sexta-feira, 27 de julho de 2018

240. Outras crônicas sobre o País da Corrupção


Jober Rocha*




1. Tamanho é documento?


                                      Desde pequeno ele sofrera com o reduzido tamanho do seu órgão genital. Nas aulas de ginástica, ao trocar de roupa no vestiário, era sempre alvo de gozações partidas dos colegas de turma. Aquilo o martirizava e o tornava diferente dos demais colegas. Sofria nas mãos dos companheiros de colégio, naquela época, aquilo que hoje é denominado ‘bullying’.
                                                    Os anos se passaram e ele acabou casando-se com uma antiga colega de escola que, embora na ocasião ainda não utilizasse o mesmo vestiário que ele nas aulas de Educação Física, fato corriqueiro hoje em dia em muitas escolas (em razão dos banheiros unissex), sabia daquele problema dele através das gozações partidas dos outros colegas de classe.
                                                 Como o amor é cego, entretanto, passando por cima de todas as vicissitudes da vida, ela acabou apaixonada pelo jeito tímido e introvertido dele.
                                                      Sendo um bom aluno, as suas notas estavam entre as melhores da turma e o ar intelectual que possuía, talvez, tenha sido o grande atrativo que ela tenha visto naquela face pálida e naquele corpo raquítico.
                                                     Casaram-se na capela do próprio colégio,após a formatura dele na faculdade, em uma noite chuvosa e com a presença (felizmente, para ele) de alguns poucos amigos e parentes.
                                                            A noite de núpcias (para aquele casal sem nenhuma experiência prévia) transcorreu normalmente, pois ambos acharam que a ausência de satisfação plena fosse coisa natural em uma relação sexual.
                                                              E assim seguiram-se os anos, sem maiores fontes de prazer na vida do casal além das eventuais férias no Caribe ou as estadias em hotéis cinco estrelas pelo mundo todo (ele, pouco depois de formado, criou uma empresa que, tendo tido meteórico sucesso no mundo dos negócios, em pouco tempo deixou-o multimilionário). 
                                                                 Este meteórico sucesso, todavia, tem uma explicação: tendo ele sido de esquerda durante os anos de faculdade, envolveu-se com colegas que se tornaram guerrilheiros e combateram o regime militar que, pouco antes, havia assumido o poder no país. Com o fim daquele regime, após as eleições que a seguir se realizaram, alguns de seus companheiros assumiram cargos políticos ou administrativos nos três poderes da república. Em virtude disto a sua empresa passou a participar, e a sagrar-se sempre vencedora, de todas as concorrências públicas fraudadas conduzidas por seus antigos colegas de movimento esquerdista, que, em um corporativismo ideológico-venal, apropriavam-se, para eles mesmos, de parte do lucro super-faturado destas concorrências. 
                                                            Em razão da riqueza e dos múltiplos negócios que, desde então, passou a desenvolver no país e no exterior, ele ficava poucos dias em casa com a mulher durante a semana. Em breve, passava mais tempo com a sua secretária-executiva do que com a própria esposa. Em poucos meses ele e a secretária já eram amantes.
                                                             Sobre a sua secretária falarei pouco: possuía ela cerca de 40 anos, divorciada, bela de rosto e de corpo e com um passado rico em namorados e amantes, todos assalariados como ela. Trabalhava na empresa dele há quase dois anos. Elegante no vestir, sóbria no falar, possuía os mesmos gostos e interessava-se pelos mesmos assuntos profissionais que ele. Era totalmente diferente de sua mulher, cujos únicos interesses eram as coisas da casa e as futilidades sobre novelas, roupas e joias. 
                                                              Viajando na companhia dele à negócios, para países distantes, a secretaria acostumara-se aos ambientes luxuosos, às conversas com autoridades governamentais e aos restaurantes famosos ao redor do mundo. Em pouco tempo achou que a única maneira de continuar desfrutando de tudo aquilo era conquistá-lo afetivamente. 
                                                           Assim, fazendo uso de todo o seu charme, passou a provocá-lo durante as viagens, seja usando roupas sensuais, seja tocando-o com as mãos ou nele encostando-se de leve, para que ele sentisse bem de perto o seu perfume; seja lhe narrando aspectos da sua própria vida pessoal, onde enfatizava a solidão e a busca incessante de um verdadeiro homem que a compreendesse e amasse como nunca nenhum outro havia feito.
                                                        Em pouco tempo ele caiu naquele “conto do vigário amoroso” e passou a tê-la como amante. Após algumas relações sexuais, ouviu, por parte dela, um sutil comentário sobre o pequeno tamanho do seu órgão – ela, ao contrário da esposa dele que tinha casado virgem, já conhecera, ao longo da vida, tamanhos P, M, G, GG e XG.
                                                            Tentando agradar ao seu novo amor, ele resolveu buscar auxílio médico para corrigir aquela deficiência. Antes de procurar um médico, no entanto, tentou um determinado equipamento, visto em um anúncio na Internet, que prometia aumentar em dez centímetros o tamanho do referido órgão. Tendo pago a enorme quantia relativa ao preço do produto, recebeu pelos Correios, oito dias depois, um volume que continha dentro uma lupa que aumentava em dez vezes o objeto focado.
                                                                Finalmente, desiludido com a compra, recorreu a um especialista em Andrologia que, após examiná-lo, constatou possuir ele aquilo que era denominado cientificamente como um micro-pênis. Este, no contexto médico, era a condição de um órgão cujo comprimento, quando esticado flácido, media menos do que dois e meio desvios padrões, abaixo do tamanho médio para a sua faixa etária; porém, que se mantinha ativo.
                                                         O médico afirmou-lhe que, aproximadamente, um em cada 200 homens o possuía. Algumas causas identificáveis para a sua ocorrência eram: a deficiência do hormônio do crescimento e/ou gonadotrofinas; pequenos graus de insensibilidade a andrógeno; várias síndromes genéticas  (doenças congênitas) e diversas variações em genes homeobox. 
                                                     Disse-lhe o doutor, na ocasião, que alguns tipos de micro-pênis podiam ser tratados com o hormônio do crescimento ou testosterona, desde que fosse no início da infância. No caso dele, entretanto, afirmou o médico que a solução teria de ser cirúrgica.
                                                               A cirurgia para aumento do órgão, também chamada de Faloplastia pelo cirurgião, na grande maioria dos casos, possuía indicação apenas estética – que era justamente o caso dele - e destinava-se à pacientes que relatavam uma inadequação quanto ao tamanho de seu órgão genital, que era evidentemente o caso dele.
                                                           O cirurgião explicou-lhe que faria a secção do ligamento suspensor do pênis, nas proximidades de sua inserção no púbis, até o nível da aponeurose perineal média, e a sua fixação junto à face anterior do púbis permitiria o avanço distal da haste peniana, através do qual pretendia alcançar um aumento de, no mínimo, quatro centímetros no seu comprimento. 
                                                         Disse o médico que seria uma cirurgia relativamente simples, com anestesia local, onde ele seccionaria, parcialmente, o ligamento suspensor, liberando um segmento de cerca de três a quatro centímetros que ficava embutido internamente na pelve, aumentando, com isto, o comprimento externo peniano, principalmente quando flácido. Disse que seria necessário o uso de um aparelho extensor no pós-operatório, para evitar problemas de retração cicatricial.
                                                              Sem dizer nada à esposa e à amante, ele marcou a cirurgia para a semana seguinte, período em que viajaria sozinho, para a África Central, a negócios – segundo comentou em casa e na empresa.
                                                         Chegando o dia dirigiu-se à clínica, localizada em local ermo e agradável, onde permaneceria por alguns dias convalescendo da cirurgia.
                                                           Terminada a mesma, o cirurgião enfaixou a região com uma bandagem e ele permaneceu ali internado. O médico lhe garantiu que a operação fora um sucesso.
                                                 Assim, foi em um estado de ânimo bastante satisfeito com a sua nova condição genital, que ele esperou o dia em que o médico retiraria os pontos e ele poderia contemplar, com orgulho, o mais novo membro da família.
                                                            Chegando a ocasião por tanto tempo esperada, qual não foi a sua surpresa e desilusão ao contemplar o novo órgão, bem menor que o anterior. O médico, também, se disse surpreendido e sem atinar com o que poderia ter acontecido. 
                                                               Aquela cirurgia sempre dera resultados – falou o cirurgião – e aquele fora o único caso em que a técnica não funcionara. Disse-lhe, ademais, que devolveria os honorários cobrados, pedindo muitas desculpas pelo ocorrido.
                                                                Tão furioso ele estava, que saiu dali direto para o escritório do advogado da empresa. Queria, sob todas as formas, processar aquele ‘charlatão‘, conforme passou a nominar o médico a partir de então.
                                                                 O advogado, com bastante experiência em causas cíveis, explicou-lhe que, para que o médico fosse responsabilizado, criminal e civilmente, e tivesse a obrigação de indenizar um paciente ou sua família, necessário se fazia comprovar que ele houvesse agido com dolo ou culpa. Isto implicaria que fosse provada a existência de negligência, de imprudência ou de imperícia. A única exceção a esta regra (em que não se necessitaria comprovar nada), tratava-se do caso em que o médico responderia objetivamente quando da realização de uma cirurgia plástica estética; ou seja, o seu caso específico. Isso ocorria porque, ao contrário da atividade médica tradicional, neste caso o médico teria uma obrigação de resultado e não de meio. 
                                                                      Ao procurar um cirurgião plástico, para corrigir determinado defeito físico, o paciente esperava um resultado estético, resultado este que o profissional médico se comprometia a atingir ao contratar a cirurgia; logo, não ocorrendo o resultado esperado pelo paciente, este poderia acionar judicialmente o médico, pleiteando uma correção ou uma reparação por danos físicos, estéticos e morais – finalizou o advogado. 
                                                                   Mesmo sem observar o efeito da cirurgia, o advogado garantiu que, no caso alegado por ele, era, sim, passível uma ação de reparação por danos físicos, estéticos e morais.
                                                           Tendo o experiente advogado entrado com a Petição Inicial na Vara Cível da Comarca, pouco tempo depois foi marcada a primeira audiência. 
                                                                  Entretanto, sem que ele ou o seu cliente soubessem, o assunto daquela ação cível havia vazado no interior do Fórum e no dia marcado para a audiência a sala estava repleta de advogados, estagiários e serventuários da justiça, curiosos em conhecer minúcias do caso e em verem o tamanho da ‘peça‘ que motivara aquela causa judicial.
                                                          Ao chegar a Vara Cível acompanhado do advogado, ele estranhou a grande movimentação de pessoas, algumas, inclusive, com máquinas fotográficas e filmadoras. Ao entrar na sala, ouviu logo as primeiras piadinhas: - Essa Vara Cível é maior do que a dele! Ele devia procurar é a Vara da Infância e da Juventude!
                                                      Ele pensou em ir-se embora, imediatamente; mas, o advogado argumentou que aquilo seria desistir da ação e, consequentemente, da reparação a que teria direito.
                                                        Gostaria de dizer aos leitores que até aqui me acompanharam, que ele tivera a coragem e a determinação de ir-se dali, como havia pensado momentos antes, deixando para trás todos os seus argumentos e demandas jurídicas; mas, a exemplo do escritor Camilo Castelo Branco em ‘A Queda dum Anjo‘, também tenho aqui ao meu lado o demônio da verdade, inseparável a todo historiador sincero e que, por isto, não me deixa mentir.
                                                              Naquele exato momento ele relembrou todo o inferno que havia sido a sua vida em razão daquela deficiência, da qual se envergonhava.
                                                           Pensou nos sofrimentos pelos quais passara em inúmeras ocasiões, ao perceber que era incapaz de proporcionar prazer a sua parceira.
                                                               Decidiu, em um rasgo de coragem, que iria até o fim daquela ação; mesmo que todos os parentes, amigos e funcionários da sua empresa viessem a tomar conhecimento dos fatos que o envergonhavam - o que seria certo, já que eles acabariam por se tornarem públicos, em razão da dimensão que aquela ação já havia tomado, perante o meio jurídico municipal.
                                                           Foi de cabeça erguida que ele enfrentou os questionamentos dos advogados da parte do médico réu - pois eram dois - e as perguntas do juiz. 
                                                        Quando expuseram duas fotos comparativas de seu caso, antes e depois, todos riram de ambas, enquanto ele permanecia sério. Estava disposto a ganhar aquela causa para demonstrar que doenças e malformações, quaisquer que sejam elas, não podem ser alvo de chacotas e que os médicos que se comprometem a curá-las – como aquele do seu caso – deviam ser responsabilizados civilmente quando não cumpriam aquilo que prometeram.
                                                        Finda a ação, com a sua vitória, ele era outra pessoa. Cumprimentado por alguns advogados pela sua coragem de enfrentar a tudo e a todos, inclusive a imprensa (que, dada a magnitude do caso, noticiou o fato em primeira página dos principais jornais do país), já não mais sentia vergonha por aquela sua condição. 
                                                              A partir daquele episódio ele iria iniciar uma nova vida, segundo confidenciou ao seu advogado, que, pouco tempo depois de receber seus honorários, acabou perdendo o contato com ele.
                                                             Somente alguns anos após o ocorrido o advogado teve notícias dele, através de uma carta recebida com selos do Tibete: segundo relatava na carta ele havia separado da mulher e tornara-se monge budista, em um convento situado nas altas montanhas do Himalaia.
                                                        Continuava urinando sentado para não molhar o chão do banheiro e, toda vez que olhava para seu micro pênis, sorria complacente. 
                                                     Tamanho, realmente, não era mais documento para alguém que, como ele, se preocupava, agora, apenas com as coisas relativas ao espírito. 
                                                          No entanto, tinha absoluta convicção de que em uma nova encarnação viria com ideologia de direita e muito bem dotado (no mínimo com tamanho GG). Achava que pessoas com condições genitais iguais a dele, nesta existência, possuíam a tendência mórbida de esposarem ideologias de esquerda. 
                                                       Estava, ademais, plenamente convencido de que aquilo pelo que passara nesta vida fora, também, apenas, um teste do Criador, sempre brincalhão e curioso para ver como as suas criaturas se comportavam em situações adversas...



2. Tem culpa eu?


                                          Desde os jogos de futebol da Copa anterior, aquele técnico do time nacional do País da Corrupção – ganhando um salário milionário – montava e desmontava equipes titulares e reservas, com vistas à realização da  próxima competição mundial de futebol.
                                                     As instalações onde as equipes treinavam, em região montanhosa de um dos Estados, eram primorosas e com todos os requintes de um hotel cinco estrelas. Os altos salários dos jogadores, médicos, massagistas, seguranças, roupeiros, etc. etc. etc., seriam suficientes para a manutenção anual dos vários hospitais públicos do Estado, sempre à míngua, implorando verbas para aquisição de material e pagamento da mão de obra.
                                                          As eventuais declarações à imprensa, por parte do técnico e dos jogadores, eram sempre ufanistas; isto é, aquela era a melhor seleção do mundo e aqueles os melhores jogadores, comandados, evidentemente, pelo melhor técnico. Durante os treinos, qualquer passe medíocre de bola era considerado genial pela imprensa. Qualquer gol era uma obra de arte realizada por um gênio da pelota. E assim seguiram-se os meses, até a data da competição para a qual todos treinaram juntos durante tanto tempo.
                                                           O País da Corrupção pelo qual competiriam, onde alguns daqueles jogadores apenas treinavam nas proximidades da Copa; já que, na maior parte do tempo residiam no exterior, era carente de tudo: transporte, saúde, saneamento, habitação, educação, alimentação, etc. etc. etc. 
                                                            Ao invés de fazer como outros países menos frívolos e investir seus escassos recursos naqueles setores mais carentes, as  suas autoridades - respaldadas pela vontade do povo - resolveram, por ignorância, por corrupção e por pura demagogia, candidatar-se para sede da Copa e investir bilhões de reais na construção de supérfluos estádios de futebol, objetivando mostrar ao mundo que eram os maiores e os melhores, naquele esporte bretão.
                                                    As obras realizadas para a construção de novos estádios e para a remodelação dos antigos, custaram mais do que a quantia total gasta nas três copas anteriores, situando-se no entorno dos 30 bilhões de unidades monetárias. Denúncias na imprensa acusavam as empreiteiras, responsáveis pelas obras, de superfaturamento; certamente, com a conivência das autoridades. Muitas dessas obras foram realizadas sem licitação e o custo inicial previsto foi multiplicado algumas vezes. 
                                                         Os recursos que faltavam para todos os setores carentes da sociedade, como em um passe de mágica, apareceram em profusão para a construção dos dezessete estádios programados.
                                                       Em diversos Estados, os estádios construídos serviriam, apenas, para alguns dos jogos da copa. Finda esta, os monumentais estádios ficariam subutilizados; já que, os referidos Estados não possuíam times de futebol para disputas durante o ano, nem público local, que justificassem estádios daquelas proporções. Sem estas condições anteriores, em pouco tempo estariam depredados, sucateados e custando ao poder público elevadas somas, apenas com manutenção e salários de empregados, seguranças e vigias.
                                                      Durante os preparativos, autoridades governamentais faziam apologia das obras (todas de Primeiro Mundo), da seleção, do técnico e dos jogadores individualmente. A imprensa, domesticada pelas verbas estatais de publicidade, cedia espaço para estas apologias.
                                                           A população, desinformada e inculta, seguia acreditando em tudo aquilo que a mídia divulgava. Não importava que o povo estivesse carente de quase tudo (embora o país fosse a oitava economia mundial); pois, o importante na vida daquela gente era ser hexacampeã de futebol.
                                                              Finalmente, tendo chegado o grande dia de mostrar do que eram capazes, constatou-se que o desempenho da seleção nacional nas primeiras partidas fora medíocre. Nas quartas de final fora abaixo da crítica, pois perdeu de 7 à 1 – de forma humilhante - para um país considerado sério, onde o futebol era apenas mais um esporte e não a razão de ser de sua população.
                                                          O povo chorava pelas arquibancadas, pelas ruas e no interior das casas. Os jogadores, em uma demonstração de fraqueza, choravam no gramado. O técnico, pensando no emprego que certamente perderia, também deixava escorrer algumas lágrimas pela face. 
                                                 As pessoas na rua, procurando culpados, queimavam ônibus e depredavam o comércio. A imprensa caia em cima do técnico, apresentando-o como o grande vilão desta história toda mal iniciada e mal terminada. O governo, antes ufanista e agora mudo, nada declarava.
                                                       Todos queriam a cabeça de um culpado para decepar, no lugar da sua própria; já que, o único culpado era o próprio povo, com as suas idiossincrasias, com seu temperamento afável e cordial; despolitizado e leniente com as transgressões e com os crimes da plebe e das elites; com a sua inocência de criança e complexo de ‘vira-latas‘ (sempre submisso às elites e autoridades, nacionais e estrangeiras); com o seu desejo de levar vantagem nas pequenas coisas e a pouca disposição para o trabalho sério e objetivo; com a busca constante de uma sinecura ou de algum ‘encosto‘ na seguridade social ou em uma licença médica remunerada; com a capacidade de acreditar em qualquer mentira que lhe contassem; medroso e covarde quando se tratava de enfrentar os fortes, mas corajoso e valente quando se tratava de combater os fracos; sem patriotismo nas grandes questões, mas patriota ao extremo nas pequenas; com o ego exacerbado, julgando-se um povo privilegiado e melhor que seus vizinhos; sem a garra dos povos forjados nas guerras e nas vicissitudes; enfim, sem as qualidades que realmente fazem de um simples povo uma forte nação.
                                                           Era comum, historicamente, observar atletas do País da Corrupção chorando nas competições nacionais e internacionais, por haverem perdido o primeiro lugar ou por terem sido desclassificados; era comum ver representantes do país adotarem posições subservientes em foros internacionais; era comum ver autoridades rezando por cartilhas estrangeiras. As leis, que muitos não cumpriam, eram tradicionalmente brandas e com passagens que permitiam inúmeros subterfúgios aos infratores, de modo a transgredi-las sem medo e sem remorsos. 
                                                          As autoridades eram condescendentes com os crimes cometidos pelas elites e pelas próprias autoridades. O povo, de uma maneira geral, considerava que os criminosos da plebe eram vítimas da sociedade e, por isso, injustiçados ao serem presos e condenados. A imprensa, de um modo geral, considerava a autoridade policial, quase sempre, errada em suas ações e cerrava fileiras, muitas vezes, ao lado dos criminosos e dos infratores da lei. O Poder Executivo, com decretos e portarias ministeriais, violava, frequentemente, leis federais, estaduais e municipais, sem nenhuma contestação partida de quem quer que seja. 
                                                      Os políticos, do alto de suas importâncias no Poder Legislativo, aprovavam leis que prejudicavam ou eram contrárias aos interesses daqueles que os elegeram; isto é, do povo. O Poder Judiciário, de uma morosidade infinita em alguns casos e de uma ligeireza meteórica em outros, possuía inúmeras benesses que os outros poderes não possuíam e, não raro, colocava-se ao lado das elites em suas sentenças e decisões, ou agia com brandura na aplicação das leis, quando se tratavam de réus oriundos das classes dominantes.
                                                        Na minha modesta opinião, enquanto não houver mudança na consciência dessa gente, só alcançada através da educação e do culto aos valores morais e transcendentais, os falsos culpados continuarão sendo eternamente buscados no lugar dos verdadeiros, sempre que alguma coisa der errado no ‘País da Corrupção‘, fazendo com que os criminosos frequentemente perguntem, irônica e descaradamente, às suas vítimas: - Tem culpa eu?


_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.

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