segunda-feira, 27 de maio de 2019

278. Romeu e Julieta modernos


 Jober Rocha*



                                A história de Romeu e Julieta, de William Shakespeare, passada entre os anos de 1553 e 1554 em Verona, na Itália, tem como protagonistas os apaixonados amantes Romeu Montecchio e Julieta Capuleto.
                                       A cidade é o palco do conflito histórico entre duas famílias tradicionais: os Montecchio e os Capuleto. Por um infortúnio do destino, Romeu, filho único da família Montecchio, e Julieta, filha única da família Capuleto, conhecem-se durante um baile de máscaras e apaixonam-se perdidamente. As duas famílias eram tradicionais inimigas e ambos os jovens, já compromissados com terceiros, tiveram que romper seus relacionamentos, causando, ainda, mais confusão e inimizades.
                                                 Segundo alguns historiadores, Shakespeare deve ter se inspirado em uma história da Grécia antiga, de Píramo e Tisbe, que data do século III, segundo a qual uma jovem apaixonada vai em busca de um veneno qualquer para tentar escapar de um casamento indesejado.
                                                   Durante a renascença, ainda conforme relatam os historiadores, proliferaram narrativas de amor semelhantes a esta e, no ano de 1530 (antes, portanto, da peça teatral de Shakespeare ser divulgada) Luigi da Porto publicou uma estória que parece haver inspirado, posteriormente, aquela do poeta inglês, que manteve a mesma cidade, os mesmos nomes dos protagonistas e de suas famílias, na estória que escreveu posteriormente.
                                                    A referida estória de Luigi, também, tem como cenário a cidade de Verona, os protagonistas são nobres e as famílias em questão, os Montecchi e os Cappulletti. Os dois principais protagonistas chamam-se, inclusive, Romeu e Giulietta.
                                                  Desde então, inúmeras versões literárias foram feitas para esta peça, sob a forma de contos, peças de teatro, crônicas, romances e novelas. Também o cinema entrou em cena, com algumas versões da mesma estória.
                                            O resumo da estória, certamente, todos os leitores já sabem, sendo, portanto, dispensável mencioná-lo.
                                               O que eu imagino estará aguçando a imaginação e a curiosidade dos leitores é o fato de querer conhecer a estória de vida do Romeu e da Julieta modernos, que dá título a este texto e que passarei a relatar a continuação. Informo a todos, antecipadamente, que se trata, apenas, de uma simples ficção literária; pois desejo manter amigos e fiéis aqueles pouco leitores que tenho e que podem querer identificar algum dos personagens mencionados com pessoas conhecidas, de seus relacionamentos ou que, eventualmente ,admirem.
                                                 Romeu era filho de um militar, destes que vibram com a profissão que escolheram e que procuram fazer todos os cursos possíveis, visando tornar-se um guerreiro cada vez melhor. Como filho de militar, Romeu já residira em diversos Estados da Federação, à medida que ia crescendo e ao tempo em o seu pai ia sendo promovido.
                                             Em determinada época da vida militar, o pai de Romeu, em razão dos baixos salários dos militares, resolveu sair a luta em defesa dos companheiros de farda; tendo promovido algumas manifestações públicas que foram consideradas inconvenientes pelos superiores hierárquicos, que acabaram por puni-lo.
                                             Inconformado com a punição, o pai acabou solicitando sua baixa da vida militar e foi dedicar-se a outras atividades.
                                    Dentre estas atividades, sobressaiu-se a da política. Eleito vereador por um pequeno partido, poucos anos depois era eleito deputado por um partido maior. Como tal, teve que mudar-se para a Capital Federal, onde passou a residir com a família.
                                               Romeu começou, a partir de então, a frequentar a vida social da capital onde morava. As festas e recepções se sucediam, ora na casa de desembargadores, ora de ministros, ora de senadores, ora de altas autoridades do executivo. Romeu ficou conhecendo muita gente importante, comungando das mesmas ideias e da ideologia de seu pai e pensava, futuramente, entrar também para a política.
                                                Certo dia o pai lhe comunicou que iriam a uma recepção no Palácio do Governo Federal. O Presidente da República e família iriam receber diversos embaixadores de países estrangeiros, e uma delegação de cinco deputados escolhidos ao acaso, dentre os quais ele era um deles, havia sido convidada com as respectivas famílias.
                                                 Trajando a sua melhor roupa, na hora aprazada, Romeu estava em companhia do pai na fila de cumprimentos ao Presidente da República e a sua família.
                                                   O presidente era um sindicalista com apenas o primeiro grau, que havia sido eleito há poucos meses em uma campanha considerada fraudada por diversos oponentes.  Embora com poucos conhecimentos formais e reduzida formação cultural, ele era, no entanto, uma águia em ver longe a possibilidade de ganhar dinheiro; um mangusto (animal comedor de cobra) em malandragem, no trato diário com os  seus pares na política; um louva-a-deus-orquídea ou uma borboleta coruja em mimetismo (capacidade de se disfarçar) com as suas maquinações ilegais, em conluio com empresários; uma formiga cortadeira em disposição e força para carregar, para as suas várias residências particulares, tudo aquilo que conseguia desviar dos palácios públicos que frequentava.
                                                        Em que pese tudo isto, o presidente possuía uma filha, chamada Julieta, da mesma idade de Romeu, que, naquele dia, se encontrava na fila dos cumprimentos junto ao pai e que, comungando das mesmas ideias e ideologia dele, planejava, também, entrar para a política.
                                                   Eu não estava presente àquela solenidade e, portanto, não posso dizer nada com relação a eventual beleza da jovem. Tampouco posso dar minha opinião acerca da aparência de Romeu, jovem este que jamais conheci pessoalmente.
                                                        O que posso afirmar é que se tratou de amor à primeira vista, aquela relação entre eles. Romeu hesitava em largar a mão da jovem e está não parava de encará-lo com um sorriso embevecido.
                                                       Findo os cumprimentos, os dois encontraram algum pretexto para se encontrar e, a partir de então, ficaram juntos até o final da recepção.
                                                 A conversa entre eles não havia passado despercebida entre o deputado e o presidente. O presidente quis saber quem era aquele jovem que estava com a sua filha e consultou um assessor. Pouco depois, este lhe informou que se tratava do filho de um deputado de partido de direita, opositor ao partido de esquerda que havia elegido o presidente. Isso foi o bastante para deixar-lhe com uma forte azia até o outro dia pela manhã. O deputado sabia ser ela filha do presidente e aquilo, da mesma forma que ocorrera com um salgadinho gorduroso, não havia descido bem pela sua garganta.  
                                                  Na manhã seguinte, que amanhecera com um sol radiante, o presidente pensava em ter uma conversa privada com a filha e explicar-lhe que não ficava bem manter amizade com o filho de um opositor de direita, notadamente por que soubera, através do assessor, que o deputado de direita era um crítico ferrenho ao seu partido de esquerda, sendo considerado o inimigo número um da esquerda pela bancada (composta por vários partidos esquerdistas) que monopolizava a câmara e dava sustentação ao governo. 
                                              Ao conversar com a filha, mais tarde, no salão oval do palácio presidencial, foi por ela informado de que aquilo não era uma simples amizade; mas, que estava apaixonada pelo filho do deputado.
                                                  O presidente quase teve um ataque apoplético, ficando vermelho como um pimentão. Coçando a barba, começou a proferir impropérios e a gesticular a esmo. A filha levantou-se e foi embora, deixando-o sozinho.
                                               Ficaram dias sem falar um com o outro. O presidente pediu ao seu Ministro das Relações Exteriores que conversasse com ela, explicando que era como uma sina: filhos de país de direita têm que ser de direita e filhos de país de esquerda têm que ser de esquerda. Em razão disto, filhos de direitistas não podem se relacionar afetivamente com filhos de esquerdistas, e vice-versa; notadamente quando se trata da filha do Presidente da República.
                                          O ministro conversou com a irredutível jovem e a situação continuou a mesma. Ela estava apaixonada pelo jovem.
                                          Por vezes, ela fugia do palácio sem que os seguranças percebessem e passava dias na companhia do amante em um local da capital que só eles conheciam. Um belo dia o presidente fez uma ligação telefônica para o deputado e ambos se insultaram à vontade, sob os olhares espantados dos empregados e familiares. Aquela relação entre seus filhos tinha que terminar, acabaram concordando depois de muito insulto mútuo.
                                         Os dois jovens, no entanto, possuíam um amigo comum, que era juiz federal e, certo dia, estando os três tomando uma bebida e conversando sobre amenidades, em um bar da moda, na Capital Federal, ocorreu a ela uma ideia que lhe pareceu genial: espionaria as atividades ilegais do pai (que ela sabia existirem) e forneceria material suficiente para o juiz abrir uma investigação, de modo a afastar o pai da presidência, no mínimo, por improbidade administrativa. Com o pai afastado do alto cargo que desfrutava e sem a pressão política que sofria, seria mais fácil para os dois jovens darem prosseguimento ao seu relacionamento amoroso, era o que ela pensava na ocasião.
                                                 Pouco tempo depois, com base nas informações fornecidas pela jovem, começaram as prisões de empresários, de políticos e de executivos do governo.
                                                   Em breve, através de delações premiadas de empresários e de executivos, todas as maquinações envolvendo o presidente tornaram-se conhecidas das autoridades judiciais. Em pouco tempo as prisões estavam cheias de cúmplices do presidente que, após um processo de rápido trâmite, teve seu mandato presidencial cassado mediante impeachment. 
                                                Condenado em primeira e em segunda instância, o presidente foi mantido, a partir de então, preso em um presídio federal.
                                                     Enquanto isto, o pai de Romeu, por uma dessas circunstâncias do destino, candidatou-se ao cargo de presidente, vago em razão do impeachment havido e em razão das novas eleições marcadas para o preenchimento do referido cargo.
                                                   Em uma rápida campanha, contando com o apoio das redes sociais e com o desejo de mudança da população (desalentada com os políticos de esquerda e com suas maquinações visando, exclusivamente, desviar verbas públicas para seus partidos e para as suas próprias contas correntes particulares), o pai de Romeu foi eleito para o cargo máximo do poder executivo.
                                                   A partir de então o pai de Romeu iniciou uma dura campanha para desfazer o aparelhamento ideológico efetuado pelo pai de Julieta em toda a administração pública. Ao mesmo tempo, enviou diversas medidas ao parlamento buscando sanear as despesas, conter a criminalidade, reduzir os impostos e tapar os ralos por onde escoavam boa parte dos recursos públicos para os bolsos dos políticos e de seus apaniguados. 
                                                   Romeu, logo a seguir, influenciado por um pensador, filósofo e ideólogo de direita, residente nos USA, terminou seu relacionamento com Julieta, alegando que a beleza não é tudo na vida de uma pessoa; que o caráter, a cultura e a ideologia dos indivíduos são muito mais importantes do que uma eventual beleza física, que porventura possam desfrutar.
                                             Julieta, desconsolada com o término do relacionamento, aceitou a ajuda de um empresário amigo de seu pai e partiu para Paris, pensando em fazer alguma coisa, em cursar algo, que preenchesse o seu currículo, até então, vazio. Com uma gorda mesada, dada pelo empresário, foi residir em um apartamento cedido pelo mesmo na Avenue des Champs Elysées. Passava as tardes comendo em bons restaurantes, percorrendo os shoppings ou assistindo a filmes pornôs. A noite percorria casas noturnas em Montparnasse e só se recolhia ao apartamento com o dia clareando. De vez em quando enviava um cartão postal para o pai, na prisão, contando de suas aventuras e desventuras em Paris.
                                                     Em algumas ocasiões, durante o pôr do sol, Romeu, deitado em uma espreguiçadeira na piscina do Palácio Presidencial, e Julieta, sentada nas margens do Sena com as pernas balançando na beirada do cais, pensam em como a vida tinha sido favorável para eles livrando-os um do outro. Realmente, vencida a primeira fase de deslumbramento e estase com a beleza física, ninguém consegue viver junto com alguém com quem não tenha afinidade política. Nessas ocasiões Julieta recordava-se de como o amor levara-a a trair seu próprio pai, delatando seus relacionamentos promíscuos com empresários venais. Aquilo, todavia, não a incomodava, pois via como o pai traia a própria esposa, mãe dela, todos os dias e sem nenhum remorso.
                                                    Romeu, nessas mesmas ocasiões, pensava em como o destino havia sido bom para com ele. Imaginava-se casado com Julieta e todos os dias discutindo com ela, acaloradamente, acerca das matérias que estariam sendo votadas no parlamento, onde ambos, certamente eleitos como pretendiam, talvez estivessem ocupando mandatos eletivos por partidos ideologicamente contrários.
                                                   - A vida, hoje, seria um inferno para nós dois se aquele relacionamento tivesse prosseguido – pensavam ambos, há milhares de quilômetros de distância um do outro.
                                                 Em uma ocasião Julieta passeando pelo Quartier Latin contemplou, em uma banca de livros próxima do Sena, a obra “Roméo et Juliette, de la Haine à l'Amour” e resolveu compra-la para ler depois. Adquiriu o livro, apenas, porque continha seu próprio nome na capa, mas jamais chegou a folheá-lo, pois não gostava de ler.
                                                         Romeu, quase na mesma ocasião, pouco antes de embarcar em um voo no aeroporto da Capital Federal, entrou na livraria do aeroporto em busca de um jornal para ler a bordo.                                                       Em uma prateleira viu um livro de William Shakespeare com o título de Romeu e Julieta.
                                                       Por alguns minutos contemplou a capa do livro, pensando consigo mesmo: - Puxa, escapei de boa!
                                                       Em seguida, deu meia volta e foi-se embora, sem nem mesmo comprar o jornal.


_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.


sexta-feira, 24 de maio de 2019

277. A Economia das bactérias, dos vírus e dos fungos


Jober Rocha*

 


                                                Os dicionários de termos econômicos, existentes no mercado, definem os bens livres como aqueles cujos acessos são realmente livres a todos os indivíduos, indistintamente, sem a concorrência no consumo e sem que seja necessário pagar por seus usos. Esses bens estão, portanto, disponíveis livremente no ambiente em que vivemos. São estes os casos da luz solar, da água e do ar que respiramos, dentre outros.
                                                    Os dicionários costumam finalizar a definição com estes dois vocábulos “dentre outros”, embora não mencionem quais seriam os outros a que se referem. Tudo o mais que você procurar, caro leitor, já possui dono (ou para consegui-lo é necessário pagar algum imposto ao governo), a exceção, até agora, do ar, da água que cai do céu e da luz solar.
                                               Buscando algo novo, além destes três já mencionados, que ainda fosse livre, lembrei-me, finalmente, de mais três: das bactérias, dos vírus e dos fungos.
                                                 Nada pagamos para obter milhões, senão bilhões ou trilhões deles. Basta passar a mão em um corrimão de ônibus; em uma sola de sapato; segurar uma nota velha de um Real; aguentar quieto durante uma espirrada ou uma tossida no seu rosto, enquanto está de pé dentro do vagão do metrô. Realmente, estes três são também bens livres.
                                                 Ocorre que alguns espertos (diversos leitores dirão: alguns altruístas e abnegados) não podendo se apropriar deles com fins comerciais para obter lucros (por ser algo impossível, já que os micro-organismos são encontrados livres na Natureza em quantidades inimagináveis e se multiplicam em quantidades mais inimagináveis ainda, desde que em um ambiente favorável), tiveram a ideia genial de ganhar dinheiro combatendo-os.
                                                       Desta forma, uma verdadeira economia foi montada em torno do combate e da busca pela reprodução (é isso mesmo, reprodução) de micro-organismos (bens livres), mobilizando imensos recursos, pessoal especializadíssimo, laboratórios moderníssimos, incentivos e renúncias fiscais, etc.
                                                Inicialmente, trataram de combater os micro-organismos inventando processos biológicos e substâncias químicas que os afetassem, destruindo-os ou amenizando os seus efeitos danosos. Posteriormente, para que isto se transformasse em um ‘moto continuo’, perpetuando os imensos lucros produzidos, mediante estudos de engenharia genética, conseguiram modifica-los, fazendo com que fossem necessárias, periodicamente, atualizações dos processos e dos medicamentos necessários para combatê-los.
                                                     Muitos cientistas afirmam que os micro-organismos mencionados sofrem mutações naturais, decorrentes de um mecanismo evolutivo que leva em consideração os processos biológicos e os medicamentos empregados para combatê-los, tornando-os imunes a eles. Assim, eles se tornariam resistentes para aqueles medicamentos e processos tradicionais, sendo, pois, necessários novos medicamentos e processos para destruí-los eficazmente, em um 'moto continuo' que manteria as engrenagens sempre em movimento gerando lucros para os fabricantes.
                                                    Ocorre que alguns pesquisadores já declararam publicamente que os cientistas podem, eles mesmos, modificar geneticamente os micro-organismos e preparar processos e medicamentos que os combatam. Ora, para isto virar uma indústria não falta mais nada, desde que a ética não se faça presente nem a vigilância sanitária e as autoridades da área da Saúde Pública dos países produtores e dos países consumidores de processos biológicos e de medicamentos.
                                                      É voz corrente, ainda, que as autoridades sanitárias públicas, desaparelhadas, sem recursos e sem pessoal técnico qualificado, seguem a reboque dos centros de pesquisas científicas, públicos e privados, com muitos doutores, diversos pós doutores e mestres em profusão, com equipamentos moderníssimos e com verbas imensas para pesquisas promissoras e sempre lucrativas. Desta forma, periodicamente, somos alvejados com novos medicamentos e novos processos biológicos, que os técnicos afirmam serem mais eficientes que os anteriores contra estes nossos inimigos invisíveis a olho nu.
                                                  Pelo que pude perceber, independente de quaisquer considerações de ordem filosófica, altruísta, filantrópica e religiosa que se possa fazer, trata-se, evidentemente, de um excelente negócio comercial. O pulo do gato está, pois, não em se apropriar do bem livre, mas, sim, em evitar que ele fique livre, isto é, que fique sem controle.
                                                      Com os novos processos biológicos e os novos medicamentos, seus possuidores terão, a partir da aquisição deles nos locais de venda, o poder de impedir a sua proliferação, de controlar seus efeitos, de destruí-los.
                                                      É, sem dúvida, uma maneira engenhosa de ganhar dinheiro combatendo algo que está livre na Natureza e que, portanto, não pertenceria a ninguém.
                                                   Por outro lado, cientistas vinculados aos governos ou à algumas empresas que para eles prestam serviços, encontraram, também, uma forma criativa de ganhar dinheiro com estes bens livres mencionados, porém, agora, de maneira contrária.
                                               Tais cientistas reproduzem estes micro-organismos com a finalidade de armazená-los em grandes quantidades, visando a uma eventual guerra bacteriológica futura.
                                               O pulo do gato, neste caso, é modificar geneticamente os micro-organismos (mantendo estocados, também, medicamentos e processos biológicos eficazmente desenvolvidos para destruí-los) de modo a que os eventuais inimigos, desconhecendo as modificações feitas, não possam neutralizar os efeitos dos novos micro-organismos com os tradicionais medicamentos ou processos biológicos disponíveis em seus países.
                                              Vejam, pois, meus caros leitores, que os micro-organismos, algo até então livre na Natureza como os raios de sol, a água e o ar, já estão aprisionados. A estatização da água, por sua vez, já ocorre em várias partes do mundo. Em muitos países a água do subsolo já pertence ao governo, não podendo ser apropriada ou explorada pelo detentor do solo. Em muitos países, os micro-organismos existentes no solo urbano (necessários para a produção vegetal) são, também, de propriedade do governo, fazendo com que o proprietário do solo urbano não possa cultivar o seu próprio solo com hortaliças, legumes ou frutas. Em alguns países a captação e o aproveitamento particular da energia solar é proibido. Em alguns outros a energia eólica só pode ser captada pelo governo.
                                                 Resta a estatização do ar, dos raios solares e da temperatura ambiente. O efeito da luz provocada pelos raios solares já foi substituído pelo das lâmpadas (proporcionando ganhos aos seus produtores, que recolhem impostos aos governos), o efeito da temperatura ambiente pode ser modificado pela calefação e pelo ar condicionado (também produzindo ganhos aos seus produtores e impostos aos governos). Sobrou, apenas, o ar atmosférico, que ainda não tem um substituto barato, fácil de ser utilizado pelos indivíduos e que permita aos governos arrecadarem impostos e aos empresários lucros.
                                                         Como a criatividade humana é muito grande e a sua ganância também, estou convencido de que muito em breve surgira um substituto para o ar que respiramos ou, então, em virtude desta excessiva ganância humana, nós todos iremos parar de respirar...


_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.


quinta-feira, 23 de maio de 2019

276. Revogando a Lei da Oferta e da Procura


Jober Rocha*

 


A chamada Lei da Oferta e da Procura é uma decisão coletiva que busca estabilizar ou achar o ponto de equilíbrio entre a demanda e a oferta de um determinado bem ou serviço. Oferta é a quantidade do produto oferecido por quem o produziu ou a quantidade que está disponível para compra no mercado; enquanto a procura é o interesse dos consumidores, existente em relação ao referido produto.
Em tese, quanto mais alto o preço, mais produtores estarão dispostos a produzir o bem ou serviço. Teoricamente, quanto mais baixo o preço mais consumidores estarão dispostos a adquirir o bem ou serviço. A um determinado preço consensual, os produtores e os consumidores farão negócio; pois aquele é o preço que, junto com outros condicionantes, satisfará a ambos.
 A oferta depende não só do preço, mas da quantidade da matéria prima disponível e da tecnologia utilizada na fabricação, dentre outras coisas relacionadas aos produtos e aos serviços. A procura é influenciada não só pelo preço, mas pela necessidade do consumidor, pela compatibilidade entre o preço e a qualidade do bem e pela facilidade de aquisição do produto. 
Ao contrário do que pode parecer, a princípio, o comportamento da sociedade não é influenciado tão somente pelos preços dos produtos, embora o peso dos preços seja, quase sempre, o fator que exerça a maior influência na decisão de vender ou de comprar algum produto ou serviço. 
O preço de qualquer produto ou serviço pode ser um estímulo positivo ou negativo para que os consumidores adquiram o bem ou o serviço de que necessitam; mas, não é apenas este o único estimulo existente. Vigoram, também, os desejos e as necessidades das pessoas; o poder de compra delas; a disponibilidade dos bens e serviços e a concorrência eventualmente disponível; a existência de produtos complementares ou substitutos e a capacidade de as empresas produzirem os bens procurados com um determinado nível tecnológico desejado.
Essas são as regras existentes em qualquer economia. A decisão de ofertar e de demandar é um misto de comportamento social, psicológico, grupal, racial e, até mesmo, filosófico, existente em todas as comunidades onde existam empresários empreendedores e produtores, operários trabalhadores e um público consumidor. Como para produzir algo com uma determinada escala de produção, que seja aquela necessária para atender grandes contingentes populacionais, torna-se mandatório a utilização de capital financeiro, este sistema passou a se denominar capitalista. 
A origem do capitalismo, no entanto, por vezes, é confundida com a origem da Revolução Industrial, embora uma coisa nada tenha a ver com a outra. O capitalismo, praticamente, sempre existiu; ora sob a forma da posse de terras, ora sob a forma da posse de exércitos, ora sob a forma da posse de frotas mercantes, ora sob a forma da posse de joias e tesouros, ora sob a forma da posse de dinheiro, ora sob a forma da posse de tecnologia acerca de como produzir algo. 
Quando alguém que possuía alguma destas formas de capital desejava ter algo novo ou obter mais poder, fazia uso daquilo de que dispunha da melhor forma possível. O capital pode, assim, ter várias formas, dependendo da época e do local considerados. A informação, hoje em dia, por exemplo, é uma nova forma de capital.
O sistema Comunista, lastreado na obra de Karl Marx denominada O Capital (que consistia em uma crítica ao capitalismo), tentou implantar um sistema de economia planificada na qual a Lei da Oferta e da Demanda fosse abolida, considerando apenas a importância do Estado, como produtor, e do proletário, como trabalhador. 
O Estado fixaria os bens e os serviços que seriam produzidos, bem como as suas quantidades e os seus preços. Fixaria, também, o salário dos trabalhadores, ademais dos bens e serviços a serem produzidos já mencionados, e a quantidade destes bens e serviços que os trabalhadores poderiam adquirir. Esqueceu-se, o Estado Comunista, obviamente, dos desejos dos consumidores; razão pela qual, este regime jamais funcionou a contento em nenhum dos países onde foi realizada a sua implantação, seja de forma pacífica seja através da violência. O Estado controlar os preços, por definição, é a receita natural para o fracasso de qualquer economia.
O preço de um produto não pode ser definido por um planejador central, pois segue leis de formação próprias. Quando isso acontece as informações no mercado são destorcidas e, consequentemente, os incentivos, tanto para os produtores quanto para os consumidores, também sofrem alterações, gerando, assim, desequilíbrios entre a oferta e a demanda. Recentemente um grande país da América do Sul, onde foi implantado um governo comunista, tabelou os preços dos produtos agropecuários, dos medicamentos, etc. Resultado, as empresas pararam de produzir e hoje a população passa fome e não dispõe de medicamentos. 
Segundo Adam Smith, autor da celebre obra A riqueza das Nações, “O consumo é o objetivo e o desígnio único de qualquer produção”. Ou seja, normalmente, ninguém produzirá algo que não objetive ser consumido por alguém. O mesmo não ocorre com o consumidor, que possui desejos não satisfeitos. Mesmo que ninguém produza o bem ou serviço, o desejo por eles, da parte dos consumidores, continuará existindo. 
Ocorre que nos países comunistas, por razões de disputas ideológicas e de defesa, os governos preocupam-se muito mais com a produção dos bens de capital (indústria pesada, armamentos, indústria espacial, construção naval, etc.) do que com a produção dos bens de consumo. Como não se pode suprimir a vontade do consumidor por decreto, surge o mercado negro. Assim, aquilo que o trabalhador não encontra nas lojas ele busca no mercado negro, que é tolerado e até facilitado pelos dirigentes comunistas (que através dele, quase sempre, amealham imensas fortunas). 
Embora os países comunistas possuam economias planificadas, todas estas economias (no que se relaciona aos bens de consumo) devem ser, de fato, consideradas como de mercado, onde a Lei da Oferta e da Demanda permanece sempre soberana. Se o Estado não produz algo que a população deseja, esta vai obter aquilo que procura de alguma outra maneira, seja através do contrabando seja da produção artesanal. O Estado comunista faz vistas grossas para ambos, pois sabe de sua impossibilidade em atender aos desejos consumistas dos proletários, que desejam o consumo tanto quanto os trabalhadores dos países capitalistas.
Por outro lado, a produção, em qualquer país do mundo, sempre é feita com o emprego do capital e da mão de obra, e o proletário trabalhador, em sua grande maioria, seja no comunismo ou no capitalismo, deseja, apenas, ganhar o suficiente para manter uma família e poder contar com serviços satisfatórios de saúde, alimentação, habitação, vestuário, transporte e segurança. 
Nos países capitalistas, por sua vez, os proletários não desejam, como afirmava Marx, ser os donos dos meios de produção (coisa que também não são nos países comunistas, onde continuam sendo o que sempre foram; isto é, proletários). Quando muito, aqueles que conseguem poupar trabalhando em países capitalistas, aplicam no mercado financeiro (visando receber juros) ou no mercado acionário, comprando ações preferenciais sem direito a voto, de empresas industriais, comerciais ou de serviços (visando receber dividendos e especular com a cotação das ações). Os proletários nos países comunistas, além de não possuírem os meios de produção, não costumam ganhar o suficiente para poupar. 
Não conseguindo controlar a economia, os países comunistas controlam tudo o mais, isto é: a vida social, a educação, a mídia, a justiça, a política, a ideologia, etc. A liberdade, de uma maneira geral, como aquela que vigora nos países capitalistas, evidentemente, não existe nos países comunistas. 
O fato de existirem empresas privadas em países comunistas faz com que muitas pessoas, desavisadas, afirmem que determinados países que sempre foram comunistas deixaram de ser, pois, na atualidade, existem inúmeras empresas privadas neles atuando. Ledo engano, pois tais países continuam sendo comunistas em tudo aquilo que podem, menos na economia, que, felizmente, segue suas próprias leis, como a velha Lei da Oferta e da Procura.
O regime comunista, cuja base econômica foi fornecida por Marx, jamais conseguiu superar o regime capitalista por ignorar aspectos importantes do comportamento psicológico dos seres humanos. Para a implantação do comunismo tenta-se vender para as massas humanas simples ideias e formulações, maquinadas por pensadores e ideólogos de esquerda, como sendo verdades absolutas fruto de leis historicamente determinadas. A Lei da Oferta e da Procura, base da economia de mercado e do sistema capitalista, por sua vez, é lastreada em comportamentos psicológicos e sociais dos indivíduos e não no chamado Determinismo Histórico.  
Isso me faz lembrar uma antiga piada, contada sobre um ditador que, tendo assumido o poder através de um Golpe de Estado, desejava aumentar os preços dos charutos e do rum. Seu Ministro da Economia ponderou que não seria possível, em virtude da existência da Lei da Oferta e da Procura. O ditador, chamando a secretária, mandou que datilografasse um texto que ditou na hora pedindo que fosse dada, logo a seguir, ampla divulgação ao mesmo. O teor do texto era o seguinte: 

O Comandante Supremo da Revolução, no uso dos seus poderes discricionários obtidos mediante o movimento armado vitorioso, que contou com total apoio popular, através do presente decreto, resolve:

Revogar a Lei da Oferta e da Procura; bem como, todos os demais dispositivos que sejam contrários à presente revogação.

Cumpra-se!

Palácio do Governo, aos tantos dias do mês de tanto, do ano de mil novecentos e tanto. 


_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
               

sábado, 18 de maio de 2019

274. Contemplando, no Face, a verdadeira face do Brasil


Jober Rocha*

 


                                          Em 18 de maio do corrente ano, pesquisando o Facebook, me deparei com a seguinte notícia, publicada no endereço PolíticaEstadão.com.br: Bolsonaro divulga texto de autor desconhecido que fala num Brasil “ingovernável” fora de conchavos.
                                               O texto, endossado pelo presidente da república, faz um alerta de que o país nunca foi, e talvez nunca será, governado de acordo com os interesses dos eleitores. Segundo o autor do texto, o país é governado, exclusivamente, para atender aos interesses de corporações com acesso privilegiado ao orçamento público, aí incluídos os servidores sindicalistas, os sindicalistas de toga e grupos empresariais bem posicionados nas teias do poder. Estes os verdadeiros donos do orçamento. 

                                                    Bolsonaro provou, segundo o autor, que o Brasil fora destes conchavos é ingovernável; porém, Bolsonaro declarou em entrevista pública que jamais se renderá a tais conchavos.
                                                         Ainda no Facebook, encontrei no endereço Exame.Abril.com.br: Para 75% dos brasileiros Bolsonaro está no caminho certo, aponta IBOPE.
                                                      O autor do primeiro texto mencionado afirma, ainda, que o país está disfuncional e Bolsonaro não é o culpado, pois não destruiu nada, não aprovou nada. Só tentou e fracassou. Sem nada poder fazer, caso não entre em acordo com os “donos do Brasil” (o que já declarou que não fará), a hipótese mais provável é de que o governo será desidratado até morrer de inanição ou prepararem o seu impeachment.
                                                          Esta desidratação já começou, com a mídia fazendo carga contra o presidente, seus familiares e assessores. Todas as declarações que Bolsonaro faz são criticadas e a cizânia é plantada entre os membros do governo, buscando jogar uns contra os outros e os internautas contra todos.
                                                 Todavia, seguindo em frente nas páginas do Facebook, contempla-se uma situação caótica no país que, embora ali mencionada, não causa nenhum efeito entre as nossas autoridades, que parecem desconhecê-la ou dela não fazerem caso. A prioridade de todos é desconstruir o mito Bolsonaro, posto que ele não é ‘gente de conchavo’; isto é, não é um presidente confiável.
                                                      Estou certo de que qualquer país do mundo cuja situação interna caótica se equiparasse a nossa, já teria sofrido uma intervenção militar. Aqui a coisa segue em 'banho Maria', com a maioria da população desconhecendo a verdadeira situação econômica e financeira do país e sem atentar para o fato de que, se as reformas propostas não forem aprovadas pelo parlamento (que deseja barganhar a sua aprovação, trocando-as por vantagens pessoais, partidárias e de grupos), o país irá fatalmente a bancarrota. 

                                                 Muitos brasileiros, ideologicamente comprometidos com a ideologia marxista e beneficiários de sinecuras, nepotismos e benesses com recursos públicos oriundos dos últimos governos de esquerda, torcem para que a moralização proposta pelo governo atual de errado e o país volte a ser o que era nos tempos dos desvios de dinheiro público. Em manifestações públicas pedem que o principal chefe e articulador da quadrilha que dilapidou os cofres públicos, condenado, preso em Curitiba e respondendo, ainda, a vários outros processos judiciais, seja libertado.
                                              Mas, voltando ao quadro caótico brasileiro sobrepujado pelas notícias manipuladas sobre o atual governo, encontramos no Facebook deste sábado, 18 de maio, as seguintes notícias:


. 91% dos países cresceram mais do que o Brasil de 2011 a 2018 (Valor.com.br)
. Pobreza no Brasil subiu para 21% da população, entre 2014 a 2017, diz Banco Mundial (Oglobo.globo.com)
. Lula e Dirceu comandavam esquema que resultou no assassinato de Celso Daniel, segundo ex petista (Veja.Abril.com.br)
. Câmara concede passaporte diplomático a 404 filhos e cônjuges de deputados (Isto é.com.br)
. Professora que vai virar filme tem diploma falso de Harvard (Brasil.Estadão.com.br)
. Mais de 500 mil funcionários públicos receberam Bolsa Família, diz MPF (G1Globo.com)
. PF aponta que firma de Lulinha recebeu R$ 103 milhões, diz jornal (Exame.Abril.com.br)
. Cunha poderá delatar 150 deputados, 14 ministros do STJ e dos ministros do STF (Diário do Brasil.org)
. Professores e funcionários da UFPR fazem viagens de luxo com dinheiro público (TribunaPR.com.br)
. PT investiu em Universidades por “razões eleitoreiras”, diz Cristovam Buarque (BBC.com)
. Transição da URV para o Real é constitucional, diz STF 25 anos depois (O Antagonista. Com)
. Estudantes ateiam fogo em ônibus (Governabilidade.com.br)
. Governo Lula deixou de gastar mais de 20 bilhões de reais em Educação (OGlobo.globo.com)
. Brasil está em penúltimo lugar em ranking de qualidade na Educação (Guiadoestudante.Abril.com.br)
. Corrupção ultrapassa tudo o que seria imaginável, diz ministro do STF (Notícias-R7.com)
. MEC pagou bolsa do PROUNI a mortos e a alunos de alta renda, diz auditoria (Educação.Uol.com.br)
. Para jornal francês, Congresso Brasileiro é casa de “300 ladrões com título de doutor” (BR.RF1.FR)
. BNDES confirma que empréstimos a Angola e a Cuba são secretos (Gazetadopovo.com.br)
. STF ignora críticas e acerta compra de menu com lagosta e vinho por R$ 481 mil (notíciasBand.Uol.com.br)
. STF decide que importar sementes de maconha não é crime (OGlobo.globo.com)

                                                        Fico estarrecido com a tranquilidade com que essas notícias são veiculadas; com o descaso das autoridades constituídas, com respeito a elas, e com a indiferença popular com relação aos fatos escandalosos que ocorrem diariamente. Parece que a mídia está falando sobre esportes, música e espetáculos culturais e não sobre crimes, desmandos, incompetência, má gestão, corrupção, impunidade. Os internautas leem as notícias e seguem em frente.
                                                            Notem, ademais, que não mencionei nenhum caso (dos inúmeros existentes nas redes sociais) de roubos, assaltos, assassinatos, perseguições, trocas de tiros, sequestros, briga entre facções criminosas de narcotraficantes, etc. Depois de tantos anos de manipulação da verdade, de transvaloração de valores, de desinformação planejada, o povo já não dá mais importância aos desmandos praticados por algumas autoridades dos três poderes, nem aos crimes relatados. As notícias do dia seguinte fazem com que esqueçam as do dia anterior.  


- O nosso país é assim mesmo – pensam muitos leitores.
- Nada fará com que mudemos – dizem alguns.


                                                  O fato é que o país está quebrado por décadas de má gestão, de roubos e sangrias, realizados pelos partidos de esquerda que comandaram os últimos governos. Se as reformas propostas pelo novo governo não forem aprovadas, o caos estará instalado. Muitos maus brasileiros estão torcendo para que isso ocorra, imaginando que a esquerda e o narcotráfico voltarão a comandar os destinos do país, com o dinheiro público irrigando (molhando), novamente, as mesmas mãos molhadas nos governos anteriores. Esquecem que existe uma geopolítica mundial, onde os países poderosos determinam aquilo que será feito. 

                                                         O Brasil quebrado será um prato feito para a instalação do comunismo, coisa que não deverá ser permitida pelo governo do presidente Trump, embora o mesmo já tenha problemas de sobra com o Irã, com a Coreia do Norte, com a China, com a Rússia, com a Venezuela, com Cuba, com o Afeganistão.
                                                   Muitos não acreditam, mas trata-se de uma guerra entre o bem e o mal. O bem, para a mídia venal e ideologicamente comprometida, é apresentado como sendo o mal e o mal como sendo o bem. Poucos conseguem perceber as sutilezas das matérias divulgadas, as meias verdades, as distorções das notícias e dos pronunciamentos, acreditando em tudo aquilo que é noticiado contra o atual governo pela mídia venal, que perdeu as verbas fáceis e volumosas concedidas pelos governos de esquerda para cooptar jornalistas, artistas, articulistas, comentaristas e formadores de opinião, e voltou todo o seu ódio contra o atual governo, inimigo ferrenho responsável pelo corte das verbas públicas destinadas a “fazer a cabeça” da massa ignara de eleitores esquerdistas.
                                                   Como isto tudo terminará é, para mim, uma incógnita. Não vislumbro forças nacionalistas e patrióticas com disposição para comprar uma briga que poderá durar anos e com resultados desconhecidos. A índole do nosso povo é pacífica, conciliadora, crédula, inocente e subserviente. Neste contexto, imagino que ficaremos eternamente sendo comandados pela elite cleptocrata, que define os destinos do país e se apropria do orçamento da união em benefício próprio.
                                              Só resta, àqueles mais lúcidos e que são inconformados com a situação que se apresenta, buscarem outro país para seguirem vivendo suas vidas. Não vislumbro solução para o nosso caso que não passe por um confronto armado, com algo semelhante a Revolução Francesa que durou dez anos, de 1789 a 1799.



_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
   

terça-feira, 14 de maio de 2019

273. As notícias da Mídia e os discos voadores


Jober Rocha*


                                    Os recentes progressos da informática, da computação gráfica, da cinematografia, da holografia, da terceira dimensão e da tecnologia, de um modo geral, fizeram com que nós, simples mortais, passássemos a desacreditar daquilo que nossos olhos viam. 
                                                       Os efeitos especiais mostrados nas películas cinematográficas que contemplamos diariamente foram, como que, criando em todos nós o sentimento de que nada mais é verdadeiro, de que vivemos uma vida simulada onde nada mais corresponde à realidade e onde tudo é possível, já não surpreendendo mais ninguém.
                                                            Muitos filmes e fotos de discos voadores (Ufos ou Ovnis, como são oficialmente conhecidos) não passam, assim, de montagens muito bem feitas de supostos veículos extraterrestres, cujos objetivos destas montagens desconheço, pois aqueles que as fazem investem parcela substancial do seu tempo e do seu dinheiro nelas. Acho que buscam, apenas confundir, desinformar ou ridicularizar algo que pode e deve ser verdadeiro; de modo a que o verdadeiro passe por falso e vice-versa.
                                                   O mesmo ocorre com as notícias veiculadas na Mídia, onde o fato verdadeiro passa pelo falso e o falso pelo verdadeiro. O objetivo é idêntico: desinformar, ainda mais, uma população já desinformada, através da disseminação de notícias contraditórias. Por vezes me questiono se isto não terá saído de laboratórios secretos de análises psicossociais, escondidos no subsolo de algumas regiões desertas de potências desenvolvidas, onde estes temas seriam estudados por profissionais das mais variadas especialidades e subsidiados por verbas fabulosas e extra orçamentárias. 
                                                    Em última análise, o que se buscaria seria fazer com que a massa humana vivesse eternamente em um mundo dos sonhos, onde não distinguiria mais a realidade da ficção. Neste contexto, poderia ser conduzida para qualquer lado desejado pelos ‘donos do mundo’, pois pensariam estar indo voluntariamente na direção que escolheram, desconhecendo que, na realidade, nada mais eram do que membros de um enorme rebanho de animais, supostamente racionais, vivendo uma servidão consentida.
                                                    Esses efeitos ‘especiais’ ocorrem, ademais, nas notícias veiculadas através da mídia. As matérias são propositalmente contraditórias, fictícias ou simplesmente distorcidas de modo a imprimir um outro sentido às declarações verdadeiras. Ao final, não sabemos mais o que é ou não verdade. Está dúvida ocorre, apenas, com uma minoria de seres pensantes, pois a grande massa ignara nem se dá conta de que está sendo ludibriada, iludida e enganada durante o tempo todo. 
                                                      A grande massa sempre foi condicionada a acreditar, tarefa está atribuída desde a mais tenra idade dos indivíduos às diversas religiões inventadas por pessoas sagazes, cujos verdadeiros nomes são, muitas vezes, desconhecidos; pois a história se encarregou de apaga-los ou de escondê-los, tendo permanecido, apenas, seus nomes fictícios ou de fantasia ou os nomes dos personagens de suas tramas, bem urdidas, que conseguiram ver transformadas em religiões.
                                                 Em segundo lugar, somos condicionados a acreditar naquilo que a Ciência nos assegura como verdadeiro; muito embora, constantemente, esses conhecimentos científicos, ditos verdadeiros, estejam, quase que diariamente, sendo substituídos por outros, mais atuais e mais verdadeiros que os anteriores.
                                               Em terceiro lugar, fazem com que tomemos uma posição política particular, de direita, de esquerda ou de centro, de modo a dividir-nos, evitando o que poderia, no caso de todos pensarem da mesma maneira, se constituir em uma união nefasta dos servos contra os seus patrões, os ‘donos do mundo’. 
                                               Em muitos lugares do planeta, onde as populações se mostram mais servis e dóceis, são as mesmas desarmadas em uma medida acauteladora contra eventuais surtos de conscientização, promovidos por agentes externos infiltrados ou por fatores supervenientes  (por exemplo, como alguns acreditam, as denominadas conjunções interplanetárias, previstas pelos astrólogos, que provocam de tempos em tempos a evolução e os aperfeiçoamentos mentais e espirituais nos seres humanos) que possam provocar um imprevisto ‘estouro da manada’, de modo a que, em desabalada carreira para algum paraíso utópico possa esta chegar a destronar, pela força das armas, os ‘donos do mundo’ daquela magnífica posição mandatória que ocupam. 
                                             Em quarto lugar vêm a chamada ideologia, que o conhecido cantor e compositor Cazuza já afirmava “querer uma para viver”. Ao longo da História Humana o papel das ideologias tem sido crucial para convencer as massas humanas a servirem aos ‘donos do mundo’ com absoluto consentimento próprio, sem a necessidade do uso da violência por parte destes para impor a servidão. O escravo nascido em cativeiro, convencido de que viver é servir a um dono, desconhece o que seja a escravidão.
                                                       Mas voltemos às notícias da mídia. As técnicas aperfeiçoadas no que diz respeito às imagens, anteriormente mencionadas, também se estenderam no campo da comunicação. O grande estudioso destas técnicas tem sido um pesquisador norte-americano de 90 anos, chamado Noam Chomsky, linguista, filósofo, sociólogo, cientista cognitivo e comentarista (que se define como anarcossindicalista, anarcocomunista ou socialista libertário) para o qual “os dados empíricos (os fatos) não devem ser subvertidos pelos meios de comunicação, alguns deles condicionados pelas pretensões corporativas e pelo jogo de interesses que intervém na veiculação das informações. A propaganda e a publicidade acabam por influir naquilo que é o senso comum, apelando ao pensamento crítico e ao estudo da influência dos poderes empresariais no que chega ao público. Tudo isto está, também, condicionado pelo viés social, em que existem parcialidades que desestabilizam aquilo que é o sistema social como um todo, a partir do qual os meios de comunicação atuam e divulgam os conteúdos informativos”.
                                                       O fato é que em países como o nosso, onde as leis existem, apenas, para que o resto do mundo as veja e para que possam ser usadas pelos poderosos contra seus inimigos, a imprensa tem (nas últimas décadas de governos de esquerda) sido dependente das verbas públicas de propaganda e publicidade. 
                                                       Verdadeiras fortunas foram canalizadas pelo Estado para diversos órgãos de comunicação, com o intuito de que fizessem o panegírico dos governos e desinformassem o público acerca das mazelas que verdadeiramente ocorriam e que só chegaram ao conhecimento da população através das delações premiadas de alguns empresários presos, envolvidos na chamada Operação Lava a Jato.
                                                           Com o corte, pelo novo presidente eleito, Jair Bolsonaro, das verbas governamentais de propaganda e publicidade, começou uma campanha de desinformação e de conspiração midiática tendente a desestabilizar o seu governo. Vale dizer que essa mídia a que me refiro não possui nenhum compromisso com o futuro do país, nem com os brasileiros, nem com moralidade ou com a verdade. Seu compromisso exclusivo é com o dinheiro.
                                                             Praticamente, todas as notícias propaladas por esta mídia são eivadas de duplos sentidos; de críticas sutis; de deturpações de textos, frases e pronunciamentos do presidente, de seus familiares, de seus assessores mais próximos, de seus ministros e de seus aliados políticos. A coisa é de tal ordem, que, na impossibilidade de tudo aquilo noticiado ser contestado, de imediato, pelo presidente ou por algum porta-voz seu, muito do que é divulgado, sem ter sido desmentido por ninguém, acaba passando por verdade para um público desinformado, despolitizado, inculto e inocente.
                                                     Em muitas situações, para que o leitor perceba que a matéria é falaciosa e não corresponde à verdade dos fatos, é necessário um nível elevado de conhecimento sobre a conjuntura política, econômica, militar e psicossocial, nível este não possuído por grande parte dos leitores. Muitos ficam apenas nas manchetes, não lendo todo o conteúdo dos textos divulgados; conteúdos estes que, muitas vezes, nada têm a ver com as manchetes.
                                                  Trata-se, portanto, de uma maneira inteligente e sagaz de iludir o leitor e criar uma ideia errônea sobre acontecimentos e sobre pessoas do governo, suas declarações e suas intenções, visando desconstruir a imagem do presidente e do seu grupo de colaboradores, apresentando-os de forma negativa. Só aqueles mais esclarecidos e que acompanham a conjuntura diária, conseguem perceber as armadilhas montadas.
                                                   Em um futuro próximo, se isto já não está ocorrendo no presente, de uma maneira geral, não poderemos mais acreditar em nossos sentidos. A inteligência artificial, a robótica, as tecnologias computacionais e de vídeo, o progresso das ciências médicas e psicológicas, dos fármaco-químicos, etc., poderão levar-nos, diariamente, para uma existência totalmente irreal e desvinculada do quotidiano verdadeiro, isto é, daquilo que está realmente acontecendo a nossa volta. Veremos o que não existe; sentiremos o gosto e o cheiro de algo que não possui existência real; tocaremos coisas que, embora falsas, passem por verdadeiras; ouviremos mentiras ditas por pessoas que disseram, apenas, verdades. 
                                                     É o que o futuro nos reserva, segundo podemos inferir da realidade com que hoje nos deparamos. O maior mal disto tudo é que depois das crenças já estarem arraigadas nas mentes humanas, os seus desarraigamentos se tornam praticamente impossíveis; pois, como costumam dizer os nossos marginais pertencentes às inúmeras facções criminosas existentes nas nossas periferias urbanas: - Está dominado, está tudo dominado!!  
                                                 O fato é que para os ‘donos do mundo’, a existência de populações alienadas, desinformadas, incultas, enganadas, iludidas, inocentes, crentes, ignorantes, subservientes, desarmadas e desunidas, como somos em nossa grande maioria, representa a garantia de que as coisas continuarão sempre da mesma forma; isto é, que eles, por muito tempo ainda, continuarão sendo os donos deste pequeno planeta habitado por uma raça estranha e perdido na vasta imensidão dos espaços siderais.


_*/ Economista e Doutor pela universidade de Madrid, Espanha.

segunda-feira, 13 de maio de 2019

272. O Novo Mandarim


Jober Rocha*




                                       O consagrado escritor Eça de Queirós (1845-1900), em sua obra O Mandarim, produziu uma sábia alegoria sobre a riqueza. 
                                              A obra descreve as atribulações de um funcionário subalterno de um ministério qualquer, em Lisboa, chamado Teodoro e morador na pensão de uma viúva. 
                                                Certa noite, ao ler um livro em seu modesto quarto de pensão, a vista lhe escureceu e ele viu, diante de si, um novo livro, em cuja página estava escrito: “No fundo da China existe o Mandarim mais rico de que todos os reis de que a Fábula ou a História contam. Dele nada conheces, nem o nome, nem o semblante, nem a seda de que se veste. Para que tu herdes os seus cabedais infindáveis, basta que toques essa campainha, posta a teu lado, sobre um livro. Ele soltará apenas um suspiro, nesses confins da Mongólia. Será então um cadáver: e tu verás a teus pés mais ouro do que pode sonhar a ambição dum avaro. Tu, que me lês e és um homem mortal, tocarás tu a campainha”?
                                               Após dialogar por alguns minutos com um espectro que lhe apareceu no quarto em seguida, vindo do nada, Teodoro não hesitou e tocou a campainha: “Foi talvez uma ilusão; mas pareceu-me que um sino, de boca tão vasta como o mesmo céu, badalava na escuridão através do Universo, num tom temeroso que decerto foi acordar sóis que faziam né-né e planetas pançudos ressonando sobre os seus eixos...”
                                                    Cerca de um mês depois, um agente bancário, vindo da China, o procurou em Lisboa para entregar-lhe letras de câmbio referentes a herança do Mandarim Ti-Chin-Fú.
                                                      A continuação, o livro trata de como Teodoro se pôs a gastar a fortuna recebida e como o remorso foi, aos poucos, se instalando em sua consciência.
                                                   A Mega-Sena (loteria brasileira), do dia onze de maio do corrente ano, conferiu o seu maior prêmio da história. Quem acertou as seis dezenas do concurso número 2.150 da Mega-Sena irá receber a quantia de R$ 275 milhões de reais. Mal comparando, assemelha-se a herança recebida por Teodoro.
                                                    Fiquei, pois, meditando no que faria, caso fosse eu (que jamais joguei em loterias) o ganhador de tão expressiva quantia. Tendo lido ‘O Mandarim’, posso concordar com o Teodoro, personagem de Eça de Queirós e misto de filósofo e ‘bon vivant’, de que existe um primeiro momento de alegria extrema e desvairada, onde o novo rico percebe que tudo pode. Seu menor desejo pode ser imediatamente satisfeito. No entanto, a possibilidade de chafurdar em um consumo nababesco e sem sentido, onde todos os vícios se sobreponham às virtudes, é enorme. Também é grande a possibilidade de vir a esgotar, de modo rápido e sem critério, a sua fortuna.
                                                Qualquer quantia recebida sem mérito e sem esforço é, normalmente, despendida de forma perdulária; pois, não existe nenhum vínculo psicológico, representado por anos de trabalho, de sofrimento, de necessidades não supridas, de vicissitudes, etc., que ligue o gastador à nova e imprevista fortuna que gasta. 
                                                   Muitos daqueles aquinhoados com prêmios lotéricos terminam, novamente, depois de alguns anos, na mesma situação inicial em que se encontravam antes de ganharem as fortunas que ganharam. Episódios recentes do cenário político brasileiro, por sua vez, mostraram inúmeros políticos, agraciados com polpudas quantias extorquidas de empresários em troca de favores políticos, esbanjando sua riqueza em viagens, lanchas, veículos de luxo, aeronaves, mansões. Tanto gastaram que ficou evidente, para muitas autoridades do Ministério Público, que todo aquele gasto nababesco não poderia ser fruto apenas de salários, despertando a atenção das autoridades. Como estamos no Brasil, a chance de saírem impunes é elevada. Em outros países, no entanto, padeceriam alguns anos em algum cárcere isolado e longínquo e ficariam sem nada.
                                                    Não quero dizer, todavia, que os afortunados pela loteria devam doar aos necessitados tudo aquilo que o destino resolveu depositar em suas mãos. Estes seriam tantos, e com tanta carência, que seria como jogar um balde d’água nas areias do deserto do Saara; ou seja, eles continuariam existindo em enorme proporção na face da Terra e aquele que assim o fizesse passaria a ser um deles, engrossando ainda mais as suas fileiras. Também não quis dizer, com isto, que não se deva atender aos necessitados. Todavia, estes devem ser casos pontuais e a forma de ajuda-los deve ser bem estudada, para não se tornar algo realizado em vão.
                                                   Filosoficamente falando, segundo penso, aquele que foi agraciado pela fortuna não possui nenhuma obrigação moral de dividi-la com quem quer que seja. Só afirmam que sim aqueles que, eventualmente, pretendam receber alguma parte da fortuna. Por outro lado, aplicar a fortuna em alguma instituição financeira e viver dos juros que ela proporcionaria, embora seja uma forma inteligente de proceder, manteria a fortuna imobilizada em algum cofre de banco, apenas sendo guardada para eventuais herdeiros e seus cônjuges dela desfrutarem no futuro, após a morte do ricaço e o correspondente final do inventário, onde o Estado ficaria com uma grande parte e o advogado com a outra.
                                                  Adquirir imóveis em várias partes do país e, até mesmo, no exterior, vivendo de aluguéis, também é algo que muitos costumam fazer; porém, como na situação anterior, estes imóveis estarão, apenas, sendo guardados para os sucessores e seus cônjuges, que desfrutarão futuramente de tudo isto, sem nada terem feito para tal. Por outro lado, com o degelo polar e a elevação futura dos níveis dos oceanos, muitas áreas litorâneas poderão desaparecer e, com elas, incontáveis imóveis de muitos ricaços investidores. É algo que deve ser ponderado pelos agraciados pela Fortuna (deusa romana), pela Tique (deusa grega) e pela Lakshmi (deusa indiana – todas elas deusas estas que distribuem os bens segundo seus caprichos), antes de adquirirem os seus imóveis à beira-mar.
                                                 Gastar a fortuna em passeios, consumo de iguarias e bebidas finas, roupas de grife, veículos, etc., dependendo do montante desta, representará algo que poderá ser feito eternamente. Se o montante possuído for muito grande, uma única existência pode não ser suficiente para esgotar toda a fortuna de alguém que a possua muito grande. Como não existe nenhum método científico que possibilite a qualquer espírito encarnar, efetivamente, na mesma família e ser o primeiro na linha sucessória em uma nova encarnação, nem que assegure que esta encarnação (caso possa ser feita) se realize de imediato e não com mil anos de intervalo de espera, nada leva a crer que a fortuna não gasta nesta vida possa vir a ser aproveitada em uma outra existência pelo mesmo espírito. 
                                                 Como meus leitores já devem ter percebido, os problemas que afligem aqueles muito ricos parecem ser infinitamente maiores do que os que os que acometem os muito pobres. Não possuir nada e almejar ter é um sofrimento muito menor do que ter muito e não saber o que fazer com o muito que se tem. 
                                                 Outro grande problema que aflige aos endinheirados é a dúvida que os acomete acerca de todos aqueles que deles se aproximam. A grande maioria dos amigos pós-fortuna, sem sombra de dúvidas, é motivada por interesses partidos dos menos afortunados para os mais afortunados. Por esta razão os novos e os velhos ricos são, excessivamente, desconfiados de todos aqueles que deles se aproximam pleiteando amizade.
                                                    Por outro lado, as amizades existentes entre aqueles que nada têm são, estas sim, motivadas pela afeição recíproca. O filósofo Aristóteles (324 a.C. a 322 a.C.), em sua obra ‘Ética a Nicômaco’, foi um dos primeiros a escrever, substancialmente, sobre a amizade, que considerava uma virtude extremamente necessária à vida. Ele distinguia três tipos de amizades: a fundamentada no interesse, a baseada no prazer e a amizade perfeita. A amizade perfeita, segundo ele, “existiria entre indivíduos que são bons e semelhantes na virtude, pois tais pessoas desejam o bem um ao outro, de maneira idêntica, e são bons em si mesmos. Estes seriam amigos em razão de suas próprias naturezas e não por acidente”. Creio ser essa a amizade que prevalece entre aqueles que nada têm, pois seriam amigos em razão de suas próprias naturezas e não por interesses acidentais.
                                                     Pelo que até aqui foi dito, os leitores já podem imaginar que não é tão simples, como parece, ser detentor de uma grande fortuna, adquirida de uma hora para outra. Já é diferente quando a fortuna vem de família, onde aquele que hoje dela desfruta já dela desfrutava quando pequeno e foi criado no fausto comedido, sabendo que a fortuna oriunda dos avós ou dos país deveria ser bem administrada, para poder ser usufruída continuamente por várias gerações.
                                                    Mas, voltando ao início do texto, acho que os leitores estão curiosos em saber dos meus planos para dissipar um montante como este sorteado no sábado passado.
                                                 Em primeiro lugar, após receber o prêmio e me assegurar de que estava bem guardado e aplicado, embarcaria em um cruzeiro de volta ao mundo em uma das melhores companhias marítimas globais. Não comunicaria a ninguém esta viagem para evitar ser, eventualmente, seguido por parentes e amigos em busca de auxílios financeiros para novos projetos mirabolantes ou, simplesmente, para pedidos de empréstimos ou de doações. Minha mesa neste cruzeiro seria uma das mais bem localizadas, servida, sempre, com os melhores vinhos da adega da embarcação. Nos portos visitados eu percorreria todos os pontos turísticos dignos de serem visitados e conheceria os melhores e mais caros restaurantes locais. Uma ou outra joia, que se destacasse pela beleza e qualidade do ouro e da pedraria, seria por mim adquirida.
                                                   De volta do cruzeiro, daria início a um check-up médico em uma das melhores clínicas do país, de forma a estar seguro de que nenhum mal me afligia ou, se fosse esse o caso, iniciar imediatamente o tratamento requerido.
                                                       Caso tudo estivesse normal, me mudaria para uma suíte de um hotel de luxo, onde passaria a viver despreocupadamente, frequentando teatros, concertos, espetáculos musicais e possuindo uma boa biblioteca com as obras mais recentes sobre temas variados.
                                                       Esqueci-me de mencionar: se fosse casado faria tudo isto com a minha mulher. Se fosse solteiro faria tudo isto, cada dia, com uma mulher diferente.
                                                          Estabeleceria uma regra de três simples, na qual eu teria X milhões de reais para gastar e Y anos de vida (levando em conta a minha idade atual e a estimativa da vida que me restava, dada por meus abalizados médicos). Teria, assim, uma determinada quantia em dinheiro para gastar diariamente. Caso algum dia não chegasse a gastar o previsto, no dia seguinte o valor não gasto no dia anterior seria acrescido ao valor do dia, para ser gasto.
                                                       Alguns leitores estarão pensando: - Mas que sujeito egoísta, não pensou em nenhum momento nos pobres e nos necessitados!
                                                      Claro que pensei. Reconheço que o mundo está cheio deles. Por vezes não consigo dormir, pensando na multidão de pobres sofredores a percorrerem as ruas descalços e maltrapilhos implorando algo para comer. Nestas ocasiões, encho os bolsos de dinheiro, solicito meu automóvel ao mordomo e saio pelas ruas, procurando algum restaurante de alto luxo aberto, onde janto algumas lagostas e tomo várias taças de champanhe até ficar meio tonto, a ponto de retornar à minha suíte no hotel e pegar no sono imediatamente.
                                                   Sempre que algum pedinte se aproxima de mim nas ruas, ouço o que ele tem a dizer com atenção e tenho a compaixão de encaminhá-lo a pessoa mais próxima, pedindo a está que o atenda, pois tenho sérios compromissos a tratar no Jóquei Clube e não posso me demorar muito naquele local. 
                                                   Não consigo ver um mendigo com o chapéu na mão, nas escadarias de alguma igreja, sem atirar dentro dele uma bala de hortelã, das muitas que carrego nos bolsos da calça para ocasiões como estas. Estou, portanto, em paz com a minha consciência, se é isso que desejam saber.
                                                   Muitos poderão pensar: - Mas ele, com toda essa fortuna, não pratica nenhum ato de filantropia!
                                                        Claro que eu pratico. Gosto muito de música clássica e, ao menos, uma vez por semana, assisto aos concertos da orquestra filarmônica da cidade. Para aqueles que não sabem, uma orquestra sinfônica é integrada por músicos profissionais, remunerados; enquanto uma orquestra filarmônica (palavra que tem sua origem no termo filantropia) é composta só por músicos amadores, que se reúnem apenas pelo prazer da música, sem nenhuma remuneração e sem a cobrança de ingressos.
                                                     Outros pensarão: - Como é desumano. Não faz nada pelos órfãos carentes!
                                                       Evidentemente que estes que assim pensam não me conhecem. Desde que fui aquinhoado com a suposta fortuna (que tento imaginar, neste texto, como gastaria), a minha grande preocupação com os órfãos fez com que eu percorresse vários asilos da cidade levantando os nomes, filiação e data de nascimento dos órfãos que ali se encontravam. Quando completavam a idade de doze anos eu ia procurar cada um deles, pessoalmente, levando comigo um grande envelope pardo, lacrado.
                                                    Ao trazerem o órfão à minha presença eu pedia a ele que sentasse diante de mim, mencionava que era um homem riquíssimo e que não me esquecera dele no dia em que completava doze anos. Rasgava o envelope, retirava de dentro do mesmo uma folha timbrada e lia para ele o teor da respectiva folha: 

                                                  “Meu caro fulano de tal, na qualidade de milionário que sou, querendo ajudar um pequeno órfão como você a seguir a sua vida com mais tranquilidade, mais esperanças e maiores oportunidades no futuro, venho informa-lo do seguinte":

                                                     "Seu falecido pai está enterrado no Cemitério tal, na quadra tal e na sepultura de número tal. Sua falecida mãe, por sua vez, está repousando na sepultura x, da quadra y do cemitério Z. Espero que algum dia você possa ir visita-los nos locais onde repousam, levando para cada um deles algumas flores". 

"Do seu amigo e benfeitor, Fulano”.

                                                          A cena era tão emocionante e comovente que, por vezes, eu saia dali com lágrimas nos olhos e tinha que tomar vários cálices de vinho do porto antes do almoço, no restaurante do terraço do hotel, para que o apetite voltasse e eu pudesse saborear os pratos da cozinha francesa, que tanto admiro.
                                                    Vejam meus caros leitores que nada é fácil nesta vida. Ganhar uma fortuna talvez seja mais fácil do que gastá-la. Não imagino quem terá sido o feliz ganhador da Mega-Sena deste sábado, mas, com toda a certeza, já deverá estar sendo assediado por amigos, parentes e conhecidos. Espero que possa ter acesso a este texto para que tenha algum balizamento sobre como proceder, sem se deixar influenciar por todos aqueles que, a partir de então, irão assediá-lo diuturnamente e sem se deixar intimidar por uma consciência que, muitas vezes, de tão egoísta e imaterial que é, só pensa nela e em suas virtudes, esquecendo que nós, os seres humanos de carne e osso, também possuímos os nossos vícios...


_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.