segunda-feira, 19 de agosto de 2019

297. Desaparelhar o Estado, sim ou não?


Jober Rocha*



                                      O atual presidente da república Jair Bolsonaro, segundo o comentário de inúmeros analistas políticos que lhe são favoráveis, encontra-se, praticamente, de “pés e mãos amarrados”, em razão de ter assumido o poder após quase três décadas de governos de esquerda, que aparelharam as instituições públicas com milhares de militantes e ativistas políticos.
                                                  O aparelhamento do Estado, conforme rezam os dicionários, ocorre quando os três poderes da república sofrem influências externas nas suas ações e competências; isto é, quando existe uma ideologia que impõe, sobre eles, uma espécie de agenda que não seja aquela de cumprirem, exclusivamente, com os seus papeis constitucionais.
                                              Na atualidade a opinião dominante, de vários analistas políticos e da totalidade dos eleitores de Bolsonaro, é a de que ele deveria, simplesmente, desaparelhar as instituições públicas, desfazendo-se daqueles servidores contratados por razões políticas durante os governos de esquerda. Ocorre que a coisa não é tão simples assim. O presidente tem apenas um poder relativo sobre o Executivo, fugindo do seu controle o Legislativo e o Judiciário.
                                                Porém, a imposição de agendas partidárias e ideológicas no Legislativo e no Judiciário, segundo a opinião de muitos dos analistas políticos, mantém comprometidas as ações destes poderes, pois estas ficam sujeitas às orientações de determinado partido ou ideologia (não necessariamente ainda no poder, como no caso presente do Brasil, em que assumiu um governo de direita depois de décadas de governos de esquerda ) e, com isto, as instituições não têm a imunidade requerida para legislar e para julgar de forma isenta. 
                                              Com base em tudo isto mencionado, a pergunta que se coloca no momento é aquela que dá título ao presente texto: Desaparelhar o Estado, sim ou não? Demitir servidores contratados em governos anteriores de esquerda, com objetivos meramente políticos de aparelhamento da administração pública, que atualmente se recusam a servir a um novo governo que possui outra ideologia; que se negam a colaborar com esse novo governo por razões políticas, mesmo naquelas propostas e medidas que sejam, exclusivamente, voltadas para o bem do país e para o seu desenvolvimento econômico e social; servidores estes que, muitas vezes, torcem contra, se omitem ou até mesmo sabotam decisões tomadas, com vistas ao insucesso do atual governo? Qual a sua opinião sobre isso, meu caro leitor?
                                               Reconheço que, independentemente do aspecto político-ideológico da questão, existe uma componente social e humanitária. Muitos destes ‘apadrinhados’ possuem famílias para sustentar e não encontrariam outros empregos facilmente, pois o país está em recessão, justamente, devido ao excesso de gastos com servidores públicos e suas mordomias; além de má gestão e de desvio de recursos públicos promovido por diversas autoridades de governos passados, responsáveis pela contratação destes mesmos servidores.
                                            Todavia, milhões de cidadãos brasileiros encontram-se atualmente desempregados em virtude destes mencionados desvios de recursos e da má administração dos últimos governos de esquerda. O novo governo que se inicia procura mudar este quadro lamentável, mas, infelizmente, é combatido de dentro por uma quinta coluna infiltrada, que tenta, de todas as maneiras, sabotar as boas iniciativas e impedir que o governo tenha sucesso e o país volte a crescer. O sucesso do atual governo, para eles, significaria o fim da doutrinação esquerdista em nosso país e, talvez, o fim dos regimes socialistas bolivarianos no Continente Sul Americano.
                                           Relativamente ao poder executivo, no entanto, muitos ministérios já trocaram chefes e demitiram alguns funcionários; talvez, não na quantidade necessária para o total desaparelhamento das instituições públicas. As universidades federais, por exemplo, ainda constituem núcleos onde é forte a ideologia marxista e onde graça grande oposição ao atual governo.
                                              O intuito do presente ensaio, portanto, é o de fazer um apanhado geral sobre a forma pela qual os povos e as nações, ao longo da história, sempre fizeram para se livrar daqueles membros considerados indesejados, por trabalharem contra os interesses das populações, das comunidades e dos eventuais donos do poder. Evidentemente, esta pesquisa visa, apenas, levantar a questão trazendo este grave problema à baila. Dou a minha opinião particular e incentivo os leitores a meditarem no assunto.
                                        Todavia, creio que, ao analisarmos este assunto, devemos ter presente o episódio histórico ocorrido com o chefe da tribo celta dos Sênones, conhecido como Breno (Breno é a forma latina do termo celta que significa líder), que dominava a costa do Adriático conhecida como Gália Cisalpina, na Itália, em 387 a.C., e que liderou o exército gaulês na captura e saque da cidade de Roma, após ter vencido os romanos na Batalha do Ália. 
                                          Os romanos, batidos pelos gauleses na ocasião, concordaram em pagar um resgate para libertar a cidade. De acordo com textos históricos preservados até os nossos dias, durante uma discussão sobre o peso do ouro a ser usado para pagar o resgate, Breno teria atirado a sua pesada espada de ferro em um dos pratos da balança, de modo a que os romanos colocassem mais ouro no outro prato para equilibrá-la, e pronunciou a célebre frase: "Vae victis!", cujo significado é: "Ai dos vencidos!". 
                                              Todos sabemos que na luta entre o Bem e o Mal, quando este é o vencedor, ele não perdoa nem contemporiza com o vencido Bem. Da mesma forma deve agir também o Bem, quando vence o Mal e não deseja que este venha novamente retornar, trazendo consigo as suas maldades.
                                                  Podemos, pois, constatar que desde o início da vida humana na superfície do planeta e durante incontáveis séculos, as tribos indígenas e os primitivos povos baniram determinados membros de suas comunidades como punição por infrações graves. Aqueles que conspiravam contra os seus, cometiam crimes ou que não se adequavam aos costumes vigentes, eram, quando não simplesmente executados, segregados do convívio tribal, sendo expulsos para territórios mais distantes.
                                                 Nos Estados Unidos, ainda recentemente, muitas tribos indígenas possuem o costume de expulsar índios considerados como membros não autênticos de um determinado grupo.
                                              A Califórnia atual, onde dezenas de tribos pequenas foram dizimadas, dispersas e, em seguida, recriadas, muitas vezes com índios etnicamente mistos, tornou-se o reduto nacional desta tendência. Rivalidades entre clãs e disputas políticas, muitas vezes, são os motivos alegados para a expulsão.
                                              Por sua vez, na Grécia antiga, o Ostracismo consistia em uma punição na qual o cidadão, normalmente um político, militar ou servidor público, que atentasse contra os costumes, contra a liberdade pública ou contra o Estado, era votado para ser banido ou exilado, por um período de dez anos. 
                                         O Ostracismo, segundo os historiadores, foi criado por Clístenes (conhecido como o Pai da Democracia) e qualquer cidadão punido deveria deixar a cidade no prazo de dez dias, se ausentando da mesma por um período de dez anos. Segundo Aristóteles, o Ostracismo foi integrado à constituição ateniense no século VI a.C. e posto em prática pela primeira vez em 488 ou 487 a.C.
                                           Mais recentemente, o banimento ou o desterro consistiu em uma medida compulsória pela qual um cidadão perdia o direito à nacionalidade de um país, passando a ser um apátrida (a não ser que, previamente, possuísse dupla-cidadania, sendo cidadão de algum outro país). O banimento, historicamente, foi usado como método de condenação por grave oposição política. Banimento, no entanto, não é um sinônimo de exílio nem de cassação, mas pode levar um indivíduo a exilar-se ou asilar-se em outro país, sem direito a permanecer no seu país de origem.
                                                Degredo, por seu turno, é uma palavra usada na Idade Média para se referir a qualquer súdito que estivesse sujeito a restrições legais quanto ao seu movimento.   O termo degredado tornou-se, assim, sinônimo de um condenado ao exílio, em alguma colônia ou possessão distante. A maioria dos degredados eram criminosos comuns, embora muitos fossem presos políticos ou religiosos, e em sua maioria desempenharam um papel importante na era dos descobrimentos Portugueses, tendo uma grande importância no estabelecimento das colonias portuguesas na Ásia, África e América do Sul.
                                     As próprias religiões, que sempre pregaram o amor ao próximo, a caridade e a humildade, estabeleceram mecanismos para se verem livres daqueles seguidores refratários, contestadores ou insubmissos.
                                         A excomunhão, por exemplo, é uma punição religiosa utilizada para se retirar ou suspender um crente ou seguidor de uma filiação ou comunidade religiosa. A palavra significa, literalmente, colocar alguém fora da comunhão.
                                          A base bíblica da excomunhão é o chamado anátema. As referências são encontradas em Gálatas 1:8: - Mas, ainda que alguém - nós ou um anjo baixado do céu - vos anunciasse um evangelho diferente do que vos temos anunciado, que este alguém seja anátema! (De forma similar e jocosa, a esta referência considerada pela religião, caso substituíssemos ‘um evangelho diferente’ por uma ‘ideologia diferente’, muitos poderiam visualizar, nisto, um anátema político e, portanto, um motivo legal para retirar - excomungar - qualquer servidor da entidade pública em que estivesse servindo...)
                                           Dentre os vários motivos para a excomunhão, destacam-se: o cisma (que consiste na recusa da sujeição ao Sumo Pontífice ou da comunhão com os membros da Igreja que lhe estão sujeitos), a apostasia (definida como o repúdio total da fé cristã) e a heresia (considerada a negação pertinaz de alguma verdade que se deve crer ou, ainda, a dúvida pertinaz acerca da mesma). De forma similar e jocosa, poder-se-ia ver como motivos políticos para a retirada – excomunhão - de qualquer servidor público, a recusa da sujeição ao presidente ou da comunhão com sua equipe de governo; o repúdio total ao Regime Democrático; a negação pertinaz do Liberalismo Econômico e do Sistema Capitalista.
                                                A excomunhão, portanto, segundo a religião, constituiria uma medida disciplinar que teria um sentido medicinal, ou seja, forneceria a oportunidade do afastamento físico das pessoas envolvidas para que, as mesmas, repensassem as suas atitudes e pudessem, eventualmente, retornar posteriormente. A retirada -  excomunhão - política, de forma similar, forneceria a oportunidade do afastamento de servidores públicos para que, os mesmos, repensassem as suas atitudes e pudessem, eventualmente, retornar ao serviço público.
                                                   Outras formas adotadas pelos Estados modernos, de segregação de indivíduos que se colocam em oposição aos costumes, à moral e às leis vigentes, seja por quais razões forem, costumam ser: a internação em hospitais psiquiátricos, também denominados de hospícios ou manicômios e a prisão em penitenciárias, também conhecidas como presídios, claustros, clausuras, cadeias, cárceres ou prisões. 
                                              Vejam, portanto, meus caros leitores, que, ao longo da história humana, as comunidades sempre trataram de forma bastante dura aqueles seus integrantes que tramavam contra os costumes, as normas, as leis, as religiões e os interesses das comunidades; em suma, elas sempre trataram, no mínimo, de segregar e enviar para bem longe os que trabalhavam contra o progresso, contra a liberdade e contra a segurança das próprias comunidades.
                                         Nossa pretensão, todavia, não chegaria a tanto; mas, apenas, na retirada da máquina pública – excomunhão - daqueles não afinados com o novo governo e com a sua nova ideologia, sabotando ou impedindo a implementação de programas, projetos e medidas. Aqueles outros, comprovadamente envolvidos em ilícitos penais, evidentemente, deveriam ser tratados da forma preconizada nas leis,
                                              Lembremo-nos que o nosso atual presidente foi eleito mediante sufrágio universal, por mais de 57 milhões de eleitores e, infelizmente, encontra-se impedido de fazer valer seus pontos de vista e de ver implantado o seu programa de governo. 
                                             Face a qualquer proposta de mudança na chefia de alguma entidade pública, os seus servidores logo ameaçam greve ou os chefes todos pretendem entregar seus cargos, parando os serviços e criando, assim, uma real ditadura funcional daqueles que são, apenas, servidores públicos e, como tal, devem obediência ao presidente eleito pela maioria dos brasileiros. 
                                              Por outro lado, tanto o Judiciário quanto o Legislativo têm interferido frequentemente em muitos atos do presidente, no sentido de impedi-los, dificultando a governabilidade. Se algo não for feito, teremos, muito em breve, uma grande crise institucional.
                                             E quanto a você, meu caro leitor brasileiro, qual a sua opinião sobre tudo isto?  

_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.

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