segunda-feira, 16 de maio de 2016

9. Por que será que o nosso país ainda não deu certo?**

Jober Rocha*


O povo brasileiro é reconhecido, mundialmente, por algumas de suas principais características: é um povo alegre, paciente, dócil, pacífico, crédulo, religioso, inocente, imitador, despolitizado desorganizado, conciliador, malandro (da mesma forma que o nosso ‘jeitinho’, a malandragem também pode ser considerada um procedimento social tipicamente brasileiro). Nossa história está cheia de exemplos quanto a isto.
       Embora algumas destas características, muitas vezes, possam ser desejáveis individualmente, coletivamente deixam transparecer um povo fraco e submisso, razões, talvez, pelas quais ainda não despontamos como uma potência do Primeiro Mundo. O presente texto busca levantar algumas questões que esclareçam, em parte (já que o assunto é, por demais, complexo), a razão pela qual o nosso país ‘ainda não deu certo’.
As interpretações históricas que tentam vincular as características do povo brasileiro, anteriormente mencionadas, como frutos exclusivos da sua colonização não me parecem suficientes. Como exemplo, destacamos que o nosso país, da mesma forma como ocorreu com os Estados Unidos da América do Norte em sua colonização pelos ingleses, também foi colonizado por um povo corajoso e ambicioso, o português; cujos feitos na América, na África e na Ásia são conhecidos e reconhecidos e que, da mesma forma como ocorreu com aquele grande país do norte, também fez uso da mão de obra escrava no início da sua colonização. Ademais, igual como ocorreu nos USA, o nosso desenvolvimento, posterior, também foi edificado com base na imigração de grandes contingentes populacionais de todas as partes do mundo. No entanto, com uma colonização mais ou menos semelhante a nossa, os Estados Unidos não possui um povo com características psicossociais iguais àquelas que nós apresentamos. De um modo geral, os norte-americanos são sérios, politizados, corajosos, espertos, criativos, organizados, trabalhadores e têm um grande senso intrínseco de justiça e de liberdade democrática. A história deles está cheia de exemplos quanto a isto. Assim, creio que podemos descartar a variável colonização como explicativa da razão de nossas diferenças.
Na época da descoberta do Continente Americano, Portugal, Espanha, França, Holanda e Inglaterra eram os países da Europa que empreendiam grandes navegações pelos mares e oceanos, com objetivos comerciais e de conquista de novos territórios. O estágio de desenvolvimento econômico e tecnológico destes países era, mais ou menos, equivalente; isto é, as diferenças existentes não eram de grande magnitude para a tamanha discrepância entre o desenvolvimento posterior de suas colônias.
Um aspecto histórico que, realmente, pode ter diferenciado as características psicossociais existentes entre as populações destes dois países, foi o de que os nossos colonizadores (ao contrario daqueles da América do Norte, pessoas de boa índole e caráter, que foram para ficar, crescer e enriquecer junto com o novo país), quase sempre de má índole e caráter (veja que as prisões foram esvaziadas em Portugal), aqui vieram para explorar o território conquistado em benefício próprio e da matriz e pensavam, individualmente, apenas em retornar para a mesma tão logo seus objetivos fossem alcançados. Aqueles que aqui ficavam por mais tempo ou mesmo definitivamente o faziam, quase sempre, por obrigação e não por vontade própria. Com isso, os laços que os prendiam a esta terra, ao invés de afetivos, eram apenas comerciais e espoliativos, visando, quase que exclusivamente, à obtenção de riquezas. Podemos destacar a vinda da família real (D. João VI com toda a sua corte) para o Brasil, em 1806, fugindo das tropas napoleônicas que invadiram Portugal; para onde pretendiam todos voltar (e realmente voltaram) tão logo cessasse aquela ameaça. O Brasil, de simples colônia, passou, naquela ocasião, a ser a sede da monarquia portuguesa. Todavia, logo que a ameaça cessou, todos retornaram para Portugal, em 1821, deixando aqui como regente, a contragosto deste, D. Pedro I, filho do monarca português. Com a vinda da família real portuguesa para o Brasil, em paralelo à nobreza de sangue de origem portuguesa, vitalícia e transmitida para os sucessores, conviveu uma ‘nobreza brasileira’ (oriunda de favores prestados à família real em nosso país), vitalícia, mas não transmitida aos descendentes daqueles poucos felizardos agraciados com os novos títulos de condes, viscondes, marqueses e barões. Parecem ter ocorridos, já naquela época, alguns casos de ‘malfeitos’ praticados contra o tesouro real, conforme era costume antigo, relatado no livro anônimo ‘A Arte de Furtar’, surgido em 1744 e falsamente atribuído ao padre Antônio Vieira, mas, na realidade, de autoria de Antonio de Sousa Macedo. Entretanto, em que pese à existência desta nobreza da terra, bem como de uma crescente população de naturais, tudo aquilo oriundo da ‘Terra Brasilis’ (nome do nosso país que aparecia em alguns mapas antigos) era depreciado, a começar pelos próprios brasileiros aqui nascidos e pelos poucos produtos aqui fabricados. Em contrapartida, tudo o que chegava da Europa, fossem pessoas ou mercadorias, era disputado e valorizado. A língua de ‘bom tom’ falada pelos intelectuais, pela nobreza e pela rica burguesia, era o francês; bem como, a Literatura que liam era também de origem francesa em sua maior parte. Os vinhos que estas categorias consumiam e até as roupas que usavam, os utensílios de casa e as armas que portavam, eram, em sua quase totalidade, originários da Europa. Talvez pelo fato das três categorias anteriores (intelectuais, nobres e ricos burgueses), serem formadoras de opinião, as populações das cidades e dos campos passaram, também, a valorizar e a desejar os produtos e as novidades que vinham de fora do país. O escritor Nelson Rodrigues bem caracterizou este comportamento, denominando-o ‘síndrome ou complexo de vira latas’; isto é, segundo a sua definição: "a inferioridade em que o brasileiro se coloca, voluntariamente, em face do resto do mundo".
Outras interpretações históricas que vinculam as características do nosso povo, mencionadas no início do presente texto, ao clima tropical, podem, por sua vez, ter realmente algum valor; já que, as populações de diversos países vizinhos, sob as mesmas condições climáticas que o Brasil, embora colonizados por outro povo, o espanhol, possuem algumas características psicossociais bem semelhantes às nossas. 
       Relativamente às raças que povoaram o Brasil (índios, negros de origem africana, amarelos de origem asiática e brancos de origem européia), têm elas as mesmas origens daquelas que povoaram os Estados Unidos e, portanto, as diferenças psicossociais existentes entre os povos destes dois países, não devem ser atribuídas à componente racial. Por outro lado, a extensão territorial e a quantidade e qualidade dos recursos naturais, também são semelhantes entre ambos os países e, assim, estas outras variáveis não parecem também constituir a fonte de todas as nossas enormes disparidades. Os colonizadores que aqui aportaram, volto a dizer, sempre mantiveram os olhos e o pensamento na matriz, para onde esperavam retornar algum dia; ao contrario dos colonizadores do território norte-americano, que sempre desejaram construir seus futuros naquele novo continente, sendo esta a variável explicativa mais importante a meu ver.
A denominada ‘Doutrina Monroe’, apresentada ao congresso americano pelo presidente dos Estados Unidos da América do Norte, James Monroe, no ano de 1823, resumida na frase ‘A América para os Americanos’, consistia nos três pontos, mencionados a seguir:
. A não criação, pelos europeus, de novas colônias na América;
. A não intervenção, pelos europeus, nos assuntos internos dos países americanos; e
. A não intervenção dos Estados Unidos em conflitos relacionados aos países europeus. 

O ‘Destino Manifesto’ (doutrina que justificou o expansionismo norte-americano, interna e externamente ao seu território) legitimou, desde o início, a ambição e o interesse político e econômico daquele povo (a compra da Louisiana, da Flórida, do Alaska, a conquista do Texas, etc.). Assim, a sociedade norte-americana esteve sempre mobilizada em torno de conquistar novas terras e prosperar. O presidente James Buchanan declarou, em seu discurso de posse em 1875: “A expansão dos Estados Unidos sobre o continente americano, desde o Ártico até a América do Sul, é o destino de nossa raça (...) e nada pode detê-la”.
Nossas primeiras elites (que foram seguidas pelas demais), por sua vez, contentaram-se com as dimensões continentais do Brasil, que procuraram defender da secessão e da cobiça de vizinhos hostis, de origem hispânica, conforme podemos constatar estudando a nossa história. Note-se que, enquanto a ambição dos norte-americanos sempre foi a de expandir-se por todo o continente americano e pelo resto do mundo, o anseio dos brasileiros sempre foi o de, apenas, defender-se de países estrangeiros vizinhos, objetivando manter os limites de nossas fronteiras. Os poucos territórios que conquistamos destes países fronteiriços, tinham por objetivo apenas ampliar as nossas defesas (vide o caso da criação dos territórios federais, vinculados ao governo central) e não um objetivo imperialista. Não é por outra razão que, enquanto a Doutrina de Defesa Norte-Americana diz que seu objetivo é o de “defender os interesses norte-americanos em qualquer parte do mundo”, o objetivo da Doutrina de Defesa Brasileira é o da “não intervenção e da solução pacífica dos conflitos”. 
Não entraremos no mérito do grande desenvolvimento norte-americano, relativamente aos demais países do mundo, motivado pelas duas guerras mundiais; posto que, quando deste envolvimento os USA já era uma potência mundial e apenas consolidou e ampliou o seu poder, notadamente após a Conferência de Yalta.
Um grande país com um povo de características fracas, próximo de outro grande país cujo povo possui características fortes, está fadado a se tornar vassalo daquele outro; tanto de forma política e econômica quanto, eventualmente, cultural. É este, na realidade, o nosso caso com relação aquele grande país do Norte. Isto é apenas uma constatação que faço e não um juízo de valor sobre a natureza desta vassalagem em si; isto é, se a vassalagem a um país próximo é melhor ou pior do que a vassalagem a um país distante, se a vassalagem a um determinado povo é melhor ou pior do que a vassalagem a outro ou se a vassalagem prestada a um país ocidental (que adota a religião cristã) é melhor ou pior do que aquela concedida a um país oriental (que não possui religião ou que adota outra, distinta da cristã). Digo isto porque, na atualidade, os países da América Latina, através da recém criada União das Nações Sul-Americanas – UNASUL e da Escola Sul Americana de Defesa – ESUDE (sem nenhum debate com a nossa sociedade, em suas casas legislativas, e com as nossas forças armadas) teriam como objetivo a troca da vassalagem aos USA pela vassalagem à Rússia e/ou à China, através da adoção de uma ideologia marxista denominada Bolivarianísmo.
         Voltando a história do nosso continente (já que nos adiantamos um pouco no parágrafo anterior), verificamos que tendo os países latinos da América se libertado de seus colonizadores, com o fim das colônias e as suas transformações em países (supostamente independentes), saíram todos, assim, da esfera de influência de Portugal e da Espanha e passaram, a partir de então, a estar submetidos à esfera de influência dos USA.  
A vassalagem cultural, uma das componentes da vassalagem, entretanto, se apresenta sempre como muito mais nociva que aquelas, exclusivamente, política e econômica; já que, estas últimas são muito mais difíceis de serem rompidas quando existe a primeira. Alguns exemplos de vassalagem cultural, praticadas pelos formadores de opinião do nosso povo e por grande parte da nossa população, observáveis na atualidade, podem ser observados:
. Uso de palavras estrangeiras (principalmente de origem inglesa, embora também de origem francesa) no vocabulário quotidiano das pessoas;
. Nomes estrangeiros (principalmente nos idiomas inglês e francês) dados a edifícios residenciais, a lojas comerciais, a produtos e a serviços;
. Aquisição e uso de camisas, casacos, tênis, gravatas, bolsas, relógios, utensílios de vestuário e de casa em geral, etc., todos de marcas estrangeiras, como forma de demonstrar ‘status’ social, embora existindo produtos similares aqui fabricados;
 . Aquisição e consumo de produtos comestíveis e de bebidas estrangeiras, embora existindo similares nacionais, como forma de demonstrar também ‘status’ social;
. Viagens freqüentes de brasileiros à Disneylândia (para diversão), à Nova York (para compras) e às principais capitais européias para turismo; muitas vezes, sem conhecer nenhum outro Estado da Federação Brasileira, a não ser aquele em que vive;
. Desejo acentuado de estudar em escolas e universidades norte-americanas e européias; bem como, de dominar o idioma inglês, por parte dos jovens brasileiros;
. Assunção de costumes estrangeiros que chegam, em alguns casos, a se sobrepor aos nossos costumes culturais nativos, como a comemoração do dia de ‘Halloween’, a adoção da música ‘country’, a prática de rodeios de cavalos e bois (estes foram trazidos para o interior paulista, com suas vestimentas e costumes, a partir daqueles realizados no interior dos USA), etc.;
. Excesso de exibição de filmes estrangeiros, relativamente à exibição de filmes nacionais, nos cinemas, na televisão aberta e na televisão por assinatura.
. O destaque dado, pelo público leitor e pelas editoras do país, à Literatura estrangeira traduzida para a nossa língua, embora existam muitos escritores nacionais de primeira linha, sem que a estes sejam dadas, pelas editoras, as mesmas oportunidades dadas aos autores estrangeiros para a divulgação de suas obras.

A vassalagem cultural, expressa pelos exemplos mencionados, além de aceita naturalmente pelo nosso povo é, ademais, incentivada pela Mídia nativa e pela Mídia estrangeira. Cumpre ressaltar aqui a minha total aversão a vassalagem, seja ela qual for e prestada a quem quer que seja. Países soberanos desenvolvidos (ou que pretendam se tornar desenvolvidos), não aceitam se tornar vassalos de outros países; embora possam ter alinhamentos, movidos por interesses comuns.
      Nosso país, por seu contingente populacional, por sua extensão territorial, por suas riquezas minerais e de fauna e flora, por seu clima e por suas condições geográficas, já poderia ser uma potência do Primeiro Mundo há muito tempo. Só ainda não fazemos parte daquele seleto grupo de países, em razão da nossa subserviência; da vassalagem cultural, política e econômica; da falta de patriotismo e da corrupção endêmica (esta que historicamente sempre grassou nos três poderes da República, têm se acentuado consideravelmente nos últimos anos), alimentados todos estes fatores por elites, em grande parte, descompromissadas com nosso futuro como nação e sob as vistas complacentes de um povo inculto, desorganizado, inocente, crédulo e conformado.
       Nossa subserviência e vassalagem ocorrem tanto em decorrência das características já citadas, como, também, de nosso tradicionalmente inexpressivo poder militar; fato que, nas questões externas, nos obriga a adotar uma atitude quase sempre conciliadora e servil. Como exemplo, citamos o fato de que, na atualidade, o nosso país faz parte do BRICS (ao lado de Rússia, Índia, China e África do Sul) e, embora economicamente sejamos um dos membros mais fortes (nosso PIB era superado, apenas, pelo da China e da Índia), nossas forças armadas consistem na mais fraca de todas elas (a única que não tem poder nuclear), não sendo tais forças compatíveis com a importância econômica de nosso país. Nossos céus, mares e território estão perigosamente vulneráveis. A Região Amazônica, por seu potencial mineral e de biodiversidade é, sabidamente, alvo da cobiça internacional. Nossos recursos petrolíferos, notadamente aqueles sob o mar, também são cobiçados; todavia, nossas forças terrestres, aéreas e navais (ufanismos a parte) estão entre as mais deficientes e fracas de todo o continente, não sendo capazes de defender nosso território, nosso espaço aéreo e nosso mar territorial de uma eventual invasão.
O país carece, na atualidade, de Planos de Desenvolvimento de Longo Prazo, como já os teve em passado recente (PAEG, Metas e Bases, Plano Decenal, etc.). As políticas setoriais adotadas são sempre casuísticas, oportunistas e visam atender aos interesses políticos, mais do que aos interesses sociais. Os programas do submarino à propulsão nuclear e do veículo lançador de satélites andam a passos lentos. A aquisição dos novos aviões de caça para a força aérea, cujo processo se iniciou anos atrás, demorou tanto tempo para ser concretizada em razão não de motivos de ordem técnica; mas, dos inúmeros lobbies de pressão que existem junto aos Poderes da República e que procrastinam importantes e necessárias decisões. Os equipamentos e armamentos com que contam as forças armadas são obsoletos e escassos, em razão das reduzidas verbas orçamentárias destinadas anualmente aos comandos militares. Muitas organizações militares trabalham em regime de meio expediente, em razão da falta de recursos para proporcionar alimentação aos seus integrantes, enquanto construímos dezenas de estádios de futebol, supérfluos, que ficarão inativos a maior parte do ano.
Outros exemplos, que confirmam a magnitude da nossa subserviência, consistem nos fatos de que firmamos todos os acordos internacionais referentes ao meio-ambiente; bem como a não proliferação de armas nucleares e a criação de reservas indígenas autônomas, em áreas ricas em minerais estratégicos, na frente da maioria dos demais países, muitos dos quais ainda não os firmaram até hoje e nem irão firmá-los no futuro. Fomos o primeiro país a propor, voluntariamente, a redução da emissão de gás carbônico, sacrificando, com isso, nosso desenvolvimento econômico. Embora estes feitos tenham um forte apelo junto à opinião pública interna e externa, países que poluem a atmosfera muito mais do que o nosso não reduziram as suas emissões; pelo contrário, as aumentaram. Outros países com populações indígenas como as nossas, não concederam imensos territórios ricos em minerais estratégicos e biodiversidade (bem como a autonomia sobre estes territórios) para as suas populações indígenas, mas, sim, procuraram integrá-las na vida econômica e absorvê-las na vida social do país. Nosso congresso votou, em passado recente, lei proibindo explosões nucleares (nossas, não as alheias) com quaisquer finalidades (mesmo as pacíficas) em nosso território, exclusivamente por pressão externa, desativando, também, nosso programa nuclear; muito embora, sejamos um dos poucos países do mundo a possuir reservas de urânio e tecnologia de enriquecimento própria. Dois outros países que também tinham programas nucleares com fins pacíficos, semelhantes aos nossos, não os desativaram em razão das pressões sofridas (como fizemos em razão daquelas que recebemos) e, atualmente, estão próximos de concluir ou já concluíram os seus programas. Ademais, permitimos e facilitamos a criação e a instalação em território nacional, de um sem número de Organizações Não Governamentais – ONG’s, muitas delas cujas principais missões são as de levantar, mapear e explorar nossos recursos naturais e minerais; de tentar organizar movimentos separatistas; de promover a luta de classes e a implantação de ideologias externas de cunho marxista e de servir de caixa dois para o desvio de recursos públicos, por políticos e seus partidos.
Precisamos, com urgência, de lideres e governantes patrióticos, não comprometidos com oligarquias retrógradas, internas e externas, que pensam apenas em seus objetivos imediatos de riqueza, como aqueles nossos primeiros colonizadores. Precisamos de elites compromissadas com o futuro do nosso país e da nossa gente, que queiram associar-se ao povo brasileiro na marcha pela conquista do desenvolvimento com distribuição de renda e igualdade social, e não apenas amealhar fortuna para gastá-la em outros países. Não necessitamos de feitores nem desejamos continuar, para sempre, como simples escravos de senhores nativos ou estrangeiros.
Nosso país só terá encontro marcado com seu destino de potência (como há muito já ocorreu com aquele grande país do norte), quando as nossas elites resolverem compartilhar as imensas riquezas do país com as pessoas que nele habitam e trabalham. Se o povo norte-americano é muito patriota que o nosso e está disposto a dar a vida pelo seu país, dentro e fora de suas fronteiras, é porque as suas elites e o seu governo reconheceram, desde há muito tempo, a importância da contribuição de todos os cidadãos americanos para o desenvolvimento daquele país; devolvendo, ao povo, esta contribuição através de importantes medidas que traduziram e traduzem uma visão ampla do futuro, quer de ordem econômica, financeira, fiscal, jurídica, social, etc. Assim, através da implantação de medidas que visaram à aplicação de uma política salarial e fiscal compatíveis com a riqueza do país; bem como de medidas que objetivaram a geração cada vez maior de empregos, a realização de obras públicas necessárias, a prestação de serviços públicos de qualidade e a aplicação de uma justiça igual para todos, ajustaram aquele grande país do norte ao seu presente e o preparam para o futuro, tendo em vista, principalmente, o interesse do povo. Com o crescimento do país e com a participação do povo neste crescimento, ganham todos os cidadãos e, sobretudo, as suas elites. 
       As nossas elites e os nossos governantes, por sua vez e ao contrário, jamais pensaram em devolver ao povo, que trabalha e edifica este país todos os dias, parte daquilo que ajudou a produzir; ou seja, ambos pensam apenas em amealhar riquezas e em arrecadar impostos, quase nada dando em troca à população, seja em termos de serviços públicos, seja de obras públicas, seja de uma justiça rápida e eficiente, seja em melhoria dos seus padrões econômicos e sociais. Assim, nesta situação, como cobrar patriotismo de nossa gente contra ameaças externas, quando as elites e o governo caminham na contramão dos interesses populares? Como cobrar paciência e sacrifício, da população, para os ajustes fiscais necessários (em razão da má administração da coisa pública pelos governantes), quando a nossa carga tributária já é uma das mais elevadas do mundo e sem a respectiva contrapartida social, que seria de se esperar em termos de serviços públicos? Esta elevada carga tributária imposta a todos nós, infelizmente, tem servido apenas para a realização de algumas poucas obras, muitas delas supérfluas e superfaturadas (como o caso dos inúmeros estádios de futebol, que consumiram bilhões de reais, recursos estes que fazem falta nas escolas, nos hospitais, nos transportes e na segurança pública); bem como, para a manutenção de milhares de empregos desnecessários nos três poderes da república, com vistas a atender interesses políticos, sinecuras e o nepotismo da corte.
         Voltando ao ‘complexo de vira latas’ citado por Nelson Rodrigues, constata-se que grande parte daquilo que se faz aqui é apenas “para inglês ver”, conforme já era costume afirmar no tempo do império. Nossas leis existem para serem violadas impunemente (vejam a Lei de Responsabilidade Fiscal que não é respeitada nem pelo governo federal e nem pelos governos estaduais e municipais). Da mesma forma que as nobrezas do Brasil Reinado e do Brasil Império, quando eventualmente julgadas por crimes perpetrados, eram condenadas a serem ‘queimadas em esfinge’ (faziam, simplesmente, um boneco da ‘autoridade’ e nele colocavam fogo), as elites do Brasil contemporâneo, quando eventualmente chegam a ser julgadas por algum crime cometido, a pena que sofrem pode ser cumprida em casa e, se políticos, nem perdem os seus mandatos, continuando a receber os vencimentos correspondentes.
        Pelo exposto até aqui, com certeza, podemos afirmar que as causas principais do nosso atraso secular, em todos os setores nacionais, não são de cunho intelectual (embora tenhamos sérias deficiências de ordem educacional) e muito menos de raça, de carência de recursos naturais disponíveis ou mesmo de fatores climáticos. As razões pelas quais nosso país ainda não deu certo podem ser encontradas nas atitudes de nossa população como um todo e, principalmente, no comportamento de nossas elites, determinadas estas atitudes e este comportamento pela educação (ou falta de) e pela cultura (ou falta de) características de cada uma delas. O fato de não pertencermos, ainda, ao Primeiro Mundo, pode ser creditado a nossa falta de atitude como cidadãos – ou à falta de ‘vontade nacional’ –, frente aos desmandos de governos e de elites insensíveis, venais e de pouca visão, que têm ascendido ao poder e se sucedido, apenas para beneficio de si mesmo, bem como dos grupos a que pertencem e que as sustentam. Nossas deficiências, de toda ordem, não são devidas a que nos faltem recursos ou, somente, porque sejamos eventualmente explorados por vizinhos mais ricos; embora a nossa vassalagem e o nosso alinhamento sempre tenham existido, desde a descoberta do novo continente. Constatamos, sem falsos ufanismos, que a nossa população, de modo geral, carece de ética, integridade, seriedade em suas ações, responsabilidade, respeito às leis, respeito aos direitos humanos, amor pelo trabalho, pontualidade, esforço para economizar e investir e desejo de superação. Não é por outra razão que grande parte dos nossos governantes, representantes que são de elites retrógradas, para evitar o despontar da vontade nacional, tenham sempre investido tão poucos recursos em educação e cultura. 

_*/ Economista, M.S e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.

_**/ Publicado em Leitura Recomendada de 24.08.2016. www.reservaer.com.br

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