183. Não Permitamos que as Baratas Saiam das Fossas!**
Jober Rocha*
Não é preciso ser um entomologista para saber que muitos insetos – especialmente a barata - buscam cantos escuros e úmidos para viverem escondidos durante a maior parte das suas vidas. Dentre estes locais, um dos mais preferidos pela Periplaneta Americana (barata caseira) é a fossa, por ser isolada, pouco ou nunca visitada pelos seres humanos e por conter alimentos que podem ser extraídos dos dejetos humanos.
Qualquer morador de casa ou qualquer zelador de edifício sabe que uma fossa bem cuidada, limpa e dedetizada com certa freqüência, mantém a população de baratas sob controle. Não as eliminará, em definitivo, pois se reproduzem a taxas elevadíssimas, mas evitará que perambulem em busca de outros alimentos mais apetitosos, pelos pisos, paredes e corredores das habitações, durante os dias e as noites.
O mesmo se passa com os marginais, sejam eles de colarinho branco, de colarinho sujo, sem colarinho ou, mesmo, descamisados. Todos eles necessitam ter suas atividades escondidas, dos olhos dos demais seres humanos, para sobreviverem. Como suas atividades estão sempre à margem das leis - da mesma forma que as da barata estão à margem da rapidez da vista humana – eles buscam as sombras e o anonimato dos covis, dos gabinetes e escritórios, das salas de reunião dos palácios e dos ministérios; bem como a dissimulação e o conluio para perpetrarem as suas ações criminosas.
A Mídia, de uma maneira geral (teoricamente como zeladora do interesse público), funciona como o empregado da empresa dedetizadora que, periodicamente, coloca inseticida nas fossas do prédio para manter a quantidade de baratas sob controle.
Ao divulgar as notícias, os nomes e rostos dos marginais presos pela polícia e ao proporcionar o chamado jornalismo investigativo, levantando denúncias, a Mídia permite manter sob certo controle a população marginal.
Mesmo que vários criminosos não estejam cumprindo pena em nossas prisões (embora já condenados em primeira e em segunda instância), em razão de possuírem bons advogados que sabem explorar as brechas das leis e dos magistrados, muitos daqueles apanhados com a mão na massa ao terem seus nomes divulgados na Mídia, serão identificados por amigos, vizinhos, conhecidos e familiares.
No mínimo, eles perderão amigos e serão discriminados nos locais que costumam frequentar (como restaurantes, aeroportos, etc.), mesmo que permaneçam soltos. Isto é o que eu suponho; mas, em se tratando de um povo como o nosso, crédulo, submisso, inocente e despolitizado, eles podem até se eleger ou re-eleger para cargos políticos e ganharem imunidades para praticarem novas falcatruas, em um círculo vicioso interminável.
Baratas (em suas seiscentas e quarenta e quatro espécies) e marginais (de todas as classes sociais e em todas as profissões ou mesmo desempregados) existem em qualquer lugar do planeta. Os países mais desenvolvidos aprenderam a conviver com eles, mantendo-os sob controle (muitas vezes para sempre, simplesmente, eliminando-os total e definitivamente).
Relativamente às baratas, buscaram desenvolver inseticidas cada vez mais potentes, criando empresas especializadas na aplicação dos mesmos e leis que obrigam todos os imóveis e meios de transporte públicos a, periodicamente, serem dedetizados.
Com respeito aos marginais, punindo com rigor os crimes, sejam eles quais forem e quem quer que o tenha cometido.
A complacência e a tolerância, com baratas e com criminosos, só trás prejuízos para os indivíduos e para a coletividade. É certo que tanto uma quanto o outro, temem a presença do cidadão atento, vigilante e de ação rápida.
Em algumas regiões do mundo, entretanto, em razão do baixo nível cultural e social vigente, muitas pessoas convivem bem com as baratas e com os criminosos.
Não percebem o mal causado pela primeira, pois já se acostumaram a viver em meio à sujeira e da falta de higiene, e convivem bem com o segundo, pois, em razão de necessidades extremas (bem como de seus maus costumes, de sua baixa moral e de seus inúmeros vícios), aproveitam, sempre, algumas migalhas ou recebem alguns benefícios dos marginais com os quais convivem, embora não sendo eles mesmos criminosos, possibilitando uma coexistência relativamente pacífica entre ambos, quase idêntica aquela que eles mantêm com as baratas.
Muitos ideólogos de esquerda consideram, também, os criminosos que se abrigam entre as populações carentes como vítimas da sociedade capitalista exploradora. Dizem isto, com certeza, por que jamais saíram dos países pobres em que vivem para conhecer a realidade mundial.
Em qualquer sistema econômico e em qualquer regime político, existem grupos desfavorecidos vivendo em guetos e nas chamadas periferias. Em todos estes grupos existem líderes, que submetem os demais à força e que vivem de atividades ilícitas ou criminosas. Em qualquer sistema econômico e em qualquer regime político existem milionários vivendo em palácios e se constituindo nas elites e nos governantes, submetendo as populações à força de leis, regulamentos e dos sistemas judicial e prisional, e que vivem de atividades ilícitas ou criminosas. Lembremo-nos que os escravos africanos que participaram da vida colonial das Américas eram vendidos aos árabes, como tal, pelos seus próprios chefes tribais. Os árabes, por sua vez, os revendiam aos europeus.
As baratas, da mesma forma, se existem nos cortiços, também existem nos palácios; afinal, elas surgiram na face da Terra há quatrocentos milhões de anos.
As baratas, da mesma forma, se existem nos cortiços, também existem nos palácios; afinal, elas surgiram na face da Terra há quatrocentos milhões de anos.
Embora vivendo em um país do Terceiro Mundo, onde grande parte da população habita em favelas e possui um baixo nível sócio-cultural e de escolaridade, nós (aqueles moradores de quarenta milhões de domicílios que, segundo o professor José Afonso Mazzon, da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo, forma a Classe Média Brasileira e cujo padrão de moral e de costumes, segundo os teóricos da Sociologia, deve prevalecer sobre aqueles das classes pobres e ricas) somos, assim, os responsáveis pela manutenção dos valores da nossa sociedade e, como tais, devemos, da mesma forma que pegamos um chinelo toda a vez que avistamos uma barata, ser implacáveis na denuncia de criminosos e de seus crimes (notadamente aqueles praticados por políticos e pelas elites, que atingem com seus efeitos maiores parcelas da nossa população).
Este, sem dúvida, é o procedimento adotado pelas classes médias dos países mais desenvolvidos que ousam se revelar e enfrentar a todos eles com suas armas, quando se trata da defesa das leis, da moral e dos bons costumes.
Procuremos manter as baratas e os criminosos contidos em suas fossas, temendo elas nossos chinelos e eles as nossas leis, as nossas cadeias e as nossas balas...
_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
_**/ Crônica
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