172. Das dificuldades de se viver em paz nos dias atuais**
Jober Rocha*
Desde o início da vida humana sobre a face do planeta, sempre foi difícil para homem cuidar da sua própria vida, da vida de sua família e da vida de sua tribo, segundo o que descreve a estória que nos tem sido contada pela Ciência (chamo de estória, por que inúmeras descobertas recentes nos mostram aspectos da vida humana que têm sido relegados e desconsiderados pela Ciência oficial, indicando uma história da civilização que pode ter sido falseada ou, mesmo, desconhecida da própria Ciência Oficial).
O mundo em seus primórdios, segundo o que nos ensinam, era, portanto, inóspito e violento. Lembremo-nos, entretanto, que no início da caminhada humana os homens eram ignorantes das coisas físicas e dos assuntos espirituais.
Com o passar do tempo e com o progresso da humanidade, surgiram a Ciência, a Filosofia e a Religião, tripé e alicerce que, supostamente, tem proporcionado a evolução material e espiritual dos indivíduos até os dias atuais.
Assim, decorridos milhares de anos após terem surgidos estes três instrumentos que, supostamente repito, beneficiariam o desenvolvimento humano, constatamos que a natureza humana continua sendo como sempre foi: violenta, egoísta, vaidosa, orgulhosa, vingativa e desumana.
O mundo, também, ainda continua inóspito para grande parte dos seus habitantes (que habitam inúmeros países, ditos subdesenvolvidos e pertencentes ao chamado Terceiro Mundo); embora, neste caso, seja inospitaleiro de outras formas distintas das anteriores (através do desemprego, da fome, da insalubridade, das doenças, etc.), e a violência ainda domina as cidades (promovida pelo crime organizado, pelo tráfico de drogas, pelo terrorismo, etc.) e os campos (promovida pelos agricultores sem terra, pelos guerrilheiros, etc.), em muitos destes países.
Lembremo-nos de que estes comportamentos que eram normais aos seres humanos em passado remoto e que permanecem, até hoje, no caráter dos indivíduos, nos primórdios da humanidade eram considerados como virtudes; porém, mediante uma transvaloração de valores processada ao longo da história, hoje eles são considerados vícios, em conformidade com os comentários que nos deixou o filósofo Friedrich Nietzsche em sua obra ‘Genealogia da Moral’.
Note-se que os seres humanos não se modificaram na essência, mas, sim, na moralidade que passaram a adotar, após a consolidação do cristianismo no Império Romano, entre os anos de 300 e 400 d.C., em suas colônias e nos países limítrofes.
A religião cristã, ao estabelecer a figura do pecado, fez com que as velhas características que permitiram aos seres humanos dominar seus inimigos e conquistar os seus territórios, em benefício próprio e do clã a que pertenciam, passassem, a partir de então, a serem vistas como comportamentos maus e a serem evitados, pois eram dirigidos contra os mais fracos e indefesos, justamente àqueles que eram os protegidos pelo Deus dos cristãos.
Entretanto, para infelicidade nossa, o mesmo velho costume de cortar gargantas, utilizado pelos antigos, ainda continua em vigor no mundo atual; é só contemplarmos, como exemplo, os vídeos disponíveis no You Tube mostrando isso, feitos nas periferias das principais grandes cidades brasileiras e mexicanas, submetidas todas elas a uma guerra civil não declarada nem assumida pelos governos; como também, naqueles vídeos filmados nas guerras civis declaradas da Síria, do Iraque, do Afeganistão, etc., demonstrando que, no íntimo, os seres humanos continuam os mesmos, ainda que tenham transcorridos milhares de anos.
Ocorre, ademais, que hoje em dia com todo o progresso da Ciência e com a toda a riqueza mundial, acumulada através dos milênios, segundo relatório da Organização das Nações Unidas (referente aos Objetivos de um Desenvolvimento Sustentável), treze por cento da população mundial ainda vive em extrema pobreza, oitocentos milhões de pessoas passam fome e dois bilhões e quatrocentos milhões não têm acesso ao saneamento básico. Materialmente falando, os benefícios do desenvolvimento não estão sendo compartilhados igualmente entre todos os habitantes do planeta.
Espiritualmente falando, por outro lado, o que se vê hoje em dia são adeptos das três principais religiões com maioria de fiéis nos países ocidentais (judaica, cristã e muçulmana), guerreando entre si e se digladiando pelas ruas das cidades, em um ódio milenar ainda não superado pelo amor que eles apregoam serem apanágios destas suas três religiões.
As guerras entre os países e as nações, de um modo geral, continuam a produzir vítimas como no passado; só que agora na casa dos milhões e não mais dos milhares. As antigas pestes, que dizimavam as populações, foram controladas pelas vacinas e pelos antibióticos. Ocorre que novas moléstias e enfermidades ainda sem controle, vieram substituir aquelas já controladas, em um processo cíclico e sem fim de ameaças aos seres humanos, inúmeras vezes, mais agressivo e mortal do que todas as moléstias e enfermidades que têm atingido as demais espécies animais.
O homem, tendo se transformado em uma espécie que se multiplicou descontroladamente com relação às demais, está sendo combatido pela própria Natureza, que tem lhe enviado as enfermidades que o atingem como envia pragas para as culturas agrícolas. Ocorre com a espécie humana o mesmo que ocorre na Agricultura com as espécies vegetais, quando desmatamos uma grande área rural rica em espécies nativas variadas e plantamos, no lugar delas, apenas uma única espécie. O passo seguinte é a Natureza enviar uma praga, antes inexistente, para dizimar aquela nova espécie plantada pelo homem, que se proliferou exageradamente sobre as demais. Isto é o que a Natureza também está fazendo com a espécie humana.
Por sua vez, os crimes comuns perpetrados pelos cidadãos também se multiplicaram, em qualidade e em quantidade, não apenas em decorrência da maior população mundial, da amplitude das modalidades criminosas, mas, também, em razão de leis e de sistemas judiciários, muitas vezes, equivocados que, analisando a Sociologia, a Psicologia e as Ideologias de forma superficial e equivocada, consideram, em muitos países, os criminosos oriundos das classes mais pobres, como indivíduos de boa índole que, tendo sido oprimidos pelo sistema econômico dominante e vítimas de uma sociedade injusta, ingressaram na carreira do crime; tratando-os, por esta razão, com uma benevolência que estes mesmos criminosos não dispensaram às suas vítimas.
Antigamente os assaltantes e criminosos eram punidos com a forca, com a prisão perpétua nas masmorras, nas galés, nas minas e nas pedreiras. Os carrascos se multiplicavam e exerciam suas funções laboriosamente, fazendo baixar as estatísticas acerca dos crimes praticados.
Na atualidade, nas nossas cidades praticamente despoliciadas e incontroláveis quanto a prática de crimes (refiro-me aqui ao caso do Brasil, onde leis esdrúxulas favorecem os criminosos, punindo, muitas vezes, os policiais que os combatem), as facções criminosas se sucedem, ocupando espaços do território em que o Estado já não mais penetra e nem possui soberania, e sempre aumentando seus efetivos e os crimes que praticam.
Em nosso país os familiares dos criminosos presos e condenados recebem salários mensais, para se manter; durante todo o período em que os criminosos, chefes destas famílias, cumprem suas penas. Políticos condenados e presos exercem suas atividades no parlamento recebendo seus salários e dormindo, à noite, na prisão. Condenados, já cumprindo pena, que se candidatam a cargos eletivos, se eleitos tomam posse.
Os familiares das vítimas destes criminosos, por outro lado, nada recebem (mesmo que as vítimas, os chefes destas famílias, tenham sido mortas pelos criminosos que são beneficiados com a benesse governamental do chamado auxílio reclusão).
Visitas íntimas; saídas natalinas; saídas no dia das mães; prisões domiciliares; progressões de penas, segundo as quais nenhum criminoso cumpre mais do que seis anos de cadeia, independente do número de anos ao qual tenha sido condenado, etc., são outras benesses de que desfrutam os criminosos em determinados países como o Brasil.
Criminosos com menos de dezoito anos (os denominados menores infratores) não podem ir para a prisão, mas, apenas, para Centros de Sócioeducação ou abrigos de semi-liberdade e provisórios, de onde fogem, frequentemente, em virtude da total ausência de grades ou da fraca segurança proporcionada nestes locais.
A opinião de alguns representantes da Justiça, do Ministério Público e do Poder Executivo, expressa em audiência pública realizada no Rio de Janeiro no ano de 2016, é a de que “muitos destes menores deveriam estar em liberdade, por terem sido internados por crimes análogos ao tráfico de drogas – considerada uma infração não violenta”.
O STF - Supremo Tribunal Federal está estudando Um Habeas Corpus coletivo que pode converter em domiciliar a prisão de detentas grávidas ou com filhos de até doze anos. O argumento é o de que "confinar mulheres grávidas em estabelecimentos prisionais precários, subtraindo-lhes o acesso a programas de saúde pré-natais, assistência regular no parte e pós-parto, e ainda privando as crianças de condições adequadas a seu desenvolvimento, constitui tratamento desumano, cruel e degradante"
O STF - Supremo Tribunal Federal está estudando Um Habeas Corpus coletivo que pode converter em domiciliar a prisão de detentas grávidas ou com filhos de até doze anos. O argumento é o de que "confinar mulheres grávidas em estabelecimentos prisionais precários, subtraindo-lhes o acesso a programas de saúde pré-natais, assistência regular no parte e pós-parto, e ainda privando as crianças de condições adequadas a seu desenvolvimento, constitui tratamento desumano, cruel e degradante"
É comum aos policiais encontrarem pelas ruas, caminhando livres e soltos, no dia seguinte, os mesmos criminosos que haviam prendido no dia anterior; desestimulando, assim, o trabalho policial.
A esquerda que possuiu o comando do governo nos últimos trinta anos, por ter sua origem nos movimentos guerrilheiros da década de 1960, movimentos estes desbaratados e seus integrantes presos naquela oportunidade, considera que os criminosos nas cadeias e nos presídios são, também, prisioneiros políticos, como eles foram, no passado, e que também possuem ideologia marxista, como a que eles possuíam. Acho que este é um erro crasso de julgamento daqueles que hoje defendem os criminosos comuns e que criticam a polícia em sua atividade de combate e repressão ao crime.
O Movimento Militar de 1964, ocorrido no Brasil naquela ocasião, ao fechar o Congresso e instaurar um regime de exceção, com a utilização dos denominados Atos Institucionais (que passavam por cima das leis já existentes e dos tribunais civis, em razão do surgimento da guerrilha urbana e rural), arregimentou contra si todos aqueles que militavam na área do Direito, inclusive os professores universitários. Tais professores, que também defendiam judicialmente presos políticos, formaram uma (ou mais) geração de alunos que viam com maus olhos os militares e os regimes militares pelos prisioneiros políticos que faziam, alguns deles torturados e até mortos nas prisões. Muitos destes alunos, na atualidade, podem, talvez, se encontrar na posição de advogados, defensores, promotores, procuradores, juízes e desembargadores.
O Movimento Militar de 1964, ocorrido no Brasil naquela ocasião, ao fechar o Congresso e instaurar um regime de exceção, com a utilização dos denominados Atos Institucionais (que passavam por cima das leis já existentes e dos tribunais civis, em razão do surgimento da guerrilha urbana e rural), arregimentou contra si todos aqueles que militavam na área do Direito, inclusive os professores universitários. Tais professores, que também defendiam judicialmente presos políticos, formaram uma (ou mais) geração de alunos que viam com maus olhos os militares e os regimes militares pelos prisioneiros políticos que faziam, alguns deles torturados e até mortos nas prisões. Muitos destes alunos, na atualidade, podem, talvez, se encontrar na posição de advogados, defensores, promotores, procuradores, juízes e desembargadores.
A magnitude do problema chegou a tal ordem, no Estado do Rio de Janeiro, que o governo federal decretou, recentemente, intervenção militar no Estado. A rigor, a intervenção deveria ser em todos os Estados da Federação, tal a dimensão que o crime tomou em nosso país. Quadrilhas dominam o território e o governo de muitos de nossos Estados, dilapidando a economia, desviando os recursos públicos e ameaçando a segurança dos cidadãos.
Considerando tudo aquilo que dissemos até agora, as previsões que podemos fazer para o futuro, não são nada otimistas.
Se, transcorridos tantos mil anos, ainda continuamos sofrendo dos mesmos males que sofríamos como espécie, não há por que imaginar que no futuro as coisas se passarão de forma diferente. A Natureza humana continuará sendo a mesma que sempre foi. A Natureza inóspita do planeta continuará apresentando dificuldades aos seus habitantes (dificuldades que poderão ser de ordem diferente das anteriores) e apresentando, sempre, novas moléstias e enfermidades que objetivem reduzir as populações humanas, relativamente às populações das outras espécies. O comportamento criminoso de parcela da população mundial continuará existindo, como sempre existiu. As religiões, a Filosofia e a Ciência serão sempre incapazes de modificar aspectos do caráter humano que lhe são intrínsecos e que convivem com ele desde o seu nascimento.
Talvez a nossa única saída resida no contato com outras espécies, porventura existentes no Universo, que tenham se organizado de uma maneira melhor do que a nossa e que nos ensinem, finalmente, a conviver em paz e com harmonia, em busca de um progresso que seja, verdadeiramente, compartilhado por todos.
_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
_**/ Ensaio
Oi Jober,
ResponderExcluirGostei muito do seu blog, achei muito pertinente seu texto sobre a dificuldade de se viver em paz nos dias atuais pois retrata bem o nosso dia a dia.
Ah, gostei também da ideia de ter ideias com outras espécies do Universo, uma Utopia e tanto.
Parabéns.
Um forte abraço
André Peçanha
Jober ás vezes me detenho a pensar como seu pessimismo nos é tão útil. Ele tem o poder de nos lançar a novas visões dos problemas humanos, em particular, a sociedade brasileira.
ResponderExcluirParabéns pelo conteúdo de suas análises, mas temos que ter esperança na transformação dos homens aqui mesmo no planeta terra.
Abç do amigo Perez.
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