sexta-feira, 13 de maio de 2016

2. Pela volta dos censores, mas ao estilo romano...

Jober Rocha*

A censura consiste em uma atividade bastante antiga na história da humanidade. Relatos de historiadores indicam que a figura do censor (cargo executivo e político da Roma antiga), já vigorava desde o antigo Reino de Roma (735 a.C a 509 a.C), existindo durante a República Romana (508 a.C. a 270 a.C) e persistindo até o Império Romano, quando, no ano de 22 d.C, esta magistratura foi extinta por Augusto e as suas atribuições passaram a ser desempenhadas pelos próprios imperadores. Dentre as funções dos censores romanos, constavam as de expulsar os membros indesejáveis e corruptos do Senado e a de fiscalizar a conduta moral dos cidadãos. Conhecendo-se a venalidade dos senadores de muitos países, na atualidade, podemos imaginar que aqueles de Roma, durante a existência dos censores, talvez não fossem muito diferentes e poderemos, assim, imaginar que o imperador Augusto, ao extinguir aquela magistratura e assumir ele mesmo as funções de censor, talvez, estivesse pensando na instituição, na Corte Imperial Romana, de algo muito parecido com o denominado ‘mensalão’ brasileiro; ou seja, estivesse maquinando a implantação de uma ‘menstrua cibaria’, na versão vulgar para o latim, que tomei a liberdade de fazer.
Na China antiga, muito antes do nascimento de Confúcio (551.a.C a 479 a.C.), já existia a função de censor, parecida em certos aspectos com a do censor romano; ali, no entanto, eles foram estabelecidos para, fundamentalmente, se oporem à arbitrariedade dos reis com relação aos súditos. A coragem daqueles censores de então, contra a tirania na China, era admirável (quase igual a dos filósofos, naquela mesma oportunidade), seja quando criticavam os excessos dos reis, seja quando padeciam os seus castigos. Um dos censores da época, querendo queixar-se ao rei de um ato deste (coisa que fora proibida pelo soberano e punida com a pena capital), foi ao palácio real carregando seu próprio caixão e (pasmem), após apresentar a queixa, voltou morto estendido dentro dele.
        A censura religiosa, por sua vez, definida como o ato de suprimir pontos de vista contrários à religião organizada, vem agindo, desde longa data, sobre a liberdade de expressão, seja controlando seja limitando a mesma, com base em uma suposta e alegada autoridade divina. Intensamente praticada, em muitas sociedades e por muitas religiões, têm sido responsável pelo atraso científico e filosófico de muitos povos, em distintas épocas, ao acusar aqueles que contradizem os seus dogmas ou tabus religiosos de blasfemos, heréticos ou sacrílegos.
       No que respeita a censura estabelecida pelos governos, na atualidade e a nível mundial, as mais comuns são aquelas exercidas sob as seguintes formas: proibição da publicação de biografias não autorizadas; proibição de filmes e desenhos considerados violentos ou ofensivos às raças e às religiões; limitação do uso das redes sociais no ambiente de trabalho; classificação etária para produções audiovisuais e espetáculos públicos; a imposição, através da mídia, do comportamento politicamente correto; as pressões exercidas pelo governo sobre a Mídia para que não divulgue matérias contrárias aos seus interesses, etc.
        Para esconder uma justificativa político-ideológica, os governos utilizam discursos moralizantes, que agem sobre o censo comum das pessoas. Muitas atividades da censura obedecem, verdadeiramente, a critérios racionais e de preservação da moral e dos bons costumes; entretanto, outras constituem nítida violação de princípios constitucionais, como, por exemplo, o de livre expressão.
         Por sua vez, a vigilância nas redes sociais, seja para impedir a divulgação de matérias, seja para coletar dados individuais do usuário, quebrando a privacidade dos indivíduos (estes últimos objetivos mais voltados para interesses na área da espionagem eletrônica e digital), é atividade rotineira de governos e de entidades nacionais e internacionais. As fontes de financiamento governamentais, para produções de conteúdo artístico, também são utilizadas como mecanismo de censura velada. A desinformação e a contra-informação são, ainda, formas de censura bastante utilizadas pela Mídia nacional e internacional; existindo entidades que se dedicam integralmente a tais atividades.
        No nosso país podemos afirmar que a censura política teve início através de dois acontecimentos relevantes: o primeiro deles foi a criação da função dos Censores Régios, por Dão João, em 1808 (já existia, entretanto, a censura do Santo Ofício, de interesse do Papa, e a da Diocese, de interesse e responsabilidade do Bispo), responsáveis tais censores pelos interesses do reino. A segunda ocorreu na mesma data com a publicação, na Londres de 1808, do jornal Correio Braziliense, redigido por Hipólito da Costa (diplomata brasileiro naturalizado cidadão inglês), que defendia idéias liberais para o nosso país e aqui proibidas de serem difundidas; idéias estas que conduziram, posteriormente, à independência do Brasil. No Estado Novo Getulista, a censura era conduzida pelo Departamento de Imprensa e Propaganda - DIP. De lá para cá o país têm sido submetido à ação da censura, declarada ou velada, por todos os governos que se sucederam. A censura, por vezes, é explicita (quando se proíbe a divulgação da informação) e, por vezes, possui o caráter de intimidação (quando existe o receio daquele que produz a informação de se expressar livremente e, neste caso, acaba-se caminhando para a autocensura).
       Todavia, muito mais do que possuir simplesmente liberdade de imprensa, os habitantes de países democráticos modernos devem possuir o direito inalienável à informação. Este direito deveria, de forma contundente, estar sendo cobrado do governo brasileiro, em seus três níveis, pelas organizações civis não governamentais – ONG’s e pelas entidades de classe profissionais, que, no entanto, se, por um lado, conseguem somar e multiplicar bem quando se tratam de causas ambientais ou de direitos humanos, por outro conseguem, também, dividir e subtrair melhor ainda, quando tratam da ação da censura e da restrição ao direito à informação. Considerando que nas próprias eleições para cargos executivos e legislativos, em nosso país, os eleitores não têm como comprovar se os seus votos foram efetivamente computados da maneira correta, para aqueles candidatos em quem votaram, constata-se que, infelizmente, vivemos em uma era de desinformação e de total desrespeito aos direitos civis e difusos dos cidadãos, sem que as autoridades se pronunciem, sem que as entidades de classe se manifestem judicialmente e sem que as ONG’s protestem publicamente, como fazem sempre com outros assuntos de seus interesses.
      Chega, portanto, de censores e de censura que defendam os interesses das elites e dos governantes mal intencionados, quanto a condução da política, da economia e da ideologia que lhes dá suporte. Assim, neste contexto, pugnamos pelo retorno dos censores aos estilos romano e chinês, que existiram na antiguidade; isto é, censores para nos defenderem contra os desmandos dos governantes e para expulsarem, sumariamente, os políticos corruptos da câmara e do senado.

_*/ Economista, M.S e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.

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