193. Se vocês soubessem o que eu sei, não dormiriam mais...
Jober Rocha*
A frase que dá título ao texto é constantemente pronunciada por personalidades do mundo inteiro, sejam do esporte, da política, da indústria, das ciências, da vida militar, da diplomacia, etc.
A presidente da mais alta corte de justiça do país, teria afirmado, publicamente, em outubro de 2017, que o brasileiro não dormiria se conhecesse tudo o que ela sabia.
Um famoso jogador de futebol teria dito, também publicamente: - “Se as pessoas soubessem o que aconteceu na Copa do Mundo de 2014, ficariam enojadas!”.
Um lutador de UFC brasileiro teria, também, repetido a frase: - "Se as pessoas soubessem o que aconteceu na derrota do Anderson Silva para Chris Weidman, ficariam enojadas!".
O CEO de uma importante empresa do setor aeroespacial norte-americano, teria, há alguns anos, declarado com relação a vida extraterrestre: - “Se vocês soubessem o que eu sei não dormiriam mais!”.
Alguns políticos brasileiros ao serem ameaçados de prisão, no âmbito da Operação Lava à Jato, teriam declarado na Mídia: -“Se me prenderem vou denunciar, dizer o que eu sei e levar comigo muitas autoridades dos três poderes da república!”
Com isto, aqueles políticos tentavam amedrontar outras autoridades com poder para prende-los e medo de se verem delatadas, por compartilharem daqueles ou de outros ilícitos do conhecimento dos políticos acusados.
Frequentemente esta frase, ou algumas de suas variantes, é atribuída a pessoas ocupantes de altos cargos públicos ou a expoentes da vida privada que se destacaram em suas atividades, sejam empresários, cientistas, filósofos, religiosos, etc. Muitos falam assim em tom de brincadeira ou se jactando das posições que ocupam; mas, outros tantos estão falando sério.
A pergunta que logo nos ocorre é a seguinte: - Será que vivemos em um mundo de mentiras, em que somos constantemente enganados pelos que detém o poder de decisão e por aqueles que sabendo da verdade, por detrás dos fatos, não a divulgam publicamente?
Entretanto, o que impediria a divulgação da verdade por aqueles que a conhecem? Medo de serem eliminados fisicamente? Temor das conseqüências que adviriam? Fazer parte da conspiração do segredo, como beneficiários deste? Considerar as populações como infantilizadas e sem a maturidade necessária para conhecer a verdade e entender as suas implicações?
Inúmeras são as razões e as possibilidades, conforme podemos supor, e acredito que muitos dos que fazem afirmações deste tipo, também eles, não consigam dormir.
Creio que o Direito Penal poderia incluir um capítulo especial sobre este tipo de ação ou omissão, se ainda não o faz, qual seja: o de alguém conhecer um segredo importante, que ameace a paz, a saúde, a segurança e o bem estar das populações e não divulgá-lo, publicamente, para que as autoridades dele tomassem ciência. Ocorre que, muitas vezes, as próprias autoridades são as detentoras destes segredos ameaçadores, que não são tornados públicos. Como alguns destes procedimentos envolvem violações, explicitas ou implícitas, das leis, razão pela qual são guardados como segredos, não sendo tornados públicos, podem ser comparados, em alguns casos, a ocultação de crimes.
Em razão da importância que determinadas informações têm, para a vida, a saúde e a segurança dos seres humanos, elas não podem ser mantidas ocultas, como segredos, por aqueles que as possuem, sob pena de praticarem, em certos casos, crimes contra a humanidade.
Reconheço a necessidade do segredo acerca de determinados assuntos e informações, por parte das autoridades de um país, quando estes beneficiam a sua população e os seus interesses econômicos, políticos, militares e geoestratégicos; mas, quando estes os prejudicam, é um crime não divulgá-los.
Todavia, o que se vê, frequentemente, são pessoas com destaque importante na mídia afirmarem que detém segredos que, caso fossem revelados, tirariam o sono dos eleitores, dos fiéis, dos consumidores, dos contribuintes; em suma, de populações inteiras. As autoridades teriam, no meu ponto de vista, sob pena de incúria, o dever de chamar tais pessoas para, em juízo, revelarem tudo aquilo que sabem sobre o assunto que mencionaram.
Reconheço, também, que, ao longo da História Humana, muitos daqueles que revelaram publicamente o que sabiam, sobre determinados assuntos, foram alvo de perseguições, de torturas e de morte, por parte daqueles que, na ocasião, detinham o poder. São os casos, dentre outros, de Sócrates, Miguel Servet, Giordano Bruno, Galileu Galilei, Maimônides, etc.
Em que pese tudo aquilo que estas pessoas sofreram, o espírito de solidariedade e de amor aos seres humanos fez com que, como benfeitores da humanidade, se transformassem em mártires da verdade; ao contrário daqueles que historicamente a esconderam e que, eventualmente, vieram a se transformar em sicofantas (biltres, mentirosos, patifes, velhacos) bem sucedidos da mentira.
Conforme alguém já disse, quando o povo acordar, quem não conseguirá dormir são esses mesmos que conspiram contra os interesses da maioria; que vivem maquinando em seus gabinetes operações lesivas às populações; que escondem sob o mais alto sigilo informações que, se tornadas públicas, libertariam os seres humanos de crendices, de superstições e de uma servidão consentida pelo desconhecimento da verdade.
_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
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