitos e impõem deveres aos indivíduos. Chegou-se, assim, ao longo da História, às máximas que afirmam que “o nosso direito termina quando começa o dos outros” e que “nós não devemos fazer aos outros, aquilo que não queremos que nos façam”.
Outra razão, que faz com que a eventual liberdade do indivíduo seja cerceada, diz respeito à existência da desigualdade, como bem perceberam os compositores do samba enredo mencionado. A desigualdade (tenha ela a característica que tiver), ao mesmo tempo em que permite o cerceamento da liberdade de alguns seres humanos, possibilita a expansão da liberdade de outros.
A única maneira de vencer a desigualdade é através da fraternidade, como magistralmente perceberam os revolucionários franceses de 1789, ao escolherem por lema da sua revolução as três palavras já mencionadas: liberdade, igualdade e fraternidade. Vejam que sem igualdade não haverá liberdade e que sem fraternidade não existirá igualdade. Estas três palavras não foram escolhidas ao acaso pelos revolucionários de então, e possuem, com toda a certeza, seus significados esotéricos e exotéricos.
Ainda outra questão, associada à liberdade, diz respeito à existência ou não de Livre-Arbítrio. Para inúmeros filósofos e cientistas (antigos, modernos e pós-modernos), este não existiria, vigorando o Determinismo com relação a nossa existência humana. Para outros, no entanto, a existência não seria regida pelo Determinismo, mas, sim, pelo Livre-Arbítrio.
Na minha modesta opinião, nossa existência seria pautada por um Determinismo (para nós totalmente desconhecido e que diria respeito às nossas grandes decisões), em razão de haver nossa missão, nesta vida material, sido estabelecida previamente, quando ainda estávamos sob a forma espiritual (segundo o que a maioria das religiões postula, ao afirmarem elas que encarnamos e reencarnamos com o objetivo de evoluir espiritualmente e de resgatar Carmas de vidas passadas). Nosso Livre-Arbítrio, que também possuiríamos, diria respeito, apenas, às pequenas escolhas que faríamos ao longo de nossas vidas e que não interfeririam com o Determinismo sobre os grandes eventos de nossas existências, que traríamos conosco já ao encarnar.
Vejam que não escolhemos as datas do nosso nascimento e da nossa morte, nem a família a que pertencemos e, muito menos, o Município, o Estado e o País em que nascemos. Não escolhemos o nosso corpo, nem a nossa aparência e o nosso caráter. As principais coisas que afetarão a nossa existência, durante a vida toda, foram, desta forma, determinadas não por nós mesmos após encarnados; mas, sim, determinadas antes de encarnarmos (talvez, até, por nós ou com a nossa aquiescência sob a forma espiritual e visando, sem dúvida, à nossa evolução e, certamente, contando com a assessoria e o aconselhamento dos chamados ‘espíritos de luz’, conforme atestam ainda muitas religiões). Destas determinantes, entretanto, não saberíamos por perdermos a memória da vida espiritual, ao encarnarmos. Segundo alguns, teríamos de nos basear na intuição, para tentarmos resgatar aspectos deste Determinismo para nós desconhecido.
A própria mudança do local onde nascemos e vivemos, ao longo da existência, pode fazer parte desta intuição, a nos conduzir para outros lugares do planeta, tentando nos aproximar daquele onde melhor poderíamos alcançar o nosso objetivo de desenvolvimento espiritual.
Foi a ideia do Livre-Arbítrio, segundo o filósofo Nietzsche, que ensejou a criação do chamado pecado, da forma como definido pelas religiões; já que, podendo escolher entre a virtude e o vício, os pecadores seriam aqueles que teriam optado pelos vícios. Ocorre que, em épocas e em sociedades distintas, aquilo que é considerado como um vício, em uma época e em uma sociedade, poderá ser uma virtude em outras e a virtude, por sua vez, ser considerada como um vício. O próprio filósofo advertia que, mediante uma transvaloração de valores, promovida normalmente pelas elites que detém o poder (mas não necessariamente por elas), o que era virtude poderia passar a se constituir em vício e vice-versa.
Ademais disto tudo, existe, ainda, outro aspecto importantíssimo a limitar a nossa liberdade, aspecto este que trata da forma como as elites e os governos (seus prepostos) falseiam, distorcem e escondem informações importantes, objetivando influenciar as nossas escolhas e a nossa maneira de ver o mundo e de entender como as coisas se passam na realidade. Técnicas de Propaganda e Marketing, Informação e Contra-Informação (fazendo uso das Ciências, como a Medicina, a Psicologia, a Sociologia, a Economia, a Informática, a Eletrônica, etc.), são desenvolvidas e aperfeiçoadas para coletar dados individuais, divulgar informações falsas, modificar gostos, pontos de vista, costumes, valores e a própria moral, buscando conduzir os rebanhos humanos para onde estas elites desejam.
Como visto até agora, a liberdade, embora ansiada por todos nós da espécie humana, ainda está muito longe de ser obtida da forma utópica como a sentimos e como gostaríamos de desfrutá-la. Vivemos a grande maioria de nós, na realidade, em uma servidão consentida, alternando trabalho e lazer, emprego e desemprego, saúde e doença, felicidade e infelicidade, alegria e tristeza.
A grande maioria de nós não se dá conta desta servidão, pensando ter liberdade para determinar e assumir as suas grandes escolhas durante a breve existência. Quando os desejos e as aspirações que tínhamos não se realizam, atribuímos o fato ao acaso, ao destino, ao pouco esforço que fizemos ou a falta de fé, olvidando que, em maior ou menor grau, somos todos servos de senhores desconhecidos (quer quando ainda encarnados, quer já sob a forma espiritual), realizando missões cujo alcance e objetivos maiores também desconhecemos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário