413. Perdendo o Bonde da História...
Jober Rocha*
Estimados leitores, creio que todos nós, seres humanos, em alguma ocasião na vida, já tivemos a nítida impressão de haver perdido o Bonde da História. Explico-me melhor. Perder o ‘Bonde da História’ deve ser entendido como perder-se no contexto de algo ou de alguma situação e pode ser sentido de diversas maneiras, em distintas ocasiões.
Na juventude, por exemplo, quando não aceitamos um novo emprego ou um novo cargo que nos foi oferecido ou desistimos de algum outro que tínhamos anteriormente e descobrimos, pouco tempo depois, que um conhecido nosso tendo aceitado aquela nova oportunidade que se descortinava para ele ou que lhe havia sido oferecida em razão da nossa desistência, estava em situação profissional e financeira muito boa e com um belo futuro pela frente; isto é, em melhor posição do que aquela que nós desfrutávamos no momento.
Na idade adulta, por exemplo, quando nós, homens, terminamos o relacionamento com uma jovem mal produzida, cujo corpo na ocasião possuía apenas linhas retas e constatamos, logo após ela haver saído de nossa vida e se relacionado com outro, que surgiram nela, a partir de então, belas curvas antes inexistentes e, tendo passado a usar roupas de ‘griffe’ e a cuidar da sua beleza em salões apropriados, era outra pessoa totalmente diferente daquela que conhecêramos anteriormente e, agora, era constantemente desejada por todos aqueles que a viam ou que com ela se relacionavam.
Na idade madura, por exemplo, perdemos o Bonde da História ao constatar que muitos dos nossos sonhos e aspirações da juventude não chegaram a se concretizar na maturidade; além de não possuirmos mais a esperança de que aquilo venha ocorrer algum dia, em razão da idade avançada ou de algum outro motivo superveniente.
Perdemos o tal bonde, também, quando constatamos que nosso passado está pontilhado de escolhas erradas que viemos acumulando ao longo de toda uma existência, sejam elas de caráter afetivo, profissional, pessoal, etc.
Mais tarde, na Terceira Idade, sentimos que perdemos o respectivo bonde, por exemplo, ao constatar que a evolução tecnológica foi bem mais rápida do que a nossa capacidade em assimilá-la. Quando já não entendemos mais como as coisas e as instituições funcionam e/ou como são operadas, tendo, apenas as alternativas de passar a conviver sem elas ou solicitar a ajuda dos mais novos para resolver problemas anteriormente por nós considerados simples.
Da mesma forma, quando nos sentimos desatualizados com respeito a tudo aquilo que nos cerca e a nossa única preocupação passa a ser com os remédios que tomamos ou com os que deixamos de tomar.
Perdemos, ainda, o bonde ao nos sentirmos sozinhos, isto é, quando percebemos que a maior parte de nossos contemporâneos de geração já se foi para os sagrados campos de caça pertencentes à Metafísica sobre a vida e a morte de muitas tribos e nações indígenas ou, simplesmente, para o território do além segundo outras Metafísicas.
Em qualquer idade ou etapa de nossas vidas, podemos sentir o bonde passando e as pessoas embarcando ou desembarcando de seus vagões. Creio eu que a sensação de felicidade que percebemos nas faces de alguns passageiros, quando ainda estão na estação, indica que aqueles são os que estarão embarcando no comboio e as feições de tristeza e de desânimo, notada em outros, que são aqueles os que acabaram de desembarcar.
Tomar o Bonde da História, segundo a minha maneira de ver a questão, não significa, entretanto, obter poder ou sucesso material a qualquer preço, nem conseguir saciar as paixões humanas ou obter a realização de todos os desejos do EGO.
Subir no Bonde da História, no meu modo de entender, é sentir-se realizado e satisfeito com aquilo que o Destino lhe reservou, não importa se teve grandes ou pequenas aspirações em sua existência.
Embarcar no Bonde da História é estar feliz consigo mesmo, sem a necessidade de que algo ou alguém seja a origem da sua felicidade. Perdê-lo, significa justamente o contrário. A todo o momento passa um novo bonde e o fato de havermos chegado atrasados à estação e perdido o que acabara de passar, não significa que não possamos embarcar no próximo.
A viagem pela nossa existência, cujo trajeto, eventualmente, pode fazer parte do caminho percorrido pelo Bonde da História, possui, todavia, a propriedade de poder ser modificada, por nós mesmos, em qualquer fase da vida em que estejamos, de modo que, ao havermos embarcado naquele comboio ao menos uma vez na vida, dele jamais desembarquemos até o fim de nossos dias.
Com apenas um mesmo bilhete de ida, pegando outros ramais ou fazendo algumas baldeações planejadas, conseguiríamos permanecer, ainda por muito tempo, trafegando naquele bonde.
Talvez, não o tenhamos tentado com a necessária vontade, quando ainda poderíamos fazê-lo com certa facilidade, seja por excessiva timidez, por medo, por comodismo, por descaso ou, seja lá por que razão tenha sido e, assim, fomos obrigados a desembarcar, prematura e definitivamente, sem conseguir percorrer nele o trecho total da nossa existência.
Talvez se houvéssemos tomado algumas decisões contrárias aos nossos impulsos e desejos na ocasião; isto é, diferentes ou mesmo opostas àquelas que tomamos no passado, ainda hoje pudéssemos estar como passageiros do bonde, desfrutando da bela paisagem e da companhia de passageiros tão felizes quanto nós.
Com isto não teríamos descido antecipadamente para seguir caminhando a pé pelo leito da via férrea os caminhos das nossas vidas como, de fato, já ocorreu com inúmeros seres humanos e ainda continua ocorrendo.
Embora as nossas existências se desenrolem no plano físico, o trecho deste percurso percorrido como passageiros do Bonde da História é sempre sentido nos planos emocionais e mentais dos indivíduos, seja através da sensação de felicidade desfrutada em razão da satisfação pessoal com aquilo que o Destino lhes reservou, sensação esta visível na fisionomia daqueles passageiros contemplados com um assento em um dos vagões; como também em razão da sensação de missão cumprida, sensação esta de cumprimento da missão que eles trouxeram ao encarnar nesta existência, vivendo uma vida plena, saudável, bem sucedida e, eventualmente, virtuosa.
Por sua vez, aqueles que desembarcaram prematuramente ou que jamais chegaram a embarcar no referido bonde, carregam também, visível com eles, marcas da tristeza e do desânimo, características de sonhos e planos abortados em razão, talvez, de decisões erradas e ou da incapacidade que tiveram de concretizar a missão que trouxeram para esta vida.
Tudo isto até aqui mencionado, evidentemente, se refere ao caso daquelas pessoas consideradas como seres humanos normais; isto é, nossas considerações não atingem os casos daqueles indivíduos que, por possuírem alguma patologia mental que as afastem da realidade ou serem portadores de desvios de caráter e de conduta que as conduzam a viver fora da lei, podem considerar o errado como certo e o correto como lhes parecendo errado, fazendo com que está nossa atual análise se distorça.
Países e nações, da mesma forma que os seres humanos, também possuem espaços nos compartimentos de carga do Bonde da História; todavia, dele são desembarcados por razões distintas daquelas já mencionadas para os humanos: desembarcam quando perdem o rumo estabelecido por razões de má gestão, descaso ou incúria das autoridades que os governam; quando são dominados por organizações criminosas, que agem apenas visando seus interesses imediatos; quando são povoados por um povo de natureza fraca, que não se opõe a viver sob um regime de servidão consentida.
Creio, infelizmente, que isto ocorreu nas últimas décadas com o nosso país. Devido à má gestão e ao desenfreado desvio de recursos públicos motivados pela excessiva ambição dos governantes, ademais de um plano macabro de estabelecer bases para a implantação de um governo socialista bolivariano (uma versão latinizada do comunismo), nosso país parou de se desenvolver e começou a regredir em diversos indicadores socioeconômicos, deixando claro que já havíamos desembarcado do bonde da história como país.
Mesmo com a vitória nas eleições de 2018 de um presidente liberal, inimigo da corrupção e do comunismo, as forças do mal encasteladas em postos chaves dos três poderes da república têm nos impedido de retomar o nosso lugar no referido bonde. Com isto, décadas de desenvolvimento e de progresso foram perdidas. Inúmeros outros países, neste intervalo de tempo, nos superaram em indicadores dos quais já chegamos a ocupar os primeiros lugares. Os responsáveis por este estado de coisas, presos em um primeiro momento, já estão todos soltos, gozando a vida e usufruindo da parte que conseguiram salvar daquilo que desviaram dos cofres públicos.
Nosso presidente, embora contando com apoio popular, encontra-se de pés e mãos amarrados pela interferência, inconstitucional, dos demais poderes no poder executivo. Inúmeras medidas propostas pelo presidente são barradas no parlamento ou impedidas, pelo STF, de serem executadas. Nosso presidente eleito não consegue governar, está é a triste realidade. Uma aliança tácita entre o judiciário e o legislativo retirou, na prática, os poderes presidenciais.
Com isto, o Brasil caminha a pé pela via férrea. Já não é mais um integrante do Bonde da História. Se algum dia voltará ou não a nele de novo embarcar é algo que foge a minha capacidade de prever o futuro. Creio, mesmo, que Michel de Nostradamus caso ainda vivesse também não saberia dizê-lo, tamanha é a malignidade e o espírito conspiratório daqueles brasileiros que se agarraram ao poder e não desejam mais soltá-lo e daqueles estrangeiros que almejam nossas riquezas e, para obtê-las, fizeram dos primeiros seus prepostos, impedindo que o país tenha um lugar na composição.
Em síntese é bem possível que, por falta de passageiros neste país, os responsáveis pela companhia de carris desativem a linha que por aqui passava, despeçam os motorneiros, mecânicos e cobradores, retirem os trilhos e vagões e os levem para outra parte do planeta, onde poderão ter maior utilidade.
Só não farão isto se notarem a vontade popular de reativar novamente as viagens de bonde; se perceberem o surgimento de cidadãos decididos e de coragem que desejem lutar para que o Brasil retorne ao seu tradicional lugar no compartimento de carga de um dos comboios; se os passageiros aqui embarcados solicitarem ao chefe da estação a colocação de mais um vagão no comboio; ou seja, um vagão prisão, com grades, para nele colocarem aquelas ex autoridades, indesejáveis, que foram responsáveis pelo anterior desembarque do país e que serão levadas no vagão prisão para responder, perante algum tribunal internacional, pelos seus desmandos e pelos crimes contra a humanidade que cometeram quando estiveram no poder.
_*/ Economista e doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
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