domingo, 11 de agosto de 2019

294. A História sempre se repete


Jober Rocha*



                                            "A História sempre se repete, a primeira vez como tragédia e a segunda como farsa", consiste em uma velha frase atribuída ao filósofo Karl Marx.
                                                  Mas a frente, com o desenrolar do texto, os leitores irão perceber onde eu quis chegar, fazendo menção a esta frase do criador da ideologia marxista logo de início.
                                            Em um livro de memórias que li recentemente, escrito por C. Carlos J. Wehrs (1885-1942), denominado ‘O Rio Antigo Pitoresco e Musical – Memórias e Diário’, o autor, nascido na Alemanha, relembra a sua vida de vendedor e de afinador de pianos; bem como de músico, nas cidades de Hamburgo, Paris, Rio de Janeiro e em alguns outros municípios pelo interior do nosso país.
                                                      No livro, dentre inúmeras curiosidades sobre a vida no Rio de Janeiro do século XIX, encontrei uma passagem bastante interessante para que pudesse entender a atual situação de violência pela qual nós, os habitantes da cidade, que já foi maravilhosa, passamos.
                                                    Diz o autor: “Por vezes, apareciam, vindos pelas ruas, pequenos grupos de desordeiros e as lojas, para deles se defenderem, colocavam, em suas entradas, barreiras construídas de madeiras e que logo eram retiradas quando esses agrupamentos de desocupados se afastavam. Em nossa loja ocultávamos essa grade de madeira atrás de um piano, bem perto da porta, pronta para ser utilizada. A noite viam-se nas lojas as respectivas famílias reunidas, às vezes com as barreiras colocadas, outras bem à entrada do estabelecimento, a conversar despreocupadamente com os vizinhos, e isto na escuridão. Aparecesse uma destas hordas de capangas, geralmente armados de facas, todos, inclusive os vizinhos e visitantes, refugiavam-se no interior da loja e, rapidamente, as barreiras iam para o seu lugar, obstando a entrada dos indesejáveis. Ousasse um deles penetrar numa dessas lojas, e como em geral os estrangeiros não conheciam a defesa para os golpes rápidos e elásticos da capoeira que utilizavam, eles eram recebidos com pistolas armadas ou espingardas engatilhadas, mantidas sempre a mão pelos moradores, pondo assim em fuga esses covardes, que se apavoravam com a simples visão de armas de fogo, já que os ingleses que aqui viviam atiravam sem titubear. Curiosamente, nunca se falou em revide da parte deles. Estes grupos de malfeitores só terminaram na década de 1890, quando o notável chefe de polícia Dr. Sampaio Ferraz, resolveu extingui-los, o que não foi tarefa simples, requerendo muita energia. Contava ele com o apoio do presidente da república General Deodoro da Fonseca e do Ministro da Justiça, Dr. Manuel Ferraz de Campos Sales”.
“Esses bandos de desordeiros tinham, sobretudo por ocasião de eleições, uma importância decisiva, sendo utilizados na pequena e na grande política, para enorme vergonha dos brasileiros perante os estrangeiros”.
                                                 Vejam, meus caros leitores, as similitudes psicossociais e políticas existentes no Rio de Janeiro dos idos de 1890 e, cento e vinte e nove anos depois, na atualidade do ano de 2019 na mesma cidade. Vejam também como procediam nossos sábios e destemidos bisavós e avós, para solucionar as questões de violência que os incomodavam naquela ocasião.
                                                    Bandos de desocupados já promoviam, na época, os chamados ‘arrastões’, da mesma forma como promovem hoje em dia. A grande diferença é que naqueles idos eram recebidos à bala pelos comerciantes e suas famílias. Hoje, com a população inteiramente desarmada, os comerciantes (e o povo de uma maneira geral) são obrigados a entregar tudo aquilo que possuem, sem chance nenhuma de defesa (o que, aliais, não é recomendado pelas autoridades, que instam a população compulsoriamente desarmada a não reagir aos roubos e assaltos) face ao despoliciamento da cidade e, muitas vezes, ao receio do policial de envolver-se em um episódio com mortos e feridos. Em razão da atual legislação, muitos policiais preferem não se envolver em ocorrências conhecendo, de antemão, os riscos a que estão sujeitos (condenação por abuso de autoridade, excesso de força letal, etc.).
                                                  Vejam que, naquela ocasião, para haver repressão governamental a estes bandos, foi necessária a ação enérgica do chefe de polícia (evidentemente prendendo e matando a maioria deles, como também foi feito anos mais tarde com o bando de Lampião, que aterrorizava a Região Nordeste na década de 1930) que contou, para tanto, com o apoio de presidente da república, um militar na patente de general, e do Ministro da Justiça. Fica bem claro que, apenas, as forças policiais Estaduais, já naqueles tempos, não conseguiriam fazer frente e eliminar aqueles bandos ou facções existentes, apadrinhados que eram por uma elite venal e também criminosa. Foi necessário contar, para tanto, com a ajuda do governo federal.
                                          Vejam, caros leitores, que aqueles criminosos de então já eram utilizados pelos antigos ‘caciques políticos’, em épocas de eleições, para intimidar eleitores e para ‘executar’ candidatos de oposição; funcionando como uma milícia empregada para 'trabalhos sujos’ em troca de dinheiro, proteção e acoitamento.
                                             De lá para cá, embora a violência tenha sido contida em 1890 conforme mencionado pelo autor (e possa mesmo ter regredido durante alguns curtos períodos da vida pública carioca), com o passar do tempo os morros da cidade e as periferias urbanas foram recebendo novos habitantes, notadamente após a Revolta de Canudos (1896-1897), quando muitos soldados convocados pelo Exército Brasileiro, após retornarem dos combates, foram residir em casebres nos morros cariocas.
                                                    Ademais disso, anos depois, com a industrialização da nossa economia; com a explosão demográfica decorrente da queda das taxas de mortalidade e com a urbanização da população, que migrou em massa do campo para as cidades em busca de melhores oportunidades de vida, a população do país aumentou de 40 para 120 milhões e o percentual vivendo nas cidades subiu, rapidamente, de 31% para 67%. Esta massa humana foi habitar os morros e periferias, formando guetos miseráveis de onde começaram a surgir pequenos marginais e seus bandos e quadrilhas. Os governos de então, fazendo vistas grossas ao problema, permitiram que as quadrilhas se consolidassem e institucionalizassem sob a forma de facções.
                                                    Se a situação de violência já era ruim no século XIX, piorou muito nos séculos seguintes, XX e XXI.
                                                  O resultado, portanto, foi um enorme contingente de brasileiros pobres e destituídos de direitos sociais (introduzidos apenas com a Constituição de 1988) vivendo de forma precária nas periferias das cidades brasileiras. Neste caldo de cultura, proliferaram, inicialmente, de forma alarmante, os pequenos criminosos e as suas diminutas quadrilhas. Entretanto, após o Movimento Militar de 1964, quando os guerrilheiros de esquerda, condenados e presos, foram mantidos confinados junto com criminosos comuns, deu-se o início da politização do crime, com o surgimento das primeiras facções criminosas no Rio de Janeiro e suas associações com políticos de esquerda e seus partidos.
                                                  Findo o Movimento Militar no ano de 1985, com o término do governo do General Figueiredo e com a assunção ao poder de José Sarney, alguns anos depois, em novas eleições, foram eleitos governantes de esquerda, alguns deles ex guerrilheiros iniciando-se, então, o aparelhamento do Estado brasileiro com militantes oriundos dos partidos de esquerda e ativistas políticos visando a implantação de um regime comunista em nosso país.
                                                   Começou, também, a aproximação de autoridades governamentais e partidárias com as facções criminosas existentes, braço armado para se opor a uma eventual resistência popular contra a tentativa de implantação de um governo comunista ou Socialista Bolivariano no Brasil, como era eufemisticamente chamado no nosso continente a ideologia marxista, propugnada pelo Foro de São Paulo para dominar todos os países da América do Sul. 
                                                           No ano de 2005 o povo brasileiro rechaçou a tentativa governamental de proibição da comercialização de armas e munições, mediante um plebiscito ou referendo popular, em que 63% dos brasileiros votaram favoravelmente a liberação da venda de armas e munições. Em que pese este resultado, o governo do presidente Lula, à revelia da população, deu início ao desarme geral do país, endurecendo as leis e portarias relativas ao assunto e recolhendo armas em poder da população.
                                                      A tragédia histórica da violência no século XIX, mencionada pelo autor citado no início do texto, vivida pela população brasileira de então, foi reprimida violentamente pelas autoridades e teve, aparentemente, um desfecho favorável. Todavia, retornou, posteriormente, um século depois, como farsa com a assunção dos governos de esquerda ao poder. A farsa histórica pode ser bem percebida quando se contempla o desarmamento da população de bem, ao mesmo tempo em que os donos do poder armaram os movimentos campesinos e permitiram que se formassem inúmeras facções criminosas, fortemente armadas e municiadas, que, atualmente, semeiam o terror nas cidades. A farsa também pode ser percebida quando os governantes de esquerda, usando de um discurso populista, atiraram migalhas aos pobres afirmando que os redimiam da pobreza, enquanto enriqueciam nababescamente com recursos públicos desviados do tesouro nacional em conluio com alguns empresários empreiteiros de obras, atualmente presos e réus confessos. 
                                                         A farsa pode, ainda, ser percebida quando grande parte da elite nacional, intelectual e empresarial, se volta contra o novo presidente eleito pelos cidadãos de bem, que deseja governar por novas regras políticas, diferentes daquelas até então vigentes e chamadas de “Toma lá, dá cá”, em que nada é de graça e todo apoio político tem seu preço no ‘mercado da patifaria’, por onde se esvaem as verbas públicas arrancadas de maneira escorchante do trabalho diário dos contribuintes.
                                                                Reconheço que nos faltaram, e ainda faltam, a mesma coragem e o mesmo destemor comuns aos nossos bisavós e avós, desbravadores e construtores deste país, que conseguiram dar um basta à violência e a criminalidade existentes na época em que viveram; coisa que nós, seus bisnetos e netos, ainda não logramos fazer acontecer.
                                                            Todavia, da mesma forma como no passado, hoje possuímos um presidente militar e um Ministro da Justiça honestos e desejosos de construir um novo país, dispostos a ajudarem os Estados da Federação em suas lutas contra os criminosos e as suas facções.
                                                              Espero que seja possível a esta nossa geração dar uma lição ao filósofo Karl Marx, mostrando que, realmente, a história sempre se repete; mas, não, apenas, duas vezes, conforme por ele apregoado. Estou certo de que a história pode se repetir, ainda, uma terceira (ou quarta vez) e desta outra como um simples drama histórico, no qual o bem termina, finalmente, triunfando sobre o mal (e triunfando também sobre muitas das falsas teses enunciadas por Marx como verdadeiras em 1867, teses estas que o Foro de São Paulo tentou, de forma infrutífera e criminosa, ver aplicadas em nosso país nas duas últimas décadas em que prevaleceram os governos de esquerda no Brasil).
                                                            Que o presidente Jair Bolsonaro e o Ministro da Justiça Dr. Sérgio Moro possam fazer pelo Rio de Janeiro (e pelos demais Estados da Federação) a mesma ‘limpeza geral’ que, em suas épocas, fizeram o presidente Deodoro da Fonseca e o Ministro da Justiça Dr. Manuel Ferraz de Campos Sales.


_*/ Economista e Doutor pela universidade de Madrid, Espanha.

Notas:
1. Tragédia é um gênero de teatro que se caracteriza pela sua seriedade e dignidade, envolvendo, frequentemente, um personagem em causa contra os deuses, o destino ou a sociedade.
2. Farsa é um gênero teatral de caráter puramente caricatural. Geralmente, possui apenas um ato, enredo curto e poucos atores. Porém, aqui, não há preocupação com a verossimilhança. Ou seja, nada precisa fazer sentido, assim como não são questionados os valores. A moral aqui não encontra lugar.
3. Drama é um gênero teatral de caráter sério, não cômico, que apresenta um desenvolvimento de fatos e circunstâncias compatíveis com os da vida real, podendo ser também qualquer narrativa, no âmbito da prosa literária, em que haja conflito ou atrito.

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