113. Vivemos todos em cativeiro, em uma servidão consentida?
Jober Rocha*
Perdoem-me os leitores, mas a indagação contida no título deste texto é, sem dúvida alguma, pertinente. Comparo a raça humana com as demais espécies animais: algumas destas espécies nascem em liberdade nas matas, campos, rios, lagos, lagoas e mares e, eventualmente, são, mais tarde, capturadas e passam a viver em cativeiro; outras espécies já nascem em gaiolas, jaulas, currais, etc. No que toca aos seres humanos, apenas alguns poucos, pertencentes às elites mundiais, podem afirmar, taxativamente, que nasceram em liberdade por estarem acima das leis, das fronteiras e das convenções sociais; todos os demais nasceram em cativeiro, quer tenham consciência disto quer não tenham.
Comparo os demais seres humanos (evidentemente, me refiro àqueles que não pertencem às elites livres mencionadas) aos pássaros nascidos em gaiolas. Estes, por terem nascidos desta forma, não percebem que poderiam ter nascido de outra maneira, em meio a Natureza. Caso pudéssemos penetrar em seus minúsculos cérebros e entender seus pensamentos, veríamos que se creem absolutamente livres para cantar, para beber e se alimentar quando quiserem e, até mesmo, para se balançarem nos poleiros das gaiolas em que eventualmente se encontram (e onde passarão o resto de seus dias), para serem vistos e para enriquecerem, com seus belos cantos e plumagens, a existência daqueles que são os seus senhores.
Com os seres humanos, não pertencentes às elites mundiais, se passa a mesma coisa; ou seja, eles acreditam possuir, a partir do momento em que chegaram a este planeta, o mundo inteiro por limite ou fronteira. Creem-se com liberdade para ir aonde desejarem, para escolher a profissão que quiserem, para decidirem sobre as suas próprias vidas; em suma, creem-se donos dos seus destinos. Como os pássaros nas gaiolas (e também como os prisioneiros na fábula da caverna, de Platão), tais seres não percebem as grades das suas celas, representadas pelos condicionantes que os cercam e delimitam as suas existências, fazendo com que o mundo deles se resuma, também, naquelas gaiolas (ou naquela caverna) onde os seus ocupantes imaginam serem livres, mas, no entanto, apenas, enriquecem com as suas obras, seus conhecimentos e as suas artes, as elites dominantes. Ao longo da História Humana é um fato notório e reconhecido que os filhos de escravos nascidos em cativeiro, não possuíam (ao contrário dos seus pais) aquele sentimento de perda da liberdade, que caracteriza os seres que em alguma ocasião já foram livres; aceitando, como filhos de escravos, voluntariamente a servidão.
Com o transcorrer da existência dos seres humanos, as grades das gaiolas ou as limitações e os condicionantes da liberdade real de escolhas individuais fundamentais ficarão, cada vez, mais evidentes; embora muitos ainda continuem sem os perceber. Estes condicionantes e limitações podem ser de dois tipos: alguns deles são exógenos ao desejo prévio, consciente, dos próprios indivíduos e outros são exógenos aos desejos dos indivíduos e das elites que os dominam. Como exemplo destes últimos, podemos citar: a família em que o indivíduo nasceu; as suas próprias características físicas, psicológicas e intelectuais; o país, o estado, o município e a cidade em que nasceu e viveu; o seu caráter, a sua raça, a sua cor e a sua aparência. Estes condicionantes possuem a característica de serem determinísticos e não dependerem nem dos indivíduos que os possuem nem da liberalidade, maior ou menor, das elites que os dominam, pois foram determinadas de forma exógena, isto é, antes do nascimento daquele ser humano e, talvez, em outra dimensão ou plano de existência. Os primeiros condicionantes, embora não percebidos ou considerados como tal pela maioria das populações, fazem parte de decisões e do arbítrio das elites e contribuem para limitar as liberdades e as possibilidades de escolhas individuais.
As próprias leis que regem as sociedades e os seus sistemas econômicos, políticos, financeiros e sociais, em que se estruturou a vida humana e que fazem parte do chamado Contrato Social, estudado por Jean-Jacques Rousseau, foram estabelecidos e são controlados, cada vez com maior intensidade, pelas elites mundiais dominantes, Ocidentais, Islâmicas e Sino-Soviéticas. As elites ocidentais conseguiram unir-se de forma mais rápida e objetiva do que as outras duas; porém, o objetivo almejado, por elas, é o de que todas se unam em um futuro globalizado, no qual os 193 países reconhecidos pela ONU, em 2015, serão reduzidos para apenas 10, com a fusão ou a incorporação de diversos deles em um só. Estudos mostram que são poucas famílias, proprietárias de não muitas empresas, que controlam todo o dinheiro e o maior montante, em valor, daquilo que é produzido e comercializado a nível mundial.
Voltando às liberdades, constatamos que, na atualidade, ninguém pode deixar o seu país e nem entrar em outro, legalmente, sem um passaporte e, para inúmeros destinos mundiais, sem possuir, ademais, o correspondente visto de entrada do país para onde vai. Para obter o passaporte, em seu próprio país, o cidadão não pode estar respondendo a processos judiciais criminais, ter sido condenado ou possuir dívidas com o fisco. Na maior parte dos países, os cidadãos oriundos de outros países e que possuam curso superior, são proibidos de trabalhar nas suas profissões, podendo, apenas, desempenhar funções subalternas, como aquelas destinadas aos imigrantes legais ou aos refugiados e asilados políticos.
Em muitos países, os turistas e os imigrantes não podem se deslocar livremente por todo o território; mas, devem, antecipadamente, obter autorização para tanto. Em uma economia monetária todos necessitam do dinheiro, obtido através do trabalho. Para trabalhar os indivíduos necessitam de profissões, obtidas em escolas e universidades, regidas e regulamentadas por sindicatos, conselhos de classe e associações profissionais. Sem pertencer a estes, as suas chances de emprego são reduzidas e, caso eles trabalhem sem autorização, poderão ser processados e presos pelo exercício ilegal de profissão.
Em seus próprios países muitos indivíduos sofrem restrições de toda ordem, seja em função do nível de renda, da cor, da raça, da religião, da escolaridade, etc., não sendo livres, portanto, para fazerem aquilo o que desejam, para trabalharem onde querem ou, até mesmo, para se relacionarem afetivamente com pessoas por quem se interessaram. Aqueles que estão dentro do Sistema sofrem, ademais, as restrições adicionais impostas pelas leis, que não atingem os que vivem à margem destas, a não ser quando são aprisionados nas operações policiais.
Alguns seres humanos conseguem escapar ao Sistema Dominante, como aqueles animais que fogem das jaulas ou os pássaros que fogem das gaiolas; mas, em um mundo globalizado, estes fugitivos não conseguirão ir muito longe. As próprias elites dominantes possuem gradações, algumas mais importantes e mais acima, outras intermediárias e algumas menos importantes e mais abaixo. Os dominados também têm as suas gradações: uns são prepostos das elites com a função de governar os demais dominados, situados abaixo deles.
A chamada Nova Ordem Mundial, organização criada por determinadas elites ocidentais, têm procurado reduzir, cada vez mais, as possibilidades dos indivíduos escaparem ao Sistema Ocidental de Dominação. Após promoverem a união dos países da Europa Ocidental, com a criação de uma moeda única para todos eles; a criação de tribunais mundiais e organizações econômicas, financeiras e militares, também de caráter ocidental; pretendem implantar a religião mundial (cuja primeira igreja já foi edificada na Alemanha) e instituir a obrigatoriedade de todos os cidadãos ocidentais portarem um chip subcutâneo, contendo seus principais dados médicos e financeiros, dentre outros, além de conter um GPS que possibilitaria a localização do indivíduo em qualquer lugar do mundo onde estivesse. Os cartões de credito, os telefones celulares, a internet e os chips embutidos em muitos produtos (inclusive nos passaportes), permitem que os indivíduos sejam monitorados onde quer que estejam, sem que disto se apercebam. As notícias vindas da China e da Rússia indicam que, por lá, as coisas caminham no mesmo sentido, em que pesem as ameaças de retorno da Guerra Fria com o Ocidente.
Isto tudo pode parecer, à primeira vista, fazer parte da ficção e do futurismo de George Orwell; mas não é este o caso. O assunto é muito sério e, na atualidade, muito do que aqui foi dito já está vigorando, ou em vias de vigorar, em muitos lugares do mundo.
_*/ Economista, M.S. e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
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