348. Olha o Maniqueísmo aí, gente!
Jober Rocha*
O Grêmio Recreativo e Escola de Samba Estação Primeira da Mangueira, cujas cores tradicionais são o verde e o rosa, sempre que desfila durante o carnaval do Rio de Janeiro é precedido do grito de algum carnavalesco que brada ao microfone: - Olha a Mangueira ai, gente!
As cores do Maniqueísmo, ao invés do verde e rosa da Escola de Samba Mangueira, são o branco e o preto, muitas vezes, encontrados nos mosaicos dos pisos das catedrais e sempre presente na sala dos passos perdidos dos templos maçônicos.
Segundo encontramos nos dicionários, o Maniqueísmo é uma filosofia religiosa e dualística fundada e propagada pelo profeta persa e filósofo cristão do século III, Mani, Manes ou Maniqueu, e as suas ideias sincretizavam elementos do zoroastrismo, do hinduísmo, do budismo, do judaísmo e do cristianismo. O filósofo dividia o mundo, simplesmente, em duas partes, uma boa (Deus) e outra má (Demônio), razão do branco e do preto como suas cores.
Mani acabou por ser crucificado no final do século III e seus adeptos, depois de inicialmente aceitos, acabaram sendo perseguidos por todo o Império Romano. Todavia, em que pese tudo isto, o Maniqueísmo permaneceu vivo como religião e doutrina filosófica até meados da Idade Média.
A matéria física da qual os seres humanos são formados, segundo o profeta e filósofo persa, era intrinsecamente má e o espírito, etéreo, eterno e divino, em oposição a matéria, era intrinsecamente bom. Com a popularização do termo ao longo da história, no entanto, maniqueísta passou a adjetivar toda doutrina fundada em dois princípios opostos, um do bem (que tratava da parte boa) e outro do mal (que cuidava da parte má).
Esse dualismo de princípios se opunha ao monismo. O primeiro deles afirmava que a mente e o corpo eram duas substâncias diferentes convivendo juntas e o segundo dizia que a mente e o corpo eram, na realidade, uma única substância.
O Dualismo atual, por extensão do dualismo de Mani, tornou-se, assim, um conceito religioso e filosófico que admite a coexistência de dois princípios necessários e complementares, embora tratando-se de duas posições ou de duas realidades contrárias entre si, como o espírito e matéria, o corpo e a alma, o bem e o mal e que estejam, um e outro, em eterno conflito.
Este conceito é similar ao conceito taoista de Yin e de Yang, surgido muito antes das teorias de Mani, entre os anos 770 e 221 a.C., onde yin e yang são duas energias cósmicas opostas e complementares que, embora conflitantes, estão presentes em todas as coisas no Universo. Yin significa escuridão, sendo representado pelo lado pintado de preto, e yang é a claridade, o lado pintado de branco. Mani, sem dúvida alguma, deve ter-se baseado neste princípio mais antigo ao estabelecer os fundamentos da sua doutrina.
Neste particular, e considerando tudo o que até agora foi mencionado, vê-se que a moderna ideologia marxista também copiou e adotou uma nova forma de dualismo ideológico, sem a conotação religiosa de Mani.
Nada mais vivo e atual do que o dualismo marxista e ateu, principalmente aquele estimulado pelos postulados de Antônio Gramsci (1891-1937) ao buscar alterar, aos poucos, as estruturas que compõem os pilares de sustentação da sociedade, desde os valores morais e sociais, até os políticos, dividindo os seres humanos e suas relações psicossociais entre dualismos tais, como esquerda e direita, nós e eles, heterossexuais e homossexuais, pobres e ricos, crentes e ateus, brancos e negros, comunistas e fascistas, etc.
Estas criações gramscistas fazem parte daquilo que o filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900), alguns anos antes de Gramsci formular seus postulados, definiu como Transvaloração de Valores e que, modernamente, tem sido colocada em prática através do conhecido Comportamento Politicamente Correto, onde a genealogia da moral, ao invés de ser baseada em princípios religiosos tradicionais, passou a ser baseada em princípios políticos e ideológicos de esquerda.
Ocorre que, de tanto propalar e difundir o dualismo como marco de separação entre eles (os comunistas/socialistas, os bons, os justos, os preocupados com a melhoria das condições sociais do povo) e nós (os capitalistas/fascistas, os burgueses maus, os exploradores do povo, os patrões capitalistas selvagens), aqueles ativistas, militantes e ideólogos marxistas passaram a raciocinar e a agir também de forma dual em suas próprias vidas particulares; isto é, pregando o marxismo e se dizendo marxistas, em teoria, ao falar para as populações pobres e crédulas dos países subdesenvolvidos, mas, na prática, gostando de viver bem, de acumular dinheiro ilícito e de gastá-lo em companhia dos companheiros de partido e das elites ricas dos países capitalistas, que costumam frequentar viajando pelos continentes em seus jatos particulares.
Isto é o que tem sido visto por todos nós, de forma costumeira, através da mídia nacional e internacional. Políticos, desportistas, artistas, empresários e ideólogos, todos se dizendo de esquerda e oriundos dos países subdesenvolvidos, gastando o dinheiro público desviado dos governos a que serviram, que comandaram ou que ainda comandam (sendo que muitos destes políticos e governantes chegaram ao poder de forma fraudulenta, em eleições viciadas) nos países ricos do primeiro mundo, consumindo nababescamente em restaurantes caríssimos, em hotéis de luxo, comprando objetos de consumo nos ricos magazines, desfilando com veículos que custam milhares de dólares, possuindo mansões no exterior e desfrutando de gordas contas correntes em paraísos fiscais, fruto de recursos desviados ou de propinas recebidas de empresários amigos, nas concorrências fraudulentas por estes vencidas em vendas e em obras para os governos dos referidos políticos.
Ninguém gosta de exibir mais poder e riqueza do que os pequenos títeres venais da esquerda mundial, notadamente aqueles que pertencem às cleptocracias governantes dos países de esquerda mais pobres da América Latina e da África.
São todos eles maniqueístas sem se darem conta, na medida em que acham que a sociedade humana está dividida segundo os seus conceitos distorcidos e egoístas do que deva ser considerado bom e mau, e na medida em que em suas práxis diárias contrariam tudo aquilo que costumam pregar na teoria marxista, que querem fazer-nos crer ser verdadeira (por ter sido escrita de forma ininteligível e incompreensível, para eles, por Karl Marx) e o único caminho que conduziria ao paraíso terrestre da massa trabalhadora.
Não mencionam que nos países marxistas, os trabalhadores continuam sendo aquilo que sempre foram, isto é, simples trabalhadores. Nem dizem que o patrão Estado costuma ter um coração mais duro do que o do patrão burguês. Não falam, também, que nos países capitalistas a ascensão social costuma ocorrer com bastante frequência em qualquer estrato social; fato este que só ocorre esporadicamente nos países comunistas.
Como vivemos no País do Carnaval, toda vez que um governante de esquerda assumisse o poder no Brasil e iniciasse o desfile de posse com a faixa presidencial atravessada no peito e em pé no Rolls-Royce (usado pela primeira vez por Getúlio Vargas, nas comemorações do Dia do Trabalho, em 1953), acenando para o povo presente na Praça dos Três Poderes da Capital Federal, algum assessor ou porta-voz da presidência deveria pegar o microfone e, com a melhor dicção possível, gritar em alto e bom som para o público: - Olha o Maniqueísmo ai, gente!
_*/ Economista e doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
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