286. Sobre a instituição de um novo Prêmio de Artes Cênicas para determinados atores nacionais
Jober Rocha*
Segundo notícias obtidas na WEB, o conhecido Prêmio Molière de teatro foi criado no Brasil em 1963, sob o patrocínio da empresa aérea Air France e, infelizmente, extinto em 1994 por falta de patrocínio.
Desde a sua primeira edição, as vésperas do Movimento Militar de 1964, o prêmio reuniu a nossa classe artística, premiando os principais protagonistas das artes cênicas no Rio de Janeiro e em São Paulo. Por conta disso, mesmo extinto em 1994, ainda é lembrado com saudades, hoje, como o ‘Oscar’ do teatro nacional.
Molière (1622-1673), para aqueles que não sabem, chamava-se Jean-Baptiste Poquelin e foi o dramaturgo francês considerado um dos principais mestres da comédia satírica, não só naquele país, mas mundialmente; além de ser também ator e encenador. Teve um papel de destaque no desenvolvimento da dramaturgia francesa.
Vendo a atual cena política brasileira, deparo-me com autoridades dos três poderes da república que, pelos seus desempenhos nos palcos e palanques nacionais, poderiam, muito bem, vir a ser premiadas com um novo galardão, a altura do famoso Prêmio Molière, caso este novo prêmio viesse a ser instituído sob o patrocínio de alguma empresa privada, dentre as tantas que foram beneficiadas com expressivas verbas públicas ao longo das duas últimas décadas.
Muito mais pendor estas autoridades mencionadas possuem para as artes cênicas, do que para as ciências exatas e humanas ou para a política.
Suas vidas consistem em um eterno representar. Acordam e deitam representando seus papéis, muitas vezes, apenas, para si mesmo, seus familiares ou assessores; na ausência de um público maior assistindo os seus pronunciamentos ao vivo ou pela televisão.
Muitos deles possuem a característica de serem artistas natos. Sem jamais terem estudado artes cênicas, já nasceram profissionais na dramaturgia e na arte de representar fingindo que não representam.
Outros, ambicionando desde jovens carreiras na política e na magistratura, tiveram, na surdina, aulas particulares de Antropologia e Cultura Brasileira; de Cenografia e Indumentária; de Comunicação e Expressão; de Consciência Corporal; de Dramaturgia; de Estética do Espetáculo; de Expressão Vocal e de Fundamentos da Interpretação.
Na atualidade, em seus pomposos cargos na Capital Federal (mas, também, nas capitais dos Estados e nos Municípios), agem como se estivessem em um palco, representando ora um drama ora uma comédia; mas, quase sempre, uma farsa bem urdida por algum teatrólogo e empresário da elite nacional, que custeia as despesas do espetáculo e que estabelece o enredo, o roteiro e os diálogos.
O grande público trabalhador, pagador de impostos e comprador de ingressos, em sua maioria inocente e ignaro, que nada sabe das técnicas teatrais, acredita nas palavras que ouve, ditas por aqueles personagens tão bem vestidos, tão cheios de maneirismos e de empáfia, com ares tão doutorais, com vocabulários tão escorreitos e, muitas vezes, tão herméticos que se tornam incompreensíveis (quer propositalmente, para demonstrar sapiência; quer naturalmente, por serem eles verdadeiramente ignorantes e incultos, alguns até analfabetos).
O nosso público, infelizmente, em sua maioria, não é capaz de distinguir a realidade da ficção; de discernir um bom texto teatral de um mau texto; de perceber a diferença entre um bom ator e um ator medíocre.
Tais autoridades com suas técnicas de representação tentam, publicamente, justificar o injustificável, dar credibilidade ao descrédito, certeza à dúvida, mérito ao demérito, abonar o desabonado e honrar o desonrado.
Os críticos deste tipo de teatro, por se tratarem de pessoas com mais cultura e experiência do que a média, acostumados a assistir dramas, comédias e farsas de melhores qualidades sendo desempenhados, todos os dias, nas ribaltas mundiais, não se deixam impressionar por estas representações caboclas, pois já viram artistas mais gabaritados representando peças mais elaboradas, em espetáculos memoráveis por esse mundo afora.
Nossas autoridades, no entanto, por lhes faltarem a ‘cultura dos grandes espetáculos’ e devido ao número reduzido de críticos com coragem suficiente para apupa-las e desnudá-las no próprio palco onde se encontram representando, fazem o que querem durante seus espetáculos, saindo, até mesmo, fora do texto ou ‘script’ original; certos de que, ao final, serão ovacionadas por uma plateia que, tradicionalmente, aplaude qualquer coisa; desde que se lhe ofereça gratuitamente, na entrada ou saída, um copo d’água gelada e um cafezinho.
Os demais coadjuvantes e figurantes desses dramas, comédias e farsas são, quase sempre, familiares dos atores principais, que, mediante sinecuras e nepotismos (típicos destas grandes famílias periodicamente residentes na capital federal), obtiveram lugares cômodos e de pouco trabalho, embora bem remunerados com verbas públicas, nas peças diariamente em cartaz.
O país inteiro contempla, ao cair da noite, em horário nobre e nos principais canais de televisão, alguns destes atores em suas representações quotidianas. Quantos rapapés, quantos revirar de olhos e olhares de soslaio, quantos meneios de cabeça, balançar de cachos, topetes e melenas; quantos ademanes, trejeitos, cofiar de barbas e bigodes fazem, ao se sentirem observados pelos telespectadores de todo o país.
Quantos acessos simulados de indignação e de fúria em que reverberam contra as ‘injustas’ críticas populares que recebem periodicamente; quantas demonstrações de bonomia, de bondade, de compreensão e de compaixão pelo ‘enorme e injustificável sofrimento popular’, eles demonstram nas telinhas de nossas casas, de nossos locais de trabalho e nas telonas dos shoppings e dos restaurantes que frequentamos.
Quantos monólogos e diálogos, previamente decorados e acertados com os repórteres e os jornalistas, são apresentados ao público como sendo conversas espontâneas de alguém que foi pego de surpresa, na hora exata em que rumava para a sua mansão, no Lago Sul da Capital Federal, após um dia estafante ou para o seu gabinete de trabalho, no Plano Piloto, em uma manhã ensolarada.
E assim, meus queridos leitores, somos os espectadores diários destas peças teatrais que têm sido, nas últimas décadas, encenadas nos palcos e palanques nacionais por grandes artistas, porém de mentes medíocres. Alguns destes grandes atores costumam se aposentar nos palcos, ainda representando após anos de bela e tranquila vida na ribalta. Outros, mais medíocres que estes, se revezam de quatro em quatro anos por não conseguirem mais arrancar aplausos da plateia com suas velhas e já gastas piadas e são substituídos por outros, com piadas e caras novas.
As peças, todavia, costumam ser sempre as mesmas e pertencentes a um dos três gêneros mencionados: drama, comédia ou farsa. Algumas delas começam como dramas e viram comédias; mas, todas elas, invariavelmente, nada mais são do que simples farsas, nas quais alguns espertos se apropriam, ao final, de tudo daquilo que a bilheteria conseguiu arrecadar.
Creio que encontrar alguma empresa que pudesse custear a instituição deste novo prêmio proposto não seria difícil, tantas foram aquelas que enriqueceram nas últimas décadas em que o Tesouro Nacional abriu as suas torneiras em busca de apoio político para o governo e de propinas para muitas de suas autoridades.
O prêmio, segundo penso, não deveria passar de uma pequena estatueta e de um diploma, pois, estou certo que de dinheiro em espécie nenhum dos eventuais e possíveis homenageados carece. Resta saber qual o nome que o novo prêmio deveria ter; já que são tantas as personalidades nacionais que poderiam ser homenageadas dando-lhes seus nomes ao referido galardão.
O prêmio, segundo penso, não deveria passar de uma pequena estatueta e de um diploma, pois, estou certo que de dinheiro em espécie nenhum dos eventuais e possíveis homenageados carece. Resta saber qual o nome que o novo prêmio deveria ter; já que são tantas as personalidades nacionais que poderiam ser homenageadas dando-lhes seus nomes ao referido galardão.
_*/ Economista e Doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
Membro da Academia Brasileira de Defesa.
Nenhum comentário:
Postar um comentário