sábado, 24 de março de 2018


184. Vocês querem bacalhau?


Jober Rocha*



                                              Os recentes episódios da vida pública nacional me fizeram recordar aqueles antigos espetáculos de Abelardo Barbosa, conhecido como Chacrinha (Surubim, 30 de setembro de 1917 — Rio de Janeiro, 30 de junho de 1988). 
                                                            Chacrinha foi um comunicador do rádio e televisão brasileiros, apresentador de programas de auditório de grande sucesso nas décadas de 1950 à 1980. Foi o autor das célebres frases: "Na televisão, nada se cria, tudo se copia"; “Eu vim para confundir e não para explicar”; “Quem não se comunica, se trumbica”.
                                                               Chacrinha nunca se preocupou em ser coerente. A preocupação dele era sempre a de agradar ao seu público alvo; isto é, aqueles que viam os seus programas na TV.
                                                                Durante os shows que fazia, ele costumava jogar cachos de banana para o público e, em algumas ocasiões, perguntava para a platéia: - Vocês querem bacalhau? 
                                                                 Em seguida, jogava para aqueles que o assistiam ao vivo algumas peças de bacalhau, que eram disputadas avidamente pelos presentes.
                                                             O cenário brasileiro, na atualidade, assemelha-se a um daqueles shows do Velho Guerreiro, como Chacrinha era também conhecido; só que, ao contrário daqueles espetáculos do Velho Guerreiro, os shows promovidos pelas nossas elites não tem hora para terminar. 
                                                                Os três poderes da república com seus espetáculos midiáticos, da mesma forma como ocorria nos shows do Abelardo Barbosa, também não estão preocupados com a coerência.
                                                            O que interessa aos três poderes é agradar aqueles que são importantes para eles, neste rol excluindo-se o povo brasileiro, pagador de impostos e cumpridor de seus deveres de cidadão.
                                                              Muitas decisões tomadas no âmbito dos três poderes têm contrariado, frontalmente, os desejos populares; embora atendam às expectativas de empresários, de políticos e de partidos políticos, que consistiriam no público alvo destas decisões.
                                                                 Parece que ninguém mais se entende nos poderes da república: o judiciário quer legislar; o legislativo quer fiscalizar o cumprimento das leis e o executivo quer passar por cima das leis e não ser julgado.
                                                               Parece que os três poderes vieram para confundir e não para explicar, como dizia o Velho Guerreiro. Cada vez mais, os três poderes da república se afastam daqueles para quem foram criados e a quem juraram servir; isto é, o povo brasileiro.
                                                                   Parece que estes três poderes possuem vida própria, desvinculada dos interesses populares, do patriotismo e da cidadania. Pelas notícias que nos chegam através da imprensa e relativas a inúmeros inquéritos policiais instaurados, na Capital Federal, sede dos três poderes, tudo é negociável e negociado.
                                                                Seguindo os passos de Chacrinha, ao afirmar que quem não se comunica se trumbica, o Governo Federal tem gastado, anualmente, uma fortuna em propaganda e publicidade com notícias sobre as suas parcas realizações, tentando convencer aos eleitores que o dinheiro escorchante que pagam de impostos está sendo bem aplicado.
                                                                Silencia, todavia, o governo, acerca do calote recebido nos empréstimos concedidos aos países estrangeiros amigos, com recursos de impostos arrecadados do povo brasileiro.
                                                                Ao anunciar novos planos e programas de governo, gabando-se do ineditismo e dos supostos benefícios destes, que atingiriam às populações mais carentes do país, esquecem de mencionar que, tanto no governo quanto na televisão, nada se cria e tudo se copia, conforme dizia Chacrinha. 
                                                             Quando vemos o poder legislativo legislando em causa própria e agindo de forma corporativa; o poder judiciário julgando cada caso de uma maneira distinta e sem alegar impedimentos, quando estes existem de fato; o poder executivo governando com decretos-lei e portarias, quase sempre inconstitucionais, só cabe perguntar ao povo brasileiro, que a tudo isto assiste impassível e submisso: - Vocês querem bacalhau? 


_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.


_*/ Crônica.

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