167. Sobre a falta de assuntos**
Jober Rocha*
Qualquer escritor há de convir que, discorrer sobre a falta de assuntos para escrever, é uma das coisas mais difíceis que existe.
O assunto, qualquer que seja ele, tem a propriedade de preencher (bem ou mal) todas as linhas de uma página e vai motivando o leitor a seguir o raciocínio do escritor até o final do texto.
A falta de assunto, por sua vez, abordada em algum texto, tem que ser bem conduzida (eu diria, até, que com certa maestria), para que aquele que lê o mesmo não o abandone logo de início e vá dedicar-se a alguma outra tarefa ou atividade mais útil.
Assim, como vêem os meus amigos, não é nada fácil encontrar-se frente ao teclado e não ter nenhum assunto interessante na mente sobre o qual discorrer, ao menos, algumas páginas.
Eu compararia esta sensação de agonia e de desespero, que alguns escritores vivenciam ao passar pela situação, ao mesmo que sente um prisioneiro prestes a ser fuzilado e que encara o pelotão de soldados já entrando em forma, recebendo a munição e alimentando as suas armas, sob o olhar sério do comandante que, em breve, dará as três ordens fatais: Preparar! Apontar! Fogo!
É a mesmíssima sensação, estou convencido, que outrora sentiam os condenados franceses ao serem conduzidos em carroças-prisão à Place de Grève ou Place de l’Hôtel de Ville, em Paris, onde perderiam as suas cabeças na conhecida guilhotina.
O famoso escritor francês Victor Hugo, com certeza, passando por um momento como esse em que eu hoje me encontro (isto é, sem nenhuma imaginação sobre o que escrever) e, talvez, tendo a mesma ideia de comparação daquilo que sentia com a sensação dos condenados que eu tive, deve ter resolvido escrever a sua obra conhecida como “O último dia de um condenado”, conseguindo, com muito trabalho, chegar a cerca de cinquenta páginas.
Vejam meus amigos que, mesmo para um escritor famoso como ele, momentos de total ausência de idéias podem ocorrer com freqüência. O que dirá, então, para aqueles que, como eu, ainda se engatinham pelo mundo da Literatura?
Desde o tempo dos sofistas, na Grécia antiga, a arte de enrolar leitores e ouvintes já fazia parte da Filosofia e era estudada e aprimorada. O sofisma, como sabemos, consiste em um raciocínio capcioso que objetiva defender algo falso e confundir aquele que contradita com o sofista. O sofista sempre procede de má fé e o seu objetivo é ganhar a discussão, mesmo não tendo razão.
Os mais conhecidos sofistas gregos foram Protágoras, Górgias, Hipias, Licofron, Pródico, Trasimaco e Cálicles.
Os sofistas, portanto, eram mestres em fazer com que posições impopulares passassem a ser convincentes; tornando, ainda, o argumento mais fraco no argumento mais forte, fazendo, apenas, uso de falácias. Da mesma forma, quando se tratava de sofistas escritores, seus textos buscavam confundir e distrair os leitores da tese sendo discutida, fazendo com que, ao final, ficassem com aquela sensação estranha de que nada absorveram nem aprenderam com aquele texto lido.
O filósofo Arthur Schopenhauer, em sua obra ‘Como vencer um debate sem precisar ter razão’, estabeleceu 38 estratagemas da chamada Dialética Erística, formando um verdadeiro catálogo de trapaças bastante interessante, cuja ideia não era a de ensinar o leitor a trapacear, mas, apenas, prepará-lo para se defender das argumentações desonestas de seus adversários em eventuais debates.
Como vêem os amigos leitores, o mundo da Literatura está repleto de textos filosóficos, romances, novelas, contos, ensaios, crônicas, poemas, trabalhos científicos, etc. escritos por poucos escritores que têm, na realidade, alguma coisa a dizer e por muitos que, nada tendo, apenas desejam ser bem remunerados pelo tempo que gastaram.
Grande parte daqueles que escrevem com frequência, possui o único objetivo de vender palavras a leitores ávidos por conhecimento e/ou distração. Todavia, em muito poucos textos os leitores encontrarão o que, realmente, procuram. Por vezes, grandes bibliotecas particulares são formadas por obras sequer lidas ou, muitas vezes, apenas folheadas, por tratarem de assuntos desinteressantes, apenas constatados após adquiridas as obras literárias.
A peça literária que mostra o seu valor, na minha modesta opinião de aprendiz, é aquela em que o leitor segue lendo com interesse até o final e, quando termina, não se sente traído pelo escritor, finalizando o texto sem aquela sensação de que este o obrigou a perder o seu precioso tempo com alguma obra totalmente sem assunto...
_*/ Economista e Doutor pela universidade de Madrid, Espanha.
_**/ Crônica de humor
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