10. As revoltas, as revoluções e a denominada Lei Social Historicamente Determinada**
Jober Rocha*
O termo revolução é usualmente definido como uma mudança abrupta no poder político ou na organização estrutural de uma sociedade, que ocorre em um período de tempo relativamente curto. O conceito de revolução teria surgido no século XV; embora, desde os tempos dos filósofos gregos, Aristóteles já tivesse discorrido sobre a modificação de uma Constituição existente ou mesmo sobre a sua completa alteração e reformulação.
As revoluções iniciam-se, normalmente, através de revoltas; motivadas estas por razões de ordem econômica, política, social, infra-estrutural, cultural, etc.
O estudo da história dos povos, dos países e das nações, permite estabelecer comparações e ilações, entre estes e os seus congêneres, conforme as épocas e os principais fatos políticos, econômicos e sociais neles ocorridos. Isto não significa que o desfecho de situações semelhantes seja sempre igual; já que, fatores imponderáveis e supervenientes podem atuar (e, por vezes, atuam), contrariando aquilo que alguns filósofos e historiadores costumam denominar de Lei Fundamental da História ou de Lei Social Historicamente Determinada (notadamente Karl Marx, um dos filósofos que menciona esta suposta lei no que respeita a chamada luta de classes). Caso exista verdadeiramente esta Lei Fundamental da História, inúmeros países, inclusive o nosso, inexoravelmente, ao passarem por situações idênticas àquelas pelas quais passaram outros, como, por exemplo, a Itália no século XV (assolada, que foi, por guerras civis e revoluções, em razão das condições econômicas, políticas e sociais vigentes), terão seus destinos e seus futuros moldados pelo mesmo processo e da mesma forma violenta como a que ocorreu com aquele país naquela oportunidade.
A situação vivida pela Itália, na época em destaque, pode ser caracterizada pelo seguinte quadro:
• As autoridades municipais subsistiam ainda, mas quase sem outra atribuição senão a de satisfazer as ávidas exigências do fisco, que era o fim de todas as medidas e de onde derivavam todos os erros e todas as misérias.
• Impostos lançados com uma cobiça insensata secavam as fontes da propriedade privada, puniam a indústria, desanimavam a agricultura. O menor operário era obrigado a um imposto pesado demais para ele; todo objeto de consumo e todo produto comercializado sofriam taxas exorbitantes, a tal ponto que as fábricas pararam de produzir, que o campo ficou sem ser cultivado, que os povoados foram arruinados por dívidas e, a cada instante, as comunidades ou cidades eram obrigadas a dirigirem suas queixas ao poder central distante, que não as escutava.
• Por falta de ocasião para conviver dignamente, os valores individuais degeneravam em furor brutal e não se manifestavam senão em ataques a mão armada e em latrocínios. Uma polícia mal mantida e mal preparada era insuficiente contra os bandos que infestavam as cidades e os campos. O governo, se por umas vezes combatia estes bandos, por outras capitulava e, até mesmo, com eles compactuava. Os homens maus asseguravam-se da impunidade, vivendo sob as ordens de alguma autoridade, a que emprestavam seus serviços para delitos cometidos por estas próprias autoridades; como também, para que obtivessem segurança depois de seus atentados contra homens inofensivos e do bem.
• Uma parte dos empregos públicos vendia-se e a restante era conferida a homens ignorantes e venais. A habitual incapacidade do governo era atestada pelos comissários que ele criava, de quando em quando, com poderes muito amplos e dos quais estes agentes abusavam.
• As elites políticas, não tendo forças para lutar contra o governo, nem generosidade para se unir ao povo, afastavam-se, cada vez mais, com seus títulos e seu fausto desta massa plebéia em que residia a vida do país, passando a maior parte do tempo a transferir recursos para outros países e a gastar suas riquezas no exterior. Toda entregue às suas rivalidades de preeminência, elas consideravam uma glória a ociosidade, uma vergonha a indústria. Poderosa, ainda, por suas relações, tiranizava uma populaça a qual desprezava, votando, sem medida, impostos de que seus privilégios a isentavam.
• O Poder Central vendia terras e traficava com investiduras e privilégios de modo a sustentar as suas excessivas despesas. Da mesma forma nomeava os magistrados, do que resultava que a vida e a fortuna dos cidadãos estavam entregues aos seus caprichos.
• As paixões, odientas e arrebatadas, a que se deixava livre curso e, inclusive, incentivava, chegavam a decompor os elementos da nacionalidade. Uma região passava a odiar as vizinhas, uma raça detestava as demais, uma classe abominava as outras.
• Aqueles que não obedeciam às leis formavam bandos e eram protegidos pelas comunidades em que atuavam; comunidades estas cujos membros não desejavam perder a vida nas mãos dos chefes destes bandos. Os governos na falta de meios para reprimir estes latrocínios, conferiam poderes exorbitantes para milicianos, chefiados por gente com experiência em lutas e combates; pessoas estas que, abusando de seus poderes, causavam mais danos às comunidades do que os próprios bandidos.
• Edificavam uma multidão de igrejas suntuosas e de prédios sem finalidade e de mau gosto, enquanto o país não tinha portos e as suas estradas eram precárias. Cidades solicitavam empréstimo para a construção de molhes em seus deficientes portos e não eram atendidas. Em vão, municípios argumentavam que, pela falta de pontes sobre vários rios, todos os anos se afogavam pessoas e reses que tentavam a travessia; bem como, a produção tinha dificuldade de chegar às cidades e aos consumidores.
• Em meio a tudo isto, terríveis pestes, moléstias e epidemias acometiam as populações famintas e empobrecidas; sem contar os cataclismos ambientais que, ocasionalmente, ocorriam em terra e no mar, ceifando vítimas e destruindo propriedades e bens.
- Acho que já vi este filme! Vou me preparar para os combates! – Com certeza irão afirmar alguns dos meus leitores, convictos (ou não) da existência de uma Lei Fundamental da História...
_*/ Economista, M.S. e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
_**/ Publicado na Revista Ideias em Destaque nº 47, jan/jul 2016. Instituto Histórico e Cultural da Aeronáutica - INCAER. Rio de Janeiro, RJ.
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