quinta-feira, 22 de outubro de 2020

 402. “Vamos passear no bosque, enquanto o Covid não vem...”


Jober Rocha*



                    Nos meus tempos de criança era costume no bairro em que eu morava as brincadeiras de roda entre meninos e meninas: várias crianças davam as mãos e se punham a rodar, cantando alguma ‘cantiga de roda’. Uma delas dizia: “Vamos passear no bosque, enquanto o seu lobo não vem. Seu lobo está aí? Não! Então, vamos passear no bosque, enquanto o seu lobo não vem”! 

                        A canção se repetia indefinidamente, até que as crianças cansassem e fossem brincar de outra coisa. 

                      A cantiga parece ter-se originados da estória dos Três Porquinhos, uma fábula antiga contada na Europa no século XVIII, cujos personagens são exclusivamente animais, um lobo e três porcos. A fábula foi, posteriormente, objeto de um conto divulgado por Joseph Jacobs, escritor australiano (1854 - 1916). Entre seus diversos livros infantis destaca-se, pois, "A História dos Três Porquinhos”, que viviam trancados em suas casas (uma casa de palha, uma casa de madeira e outra casa de pedra) e estavam sempre sendo ameaçados pelo lobo que vivia na floresta.

                         De forma similar, quase duzentos anos depois de Jacobs, todos nós, brasileiros, somos obrigados a viver trancados em nossas casas, como os porquinhos da fábula, enquanto o Covid 19 não vem. O vírus que assola o mundo inteiro, quase tão mortal quanto o lobo, pois alguns seres humanos vitimados pelo vírus conseguem escapar ilesos, nos mantêm prisioneiros em nossas residências, temerosos da sua nefasta presença pelas imediações.

                       Por vezes nós damos algum passeio pelas ruas do bairro, sempre temerosos, usando máscaras obrigatórias que, de fato, não nos protegem de contrair o temido vírus, mortal para alguns e inofensivo para outros. Segundo as autoridades apregoam, o vírus sobrevive nas roupas, na pele, na sola dos sapatos, nos esgotos, nas embalagens. As máscaras, portanto, apenas dificultam a nossa respiração, pois não evitam a contaminação. 

                       Os meios de transporte públicos seguem lotados, mas as escolas continuam vazias, o que me faz pensar que algumas das nossas autoridades parecem que fazem parte da torcida organizada para o sucesso do vírus, ademais de possuírem interesses, talvez, inconfessáveis em prejudicar o setor de ensino; principalmente, por terem liberado os jogos de futebol, os bares e as casas de espetáculos, bem como outros setores empresariais como shoppings, grandes lojas, etc. Só as escolas permaneceram de fora. Nos demais países, pelo que sei, os alunos continuam frequentando as aulas presenciais em suas escolas, sem nenhum problema. Aqui as aulas são pela internet e parece que alguém ganha muito dinheiro com a transmissão das aulas de forma virtual.

                        Muito já se escreveu sobre esse episódio da chamada Pandemia, que agora já denominam Sindemia; isto é, a interação, mutuamente agravante, entre problemas de saúde em populações, em seu contexto social e econômico. O fato é que tudo leva a crer ser este episódio algo mais do que uma simples epidemia mundial, como tantas já ocorridas ao longo da história humana.

                              Esta parece ter componentes políticos muito fortes. Parece fazer parte de um episódio da guerra bacteriológica, travada em um contexto da Guerra Assimétrica (em que os oponentes apresentam diversas diferenças, tais como: nível de organização, objetivos, recursos financeiros, recursos militares, comportamento-obediência a regras, etc.), da Guerra Hibrida (estratégia militar que mescla táticas de guerra política, guerra convencional, guerra irregular, e ciberguerra, com outros métodos de influência, tais como a desinformação, a diplomacia, lawfare e intervenção eleitoral externa) e da Guerra de Quinta Geração (considerada como tal toda tentativa de origem externa, por quaisquer meios, que objetive desestabilizar um cenário de atuação, seja político, econômico, tecnológico, psicossocial, ambiental e ou militar e cujo resultado venha fragmentar ou minar a soberania de um país através de agentes internos).

                     Inúmeros analistas viram nesta atual pandemia uma tentativa de alguma entidade maligna, com objetivos mundiais de domínio e de conquista, de reduzir drasticamente a população mundial, de quebrar as principais economias mundiais; enfim, de implantar o caos econômico, social, político, religioso e militar, visando, ao final da contenda, sair vitoriosa e comandar, definitivamente, os destinos do planeta Terra.

                        Ocorre, entretanto, como dizia o poeta Carlos Drummond de Andrade em seu poema ‘No meio do caminho, publicado em 1930’: 


No meio do caminho tinha uma pedra

tinha uma pedra no meio do caminho

tinha uma pedra

no meio do caminho tinha uma pedra.


Nunca me esquecerei desse acontecimento

na vida de minhas retinas tão fatigadas.

Nunca me esquecerei que no meio do caminho

tinha uma pedra

tinha uma pedra no meio do caminho

no meio do caminho tinha uma pedra.


                             Esta pedra ou pedras, já mencionada por Drummond na década de 30, inseriu-se no caminho desta maligna entidade em 2020, certamente, atirada(s) por mão divina nos caminhos tortuosos utilizados pela entidade malígna para alcançar a primazia econômica e o domínio da raça humana, em um cenário mundial de conflito de interesses.

                      A eleição de Donald Trump nos USA, e de Jair Bolsonaro no Brasil, podem ser consideradas duas pedras atuais, onde tropeçaram os integrantes da maligna entidade, pedras estas que constituíram rudes golpes sofridos por aqueles interessados na hegemonia e na redução drástica da população mundial, em benefício de seus mesquinhos e egoístas interesses.

                    Uma grande parte da população mundial tem consciência do cenário atual, da catástrofe iminente da qual escapamos há pouco com a eleição destes dois personagens mencionados e do futuro que nos espera se o mal vencer o bem. Outra parte dos seres humanos faz parte do problema, ou seja, trabalha para o mal. Outra parte, ainda, não se interessa nem por política e nem por adquirir conhecimentos sobre estratégia, geopolítica, etc., pensando, apenas, em esportes, em divertimentos, em consumir ou em assuntos de ordem religiosa. Esta parte acredita em que tudo aquilo que publicam nas redes sociais não passa de uma suposta Teoria da Conspiração ou de Fake News.

                          Caso Trump e Bolsonaro sejam reeleitos e a consciência das pessoas de bem desperte, para que enxerguem as verdadeiras variáveis em jogo e o que elas representam em termos de uma futura escravidão compulsória ou de uma servidão consentida, ainda vejo um futuro promissor para a raça humana, nesta encruzilhada em que hoje nos encontramos.

                           Caso contrário, se ambos perderem as eleições, a entidade maligna e seus seguidores tomarão conta do planeta. Não sei se isto ocorrerá com ou sem resistência por parte de alguns países nucleares e de autoridades patrióticas e do bem, que ainda existem em quantidade em muitos lugares. 

                           Enquanto isto tudo ocorre, igrejas cristãs são queimadas e cristãos mortos em diversos países, sem nenhuma manifestação contundente por parte do pontífice máximo, preocupado que está com outros acontecimentos, como a vida dos índios da rica floresta amazônica e o destino das ONG’s que por ali vicejam aos milhares, enquanto inexistem no árido nordeste brasileiro.

                             Relativamente a alguma eventual vacina contra o Covid 19, como o caçador das estórias infantis cujo objetivo é eliminar o lobo, determinados políticos brasileiros querem torna-la obrigatória, sem levar em consideração efeitos colaterais danosos que possam acarretar àqueles que a tomarem. A própria China, que está em vias de produzir uma vacina, não a testou nem a aplicará em sua população, preferindo usar uma vacina europeia da AstraZeneca (Sueca/Britânica). A chinesa Shenzhen Kangtai Biological Products, poderá fabricar pelo menos 100 milhões de doses da vacina da AstraZeneca até o final deste ano.

                             Por outro lado, pretende a China testar e aplicar a sua vacina própria, desenvolvida em parceria com o Instituto Butantã, no Brasil, mediante um contrato bilionário com o governo do Estado de São Paulo. 

                              O presidente Jair Bolsonaro já se pronunciou a respeito, dizendo: “Para o meu governo, qualquer vacina antes de ser disponibilizada à população, deverá ser comprovada cientificamente pelo Ministério da Saúde e certificada pela ANVISA. O povo brasileiro não será cobaia de ninguém. Não se justifica um bilionário aporte financeiro num medicamento que sequer ultrapassou sua fase de testagem Diante do exposto, minha decisão é a de não adquirir a referida vacina”.

                           Espero que, da mesma forma como ocorre na fábula de Joseph Jacobs, os porquinhos vençam o lobo mau, representado pelo vírus, com a ajuda do caçador que, evidentemente, não deve ser nem amigo nem sócio do lobo mau...


_*/ Economista e doutor pela Universidade de Madrid, Espanha


quarta-feira, 21 de outubro de 2020

 401. Como muitos indivíduos fazem para manter a sua ignorância bem escondida  


Jober Rocha*



              Ignorância, conforme nos informam os dicionários, consiste em um estado mental de quem não está a par da existência ou ocorrência de algo ou de quem não tem conhecimento ou cultura, por falta de estudo, experiência ou prática.

              A subjetividade da ignorância pode ser estendida a inúmeros domínios, como o das leis, dos costumes, dos comportamentos, da verdade e da razão, por exemplo. Assim, uma pessoa ignorante poderia ser também considerada como ‘incompetente, inexperiente, mal-educada, pretensiosa, presunçosa e bronca’.

                  Inúmeros pensadores já se manifestaram sobre ela, como, por exemplo, Rui Barbosa, que afirmou: ‘A chave misteriosa das desgraças que nos afligem é esta; e somente esta: a Ignorância! Ela é a mãe da servilidade e da miséria’. Ou então William Shakespeare: ‘Só há uma treva: a ignorância’. Ou o filósofo Sócrates: ‘O início da sabedoria é a admissão da própria ignorância’.

                   Muitos outros pensadores, ao longo da história, já se manifestaram sobre a ignorância; mas, ficaremos apenas com estes três para não cansar os leitores.

                        A ignorância, todavia, pode ser bem escondida e milhares, se não milhões, de seres humanos fazem isto todos os dias. Existem, evidentemente, várias formas de escondê-la que são comumente utilizadas por cidadãos comuns, políticos, cientistas, professores, sacerdotes, militares e profissionais liberais e é sobre isto que trataremos neste texto. De tanto observá-los, acabei por perceber algumas delas, embora isto não esgote o assunto.

                     Iniciarei com a forma mais comum, que é a de, simplesmente, balançar a cabeça afirmativamente durante um diálogo, como se estivéssemos entendendo e concordando com o que está sendo dito pelo nosso interlocutor, muito embora nada saibamos sobre aquele assunto. 

                     Aquele que nos fala ficará impressionado com a nossa ‘cultura’, já que concordamos com o balançar afirmativo da cabeça sobre tudo o que fala e ele, com certeza, se julga alguém muito culto.

                          Outra forma de a escondermos consiste em nada dizer é adotar um comportamento impassível, como se soubéssemos mais do que ele, mas que não o quiséssemos contraditar. Se o oponente perguntar o que achamos da questão, devemos responder: - Penso de forma diferente, mas não gosto de criar polêmicas, notadamente com amigos; portanto, nada direi a respeito!

                         Uma variante consiste em, durante a conversa, ao perceber que nada sabe sobre o que está sendo discutido e que podem, eventualmente, solicitar a sua opinião, é a de alegar alguma reunião importante em outro lugar, um compromisso anterior, uma conferência que terá de fazer, pedir desculpas e sair rápido daquele local.

                      A ignorância costuma ser, também, escondida com a utilização de palavras rebuscadas e de pouco conhecimento dos ouvintes. Podem ser palavras pouco utilizadas de caráter técnico ou, até mesmo, palavras antigas que já caíram em desuso. Isto passa por um sinal indiscutível de cultura e é um método muito usado por cientistas, professores de pós- graduação, políticos, sacerdotes, magistrados, médicos, advogados e economistas, quando desejam demonstrar cultura, e fazer crer aos seus ouvintes ou leitores sobre a veracidade daquilo que escreveram ou sobre o que falam.

                           Quantas asneiras, parvoíces e estultices, ao longo da história, já foram aplaudidas de pé, pelo fato de os ouvintes ou leitores não terem compreendido nada daquilo que foi dito ou escrito por alguém que nada sabia sobre o assunto que tratava; mas, que era profundo conhecedor do uso da retórica e da construção de falácias com termos rebuscados e pouco usados. 

                        Quantos não se especializaram em técnicas de Neurolinguística, para dar credibilidade às asneiras, baboseiras, disparates e bobagens proferidas, sempre aos gritos como manda a técnica, para uma plateia política ou religiosa hipnotizada pelo magnetismo do orador?

                       Uma forma mais cruel de esconder a ignorância é a de apelar para a violência física. Sempre foi muito utilizada, pois, neste caso, quem a pratica aparece como o anjo do bem agindo contra o agente do mal. A verdade estaria com aquele que usa da violência para combater os que desejam promover o mal. 

                       O ato serve, portanto, para esconder a falta de conhecimento e de argumentos contraditórios, por parte dos violentos, e que são mantidos encobertos pela violência praticada.

                       Outra forma também utilizada consiste em adotar poses, roupas, procedimentos, etc., condizentes com a postura de um intelectual. Em suma, possuir uma aparência que seja interpretada e identificada, conforme a época e os costumes, com a de pessoas sábias e cultas.

                      Assim, ora deixando os cabelos e as barbas crescerem, ora usando óculos de grau, ternos bem feitos, togas, paramentos, jalecos e fardas impecáveis, ora carregando consigo livros, bastões de mando, cajados de profetas e pastores de almas, pastas de couro, estetoscópios, teses doutorais, processos jurídicos, medalhas, condecorações, comendas, etc., pode-se passar para o público, em geral, uma aparência de alguém que prima por possuir grande cultura e enormes conhecimentos.

                      Isto, meus caros, é o que fazem, diariamente, milhares, se não milhões, de seres humanos em todo o mundo. São pessoas que vivem de vender algo que não possuem consigo mesmo, pessoas que vivem de iludir o próximo (quase sempre crédulo, inocente e também ignorante), objetivando obter poder e riqueza, usando, para tanto, dos mais variados artifícios que desenvolveram ou aprenderam com a esperteza nata que possuem.

                      A grande questão que se coloca é a seguinte: como distinguir o joio do trigo? Evidentemente que existem milhares, se não milhões, de pessoas verdadeiramente cultas, sábias e inteligentes entre os cientistas, os filósofos, os militares e os sacerdotes, em todos os cantos do mundo.

                     Creio que para tanto, seria necessário, da parte dos ouvintes e leitores, um mínimo de conhecimento e de informação, de modo a poder perceber quando alguém fala com conhecimento de causa ou, simplesmente, emite sua opinião sobre algum assunto sem nada conhecer sobre ele, notadamente quando o assunto é de caráter político ou religioso, temas que ocupam grande parte das discussões mundialmente.

                      Imagino que se milhares, se não milhões, de pareceres, teses, livros, discursos, pronunciamentos, homilias, ordens do dia, sentenças, perícias, laudos, etc., feitos por indivíduos que procuravam demonstrar conhecimento e sapiência, deixassem de ser feitos, em nada mudariam os destinos dos países, das populações e dos indivíduos isoladamente.

                     Estes foram, simplesmente, trabalhos inócuos, sem utilidade prática nenhuma, apenas com o objetivo de demonstrar sabedoria, de esconder a ignorância, de justificar o injustificável ou de ganhar dinheiro e adquirir poder; trabalhos estes que, ou já foram destruídos por sua inutilidade ou que, por falta de serventia, jazem esquecidos em prateleiras de arquivos mortos pelos quatro cantos do mundo.

                       Todavia, muitos de seus autores ganharam dinheiro e poder com as sandices que disseram ou escreveram. Este é um grande paradoxo que vislumbro nas Ciências, nas Filosofias, nas Religiões e na Política, em geral: A ignorância da maioria enriquece e concede poder à falsa sabedoria de outros tantos ignorantes, que, com malícia, esperteza, egoísmo e maldade, conseguem enganar a todos, infelizmente ou felizmente, durante quase todo o tempo... 


_*/ Economista e doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.


domingo, 18 de outubro de 2020

             400. Vencendo o medo da morte 

          O papel da Medicina ao alterar o destino das criaturas


Jober Rocha*


          A doutrina do retorno do espírito à vida material, a partir da reencarnação em outro corpo, teve sua origem há milhares de anos antes da existência de Allan Kardec (1804-1869) e ocorreu, segundo os historiadores, na Grécia, na Índia e entre os povos Celtas.

              Na Grécia este conceito foi codificado por Orfeu e por Pitágoras no século VI e, posteriormente, adotado por Sócrates e por Platão, dentre outros filósofos que, mais tarde, vieram a sofrer influências dos Mistérios Órficos e da Escola Pitagórica.

          Aristocles de Atenas, mais conhecido como Platão, foi um dos primeiros a enunciar que “os espíritos, antes de encarnarem, são levados a escolher o modelo de vida a que posteriormente ficarão presos”.

         Seus diálogos ‘Timeu’ e ‘Fedro’ e sua obra ‘A República’, constituem os principais textos que falam sobre a reencarnação. Nos dois primeiros explica suas concepções a respeito da criação dos espíritos e de sua individualização e desenvolvimento, a partir das reencarnações. Em ‘A República’ utiliza-se de um mito (de Er, pastor de Pamfilia) para exemplificar suas ideias a respeito da reencarnação. 

          Assim, conforme afirmava Platão, os espíritos escolheriam suas novas vidas de acordo com os costumes de vidas anteriores.

          Segundo o filósofo, para o espírito, “a reencarnação em um corpo físico seria uma prisão, por castigo, e só poderia ser evitada a partir da adoção de uma filosofia de vida baseada no amor e na sabedoria”.

          Platão considerava a alma como a consciência, em si, das coisas do bem e do mal, da justiça e da virtude. Seria, ainda, a inteligência como reflexão e interrogação sobre a realidade e a capacidade de descobrir, por si, a verdade e as regras da vida ética. Para ele, a essência da alma era a razão e o principal mal a ignorância.

          Para Homero, autor de ‘Ilíada’ e ‘Odisséia’ – Séc. VIII a.C, o Destino está acima do próprio Júpiter que, soberano dos deuses e dos homens, deixa isto claro quando afirma que não pode impedir Sarpedon, seu filho, de morrer na data fixada. O futuro da Terra inteira esteve dependente da morte de Sarpedon, a qual dependia, por sua vez, de outro acontecimento que estava ligado por outros à origem das coisas (tal conceito de necessidade e de fatalidade foi denominado por Leibniz, mais tarde, de Razão Suficiente).

          Este determinismo foi completamente esquecido pelos povos ocidentais até a idade contemporânea, em razão da noção de livre arbítrio dominante durante o final da antiguidade e por toda a idade média.

          Enquanto alguns povos do Oriente mantiveram a crença no determinismo e na reencarnação, em face de suas doutrinas religiosas; no Ocidente, a expansão do cristianismo veio difundir a noção da não reencarnação e do livre arbítrio, para o bem e para o mal, fazendo surgir, assim, a noção de pecado, segundo afirmava o filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900).

               Milhares de anos depois dos filósofos da antiguidade, Allan Kardec em seus principais livros: O Livro dos Espíritos (1857); O Livro dos Médiuns (1861); O Evangelho Segundo o Espiritismo (1864); A Gênese (1868); O Céu e o Inferno (1865) e O que è o Espiritismo (1859); traçou as bases da doutrina espírita, segundo ele ditada pelos próprios e iluminados espíritos superiores.

                 Relativamente à morte, em ‘O Livro dos Espíritos’, há um capítulo inteiro sobre o assunto: trata-se do capítulo III, do livro segundo, com o título ‘Retorno da vida corpórea à vida espiritual’. 

                   Algumas questões, como a 149 (Que sucede à alma no instante da morte? “Volta a ser Espírito, isto é, volve ao mundo dos Espíritos, donde se apartara momentaneamente.”), a 163 (A alma tem consciência de si mesma imediatamente depois de deixar o corpo? “Imediatamente não é bem o termo. A alma passa algum tempo em estado de perturbação”.) e a 164 (A perturbação que se segue à separação da alma e do corpo é do mesmo grau e da mesma duração para todos os Espíritos? “Não; depende da elevação de cada um. Aquele que já está purificado se reconhece quase imediatamente, pois que se libertou da matéria antes que cessasse a vida do corpo, enquanto o homem carnal, aquele cuja consciência ainda não está pura, guarda por muito mais tempo a impressão da matéria.”) esclarecem parcialmente este assunto. 

                    Em sua obra ‘O Céu e o Inferno’ (10ª edição, dez 2002, Lake), Alan Kardec no capítulo ‘A Preocupação com a morte’, diz: “No instante da morte, todo homem retorna ao mundo dos espíritos, pátria de origem; Uma vez no chamado outro mundo, conserva plenamente sua individualidade; a separação da alma e do corpo não é dolorosa (grifo meu). O corpo sofre mais durante a vida que no momento da morte; a alma se liberta com o rompimento do laço que a mantinha presa ao corpo; a sensação que se experimenta no momento em que se reconhece no mundo dos espíritos depende do que fizeram em vida. Se foram bons, sentirão enorme alegria. Se foram maus, sentirão vergonha”.

                   No capítulo ‘A Passagem’, do mesmo livro, específico sobre a questão, Kardec diz: “A preocupação com a morte é determinada pela sabedoria da Providência, e uma consequência do instinto de conservação comum a todos os seres vivos. É necessária, enquanto o homem não estiver esclarecido a respeito da vida futura, como um contrapeso ao arrastamento que, sem esse freio o levaria a deixar prematuramente a vida terrena e a negligenciar o seu trabalho neste mundo, que deve servir para o seu próprio adiantamento. Acrescentemos que tudo, nos nossos costumes, concorre para fazer que lamentemos a perda da vida terrena e temamos a passagem da Terra para o Céu. A morte é cercada de cerimónias lúgubres que servem mais para aterrorizar do que para despertar a esperança. Sempre se representa a morte sob um aspecto repulsivo e jamais como um sono de transição. Todos os seus símbolos lembram a destruição do corpo, mostrando-o hediondo e descarnado. Nenhum nos apresenta a alma se desprendendo, radiosa, dos laços terrenos”.

                             O tradutor da obra de Kardec acrescenta em nota de rodapé desta página: “Essa impressão negativa, da morte, foi intencional. O objetivo era atemorizar as criaturas a fim de se portarem bem na vida. (Grifo meu). Há uma relação evidente entre essa ameaça da morte e as ameaças de castigos nas escolas, para garantir o bom comportamento dos alunos”.

                          Vê-se, portanto, que a morte, segundo pensam muitos filósofos e pensadores religiosos, não é o fim de tudo, mas o começo de outra vida, de outra forma. Sob este aspecto, portanto, não há por que temê-la.

                         Vejamos, agora, se ela costuma ocorrer de forma dolorosa ou não.

                          Pesquisando a literatura médica relativamente ao fato de ‘se as mortes são dolorosas ou não’, me surpreendi com algumas informações que obtive. A grande maioria das mortes são indolores (conforme afirmado no livro de Kardec, citado anteriormente, e que tive o cuidado de sublinhar), ao contrário do que eu pensava e, creio, do que a grande maioria das pessoas ainda pensa.

                       A remoção da cabeça de uma pessoa, por exemplo, é considerada uma das mortes mais rápidas e ocorre em alguns segundos.  A morte ocorre com a falência dos batimentos cardíacos e da falta de respiração. Quando ocorre na guilhotina ou por corte de uma espada, por incrível que pareça, é imediata e indolor.

                      O enforcamento, por sua vez, também induz a uma morte rápida e indolor.  A morte cerebral acontece por falta de oxigênio e se dá em menos de um minuto.

                     Na eletrocussão (morte na cadeira elétrica ou por uma descarga elétrica de mais de 2.000 volts) a morte da pessoa é instantânea e, portanto, indolor.

               A injeção letal consiste na injeção de três drogas administradas de forma sucessiva e a morte ocorre em, no máximo, um minuto, com o indivíduo totalmente inconsciente, nada sentindo.

                        Na morte por fuzilamento o executado leva de 10 a 15 segundos para perder a função cerebral, o que leva à imediata perda de consciência.

                             O mesmo ocorre nos casos de grandes traumas por acidentes graves e tiros em pontos vitais. A vítima perde logo a consciência, mediante um mecanismo natural que retira o sangue do cérebro, desviando-o para a área onde é mais necessário. Com isso ocorre a perda da consciência e, caso não seja viável algum tipo de socorro médico, a morte ocorre com a pessoa inconsciente, sem sentir nenhuma dor.

                          Uma parada cardíaca súbita (PCS), enquanto o indivíduo dorme, é uma das mortes mais tranquilas. Uma PCS ocorre devido ao mau funcionamento do sistema elétrico do coração e, se ocorrer durante o sono, o indivíduo não acordará e nem terá consciência de que está morrendo.

                      Pacientes terminais, internados em hospitais com moléstias graves ou graves traumas, normalmente, se chegam a falecer, estão sedados e morrem sem perceber que morreram e sem sentir nenhuma dor.

                      O fato é que quando a morte ocorre, na grande maioria dos casos, o indivíduo está inconsciente ou sedado ou ela ocorre tão rápido que é praticamente indolor. Apenas poucas maneiras de morrer provocam algum tipo de dor, como, por exemplo, o infarto ou uma queda de grande altura. Porém, a eventual dor é tão rápida quanto à ocorrência da morte, podendo-se dizer, pois, que inexiste.

                    Qual a razão, portanto, para que a morte seja tão temida por todos?

                             Acredito que o problema seja cultural e psicológico. Cultural, na medida em que tem sido incutido pela religião judaico cristã, nas mentes dos seus fiéis e seguidores, buscando atemorizar as criaturas com a existência do inferno e do purgatório (onde no primeiro caso sofreriam eternamente e no segundo até purgarem seus pecados), no sentido de que pautassem seus comportamentos em vida segundo as virtudes pela religião apregoadas (pacifismo, humildade, esperança, caridade, tolerância, bondade, fé, etc. – virtudes estas que deveriam ser perseguidas e cultivadas pelo povo, mas que nunca foram apanágio das elites, até mesmo das eclesiásticas). Psicológica por que todo ser humano tem medo ou receio daquilo que desconhece. Ademais, a morte tem o poder de separar os entes queridos, os familiares e amigos, daquele que se vai, definitivamente, para o desconhecido (mesmo que para o céu dos cristãos, para os verdes campos de caça dos índios norte-americanos ou para o céu das setenta e duas virgens do paraíso islâmico).

                        No Egito antigo, os faraós faziam questão de que fossem depositados em suas tumbas tudo aquilo de que pudessem precisar no local desconhecido para onde iam. Em alguns casos, em algumas tribos, a mulher  e os servos eram enterrados junto com o chefe, para servi-los no lugar desconhecido para o qual iam após a morte.

                   O imperador romano Adriano (76 d.C – 138 d.C), escreveu um belo poema sobre a vida após a morte: 

Animula vagula blandula 

Hospes comesque corporis 

Quae nunc abibis in loca 

Pallidula rigida nudula 

Nec ut soles dabis iocos 


(Pequena alma, terna e flutuante)

(Hospede e companheira do meu ser)

(Vais descer pálida, rígida, nua)

(A lugares lúgubres, hesitante)

(Que jamais pensaste algum dia conhecer)


              Existem inúmeras traduções do seu poema, mas considero esta a melhor.

             Embora no território da morte só exista um caminho; isto é, aquele que leva para adiante; muitos indivíduos, ao longo da história, conseguiram descobrir atalhos que lhes permitiram retornar ao mundo dos vivos. Tais casos são denominados EQM – Experiência de Quase Morte. São pessoas cujos corpos tiveram morte aparente ou real e seus espíritos penetraram, por momentos, nos umbrais da morte e de lá conseguiram retornar para seus corpos, relatando, posteriormente, aquilo que viram e experimentaram durante esta viagem. 

                  O número de casos ocorridos é tão extenso, que têm motivado diversos médicos a escreverem sobre os relatos de seus pacientes que passaram por estas experiências. Como regra geral os pacientes, após vivenciarem suas experiências extracorpóreas, passaram a não mais temer a morte e a interessarem-se pela busca do conhecimento, tornando-se leitores assíduos de todos os assuntos.

          Respeito os que não creem na espiritualidade e aqueles que pretendem a ela chegar através das religiões. Todavia, ambas as posições apenas servem para transformar uma coisa tão mágica e tão interessante em algo simples demais. Sem nenhuma graça no primeiro caso ou então repleto de rituais, de crendices e de superstições, no segundo. Convenhamos, meus caros leitores, que estes não devem ter sido os objetivos iniciais do Criador de todas as coisas, ao dar vida aos seres humanos.

                   Outra questão interessante, que vale a pena destacar neste texto, é o papel da Medicina ao interferir no destino das criaturas, salvando da morte certa aqueles a ela condenados pelo Criador que, segundo a religião cristã, é onipresente, onipotente e onisciente; ou seja, que está em todos os lugares, que tudo pode e que tudo sabe. A morte de todos os seres humanos, segundo afirmam as religiões, foi adredemente programada; isto é, com antecedência e finalidade específica. Ninguém viveria mais do que o tempo que lhe foi determinado por aquele que o criou.

        De todas as Leis da natureza, quer se acredite ou não nas existências delas, uma única pertenceria ao rol das coisas que não poderiam ser violadas e esta seria a Lei da Lógica. Como já disse alguém: “As cadeias com que a Lógica acorrenta a Natureza, são apenas formais, não chegando a oprimi-la; porém, em razão disto, são totalmente inquebrantáveis”. Assim, ao considerarmos as Leis da Natureza como ordens que teriam partido de um Criador, estaríamos bem próximos de atribuirmos a estas leis a necessidade de pertencerem às Leis da Lógica.

             A Medicina como todas as demais Ciências, dizem os filósofos, fazem parte do ‘Pacote da Criação’; isto é, ao criar tudo o que existe no Universo conhecido, o ‘Criador de Todas as Coisas’, também, teria criado as leis que regeriam o comportamento e o funcionamento da Sua criação. Tais leis, a pouco e pouco, iriam sendo descobertas pelo homem (figura importante, consciente e, talvez, até mesmo central de todo este fenômeno), dando lugar ao surgimento, pela descoberta humana conforme dito, das diversas Ciências já existentes e outras ainda por descobrir.

              A Medicina, como todos nós sabemos, consiste em uma área do conhecimento ligada à manutenção e a restauração da saúde, trabalhando, em um contexto médico, para a prevenção e a cura das doenças dos seres humanos e dos animais. 

               Segundo alguns autores, a Ciência da Medicina teria surgido, no Ocidente, com Hipócrates (460 a 377 a.C.) e, segundo outros, no Império Aquemênida (no Sudeste da Ásia, entre 550 e 330 a.C.), no Oriente. 

               Ao longo da História, após Hipócrates, diversos ‘médicos’ contribuíram para o desenvolvimento desta ciência incipiente, notadamente Asclepiades de Bitinia, Claudio Galeno, Ibn Sina (Avicena), Ibn Rushd (Averrois), Ibn al-Nafis, Ibn al-Baytar, Al-Farabi, Al-Zarzi, Louis Pasteur, Alexander Fleming, etc.

              Na atualidade, fruto de pesquisas teóricas e aplicadas, a Medicina tem progredido sensivelmente, tendo descoberto as causas e as curas de uma infinidade de moléstias que acometem os seres humanos e os animais. Ao fazer isto, entretanto, segundo podemos supor, tem interferido nos desígnios do Criador para com as Suas criaturas.

              Diversas crenças religiosas associam a vida humana (ou a encarnação de um espírito em um corpo material) à necessidade do aprendizado espiritual, aprendizado este que passaria pelas vias dos sofrimentos, das dores e das vicissitudes, necessárias estas para que o aperfeiçoamento ocorresse. 

                 Lembremo-nos que a evolução ocorre dialeticamente e que o embate entre a tese e a antítese é o que provoca a síntese; isto é, a evolução daquelas duas em direção a esta. Algumas crenças falam em, apenas, uma vida e outras em múltiplas existências; todas, entretanto, reafirmam a necessidade deste aprendizado encarnado, para que o espírito possa evoluir.

                As crenças Orientais, panteístas em sua maioria, advogam a existência de um Determinismo com relação ao destino dos indivíduos, enquanto as principais crenças Ocidentais, quase todas monoteístas, propugnam a existência de um Livre Arbítrio.

            Com base no que dizem a Religião e a Filosofia, podemos estabelecer algumas hipóteses: 1. A existência humana seria determinística e Deus estaria em toda a Natureza (conforme acreditam o Budismo, Hinduísmo, Sufísmo, Confucionismo, Taoísmo e Xintoísmo); 2. A existência humana seria determinística e Deus estaria fora da Natureza (conforme pensam o Islamismo e o Espiritismo); 3. A existência humana possuiria total livre-arbítrio e Deus estaria em toda a Natureza (nenhuma religião comunga com esta hipótese, pois, aparentemente, se trataria de uma contradição religiosa); e 4. A existência humana possuiria total livre-arbítrio e Deus estaria fora da Natureza (conforme acreditam o Catolicismo e o Protestantismo).

          Cada uma destas hipóteses implicaria em uma maneira diferente, para seus seguidores, de encarar a vida e os demais fenômenos Metafísicos, como, por exemplo, a vida após a morte. 

           A primeira hipótese seria a que mais nos aproximaria fisicamente do Criador (que estaria na própria Natureza) e, portanto, implicaria em uma menor necessidade da intermediação por parte de organizações religiosas entre Deus e os homens, além de induzir a uma maior pratica das chamadas virtudes, por parte dos cidadãos, em razão da visão determinística da existência. 

          A última delas seria a que mais nos distanciaria fisicamente do Criador, criando, assim, uma necessidade maior da presença de instituições religiosas para servir de ponte entre o Criador e as criaturas e induziria a uma maior pratica dos chamados vícios (pecados), por parte dos cidadãos, tanto em razão da visão religiosa de livre arbítrio quanto do constante apelo do Sistema Capitalista para a satisfação dos desejos do ego, prontamente atendidos em razão do livre-arbítrio. Tanto é assim, que a noção de pecado e do inferno (onde ficariam os pecadores) é muito forte no Cristianismo.

             Como visto, todas as religiões (quer monoteístas, quer panteístas) admitem a existência de um Criador e de leis que regeriam a criação. Assim, em condições normais, a Natureza operaria segundo os critérios estabelecidos pelo Criador e da forma como necessitaria operar; isto é, nada seria feito de maneira supérflua ou sem finalidade.

                 Neste contexto, como compatibilizar a Medicina (que objetiva salvar e prolongar a vida dos seres humanos) com as Leis da Natureza? A interferência da Medicina teria, assim, a propriedade de interromper o livre curso da Natureza, modificando-o a revelia do Criador; já que, nada ocorreria por acaso (assim, o indivíduo que estivesse enfermo, possuísse deformidades ou estivesse à beira da morte, teria, necessariamente, de passar por tudo aquilo, para atingir a evolução prevista para o seu espírito naquela atual existência). A Medicina, ao corrigir deficiências, curar enfermidades e prolongar a vida do ser humano, estaria interferindo nos desígnios do Criador.

             Determinada crença religiosa cristã é conhecida mundialmente pelo fato dos seus seguidores recusarem transfusões de sangue. Estes fazem isto com base em suas interpretações de Genesis 9:4; Levítico 17:10; Deuteronômio 12:23; Atos 15:28, 29 e Levítico 17:14. 

               Em todos os lugares do nosso planeta onde a vida surgiu (quando na ausência de qualquer interferência humana), ela tem seguido o seu curso normal; isto é, a Lei Natural que faz com que tudo aquilo que necessite morrer, morra. Com a interferência dos seres humanos e da Ciência da Medicina, esta Lei pode ser anulada e constantemente o tem sido, para felicidade nossa.

              Filosoficamente, entretanto, a questão que se coloca é a de que os praticantes da Ciência Médica, ao obstarem a ação da Natureza mediante as suas intervenções e impedirem, assim, a ação da Lei Natural, interferem na programação divina de aprendizado dos espíritos encarnados. 

                 Lembremo-nos que a constituição física de cada indivíduo, seu DNA, seus cromossomas, sua resistência ou propensão às doenças e as enfermidades, etc., são determinados de maneira exógena; isto é, já vieram com eles quando dos seus nascimentos (ou encarnações). 

                     Ao se acreditar na existência de um Criador, nas Leis da Natureza, na necessidade da evolução espiritual e no consequente caminho do sofrimento para atingir esta evolução, a interferência do médico com a sua ciência, embora vista com alegria, carinho e respeito pelos pacientes, pode ter conotações espirituais desconhecidas por nós, ao permitir prorrogar a vida de alguém que teria, inexoravelmente, sucumbido pela ação da Lei Natural.

             Reconheço ser este um assunto complexo e, filosoficamente, ainda não solucionado a contento até o presente. Quem sabe se, futuramente, a Ciência, a Religião e a Filosofia não convergirão para um ponto comum, de modo a chegarem, as três, a possuir a mesma concepção Metafísica sobre o fenômeno da vida e da morte, de modo a que possamos ter uma resposta definitiva para esta instigante questão que desafia a Filosofia, a Ciência e a Religião?


_*/ Economista e doutor pela universidade de Madrid, Espanha.


sexta-feira, 2 de outubro de 2020

 399. Em defesa do pensamento conservador 


                                                                        Jober Rocha*



                      O tema principal deste artigo é tentar evidenciar que existe uma grande distinção entre o que se conhece como conservador (ou pensamento conservador), adjetivo, e aquilo que é conhecido como conservador ou conservadorismo, substantivo; embora persista certa confusão sobre um e outro conceito, por parte da população, incentivada esta confusão por ideólogos de esquerda com finalidades pejorativas, tentando atribuir o mesmo sentido aos dois conceitos (substantivo e adjetivo), de modo a estigmatizar aqueles indivíduos que, adjetivamente, pensam de forma conservadora, correspondendo esta à qualificação de atitudes e de ideias práticas cujo tempo e a história sancionaram.

                        O Pensamento Conservador, adjetivo, é, pois, aquele que acomete os seres humanos individualmente e é construído pela história do país, da nação, do povo e da sociedade. Pode-se pensar de forma conservadora sem pertencer a partidos políticos conservadores, que adotam o conservadorismo como forma de se atrelarem ao poder no tempo e no espaço. 

                       “O Estado consiste em um organismo vivo, que não pode ser separado da sociedade como prega o liberalismo, nem engoli-la totalmente como prega o socialismo e o comunismo”, no dizer de Roger Scruton (1891-1937). Além disso, conforme ainda considera o autor, “o pensamento conservador traz, em si, a perspectiva dos elementos de alguma crença religiosa, como cruciais para a vitalidade do Estado. Sem a moral cristã (ou aquelas advindas de qualquer outra religião), por exemplo, se veem mortas relações existentes entre o passado, o presente e o futuro, tanto dos indivíduos, quanto das raças e dos países”.

                         Ademais, segundo o mencionado autor, “O pensamento conservador visa, durante todo momento, manter os pés no chão. Olhar para o passado é mais eficaz do que ficar especulando o futuro. Prezar pela ordem social, na qual o Estado é um organismo que defende os interesses públicos, ao mesmo tempo em que respeita a vitalidade de suas células (indivíduos) e órgãos (instituições autônomas), são os objetivos do pensamento conservador. Os que possuem pensamento conservador não podem admitir a mercantilização do que não tem preço, isto é, a família, a arte, a fé e a nação”, como fazem os partidos de esquerda e sua ideologia marxista.  

                               O pensamento conservador, portanto, pode ser qualificado, adjetivamente, em uma atitude inteligente individual perante a vida e não em um movimento ou em uma corrente política como muitos imaginam. Os adeptos das ideologias de esquerda, que se autodenominam progressistas ou revolucionários, ao classificarem determinadas pessoas como conservadoras tentam atribuir a estas um caráter pejorativo oposto ao delas, como se o fato de pensar de forma conservadora fosse algo mau e pensar de forma revolucionária algo bom.

                                Você pode ser conservador (adjetivo) em sua alimentação, em seu modo de tratar com as pessoas, em sua atitude perante a Religião, a Filosofia e a Ciência, em sua maneira de vestir, em seu gosto musical, artístico, literário, etc. 

                                Um governo conservador (substantivo) de qualquer matiz, que adote o conservadorismo como forma de sobreviver, no tempo e no espaço, trata-se de outra coisa. 

                               Culturalmente, o pensamento conservador (adjetivo) valoriza as manifestações locais e uma identidade nacional que conduza ao patriotismo, fatos estes contestados pelo comunismo, cuja doutrina internacionalista pretende a abolição do patriotismo e da identidade nacional.  

                               Nestes aspectos, indiscutivelmente, aqueles indivíduos cujos pensamentos são conservadores são os sustentáculos que toda a comunidade deve possuir, de forma a manter certos padrões de comportamento e certos valores garantidores de uma coesão social e da identificação dos indivíduos com a comunidade em que vivem, visando o seu desenvolvimento futuro e sobrevivência.

                            Esta atitude de pensar de forma conservadora, no meu modo de ver, possui uma componente psicológica intrínseca aos indivíduos, além de ser uma atitude racional e inteligente demonstrada, felizmente, por inúmeros representantes da raça humana.

                               O pensamento conservador, portanto, enquanto adjetivo, pode ser aplicado a qualquer ramo do conhecimento e a qualquer atividade humana. De forma pejorativa, como é usualmente feito pela esquerda, o adjetivo é, comumente, substituído pelo substantivo.

                               Como substantivo, o vocábulo conservador distingue aqueles que são partidários da política conservadora, os que defendem a ordem existente, qualquer que seja a sua natureza política. Nesta perspectiva, podemos falar em esquerda conservadora: qualquer ordem institucional pode ser conservadora. Trata-se de garantir a permanência da situação a partir da posição que os agentes políticos ocupam.

                                 Ao tentar apresentar a si mesma como progressista, de vanguarda e uma alternativa, política e ideológica revolucionária para o pensamento conservador (adjetivo), a esquerda busca esconder seu conservadorismo (substantivo). Assim, o conservadorismo, como adjetivo, significando pensamento conservador, que consiste em algo benéfico para os destinos da raça humana, porquanto se traduz como uma forma de pensar e de agir antitemerária, é confundido, de forma proposital, com o conservadorismo político, como substantivo; este sim, antidemocrático e que conduz às ditaduras e aos regimes autocráticos. Normalmente os que possuem um pensamento conservador são pessoas que pensam e agem de forma democrática. 

                                 Quem não pensa e nem age de forma democrática são os progressistas e os revolucionários, que não hesitam em se utilizar de métodos brutais e violentos para alcançar o poder e, quando atingem seus objetivos, passam a apresentar comportamentos substantivamente conservadores.

                                 Depois de conquistados os seus objetivos, a esquerda sempre apresenta seu lado substantivamente conservadorístico (diferente de adjetivamente conservador e, até então, desconhecido do público em geral), fazendo tudo para conservar-se no poder, mesmo a custa de roubos, assassinatos, traições, etc., conforme a História tem demonstrado, desde o fatídico ano de 1917 quando o comunismo se implantou na Rússia.

                               A título de simples curiosidade eu menciono a continuação a quantidade estimada de mortos, vitimados para a implantação do comunismo em diversos países do mundo:

                                    China 65 milhões; União Soviética 20 milhões; Camboja 2 milhões; Coréia do Norte 2 milhões; Países Africanos 1,7 milhões; Afeganistão 1,5 milhões; países comunistas do leste Europeu 1 milhão; Vietnã 1 milhão e América Latina 150 mil.

                                        Possuir um pensamento conservador seria, portanto, a atitude racional e inteligente de qualquer ser humano, ao basear-se em tudo aquilo já testado ao longo da história e que, evidentemente, tenha dado certo e ajudado a humanidade a se precaver, proteger e progredir.

                                 O contrário disto seria possuir pensamento que conduzisse a uma atitude temerária, atitude esta que os dicionários definem como: 

1. Aquela que pode conter risco; em que há perigo; arriscado ou perigoso: viajava sempre por temerários caminhos.

2. Aquela que demonstra temeridade; excesso de ousadia: seu comportamento temerário causou a demissão de alguns funcionários.

3. Aquela muito audaciosa; imprudente.

4. Aquela sem fundamento: julgamento temerário.


                                 A esquerda tradicional sempre iniciou seu processo de convencimento e de aliciamento destacando a temeridade de suas ações. Há algum tempo, no Brasil e em outros países, os partidos comunistas eram proibidos, bem como os partidos de natureza fascistas e nazistas, e viviam na clandestinidade. Muitos jovens, em busca de aventura, foram aliciados, pois, afinal, os comunistas estavam indo em busca do “paraíso terrestre”, contra o ‘Establishment’ (ordem ideológica, econômica e política que constitui uma sociedade ou um Estado), dominante no Brasil e nos demais países capitalistas, com todos os riscos que isto representava. 

                               Tal proposta despertava o sentimento de aventura comum à maioria dos jovens ainda não inseridos no mercado de trabalho e daí surgiam os ativistas ideológicos, panfletários das portas das fábricas; os militantes políticos nas universidades e no estamento estatal; os movimentos campesinos que desejavam a posse da terra, tão somente, para vendê-las e auferirem alguma renda para gastar com bens de consumo.

                                  Surgiram, assim, os partidos políticos de natureza comunista, de fracos resultados nas urnas.  Surgiram, a seguir, as guerrilhas urbanas e rurais. Pelo menos em nosso país, os movimentos campesinos, que se instalaram, jamais produziram qualquer tipo de produto agropecuário para ser comercializado, após invadirem e se apropriarem de terras públicas e de propriedades privadas que, quando não totalmente destruídas de forma vingativa, eram vendidas a terceiros.

                               Posteriormente, os ideólogos comunistas ao verem o fracasso das guerrilhas urbanas e rurais, passaram a adotar os ensinamentos de Antônio Gramsci (1891-1937), ideólogo marxista italiano que propunha a tomada do poder pela via pacífica. Seus objetivos eram fazer com que a esquerda obtivesse a hegemonia na sociedade civil; obtivesse a hegemonia na sociedade política (Estado); estabelecesse o domínio do intelectual coletivo (partido classe) e silenciasse os intelectuais independentes.

                            O método que deveria ser utilizado, segundo Gramsci, seria o de realizar a transformação intelectual e moral da sociedade pelo abandono de suas tradições, usos e costumes, mudando valores culturais de forma progressiva e contínua; introduzindo novos conceitos que, absorvidos pelas pessoas, criariam o denominado senso comum modificado, gerando uma consciência homogênea construída com sutileza e sem aparente conteúdo ideológico, buscando a identificação com os anseios e necessidades não atendidas pelo poder público.

                                 Assim seria estabelecido o desejo de mudança em direção a um mundo novo, com a sociedade controlada através dos mecanismos de uma chamada democracia popular, onde os pensadores livres, temendo o rótulo de retrógrados, de alienados ou de conservadores, se submeteriam a uma prisão sem grades calando a voz de divergência existente dentro de si e se deixando, assim, vencer pelo senso comum modificado, de inspiração e natureza marxista. 

                                Este senso comum modificado prosseguiria intoxicando a sociedade (Igreja, Família, Escola, Governo e Mídia) sob a égide do Estado, sendo usado para reduzir e suprimir a capacidade de reação individual e coletiva.

                                       Nesse momento, segundo Gramsci, estaria construída a base para a tomada do poder e a consequente implantação do Estado Socialista. Aqui, no continente americano do sul, do chamado Socialismo Bolivariano.

                                 Vejam, pois, meus caros amigos, que é importante distinguir o pensamento conservador individual, enquanto adjetivo, do conservadorismo político, enquanto substantivo, dos governos e dos partidos no poder, que têm contra si também os partidos de oposição.

                                Todos os partidos que chegam ao poder, notadamente os de ideologia marxista, adotam o conservadorismo como arma para se perpetuarem no tempo e no espaço. Como alguém já disse: todo revolucionário de esquerda, que se apresenta como progressista e anticonservador, torna-se adepto do conservadorismo, após sua revolução ser bem sucedida.

                                      Muitos cidadãos que pensam de forma conservadora opõem-se às políticas que se dizem reformistas e que desejam fazer do país um laboratório para testes de teorias político-ideológicas e econômicas, muitas vezes, já tentadas e mal sucedidas em outros países, todavia, democraticamente, aceitam os resultados das urnas. O contrário é que normalmente não ocorre. A esquerda quando perde nas urnas não aceita esta perda e quer partir para o confronto e para a violência, de forma antidemocrática.

                                   Como já dito anteriormente, o Gramscismo, adotado pelo Foro de São Paulo como método pacífico para a implantação do socialismo bolivariano no Brasil, e em todo o continente, tentou impedir, nas três últimas décadas, a expansão do pensamento conservador, de seus defensores e de seus ideólogos em nosso país. Nas universidades públicas, em geral, os professores eram todos marxistas ou de esquerda. Professores identificados como de pensamento conservador ou de direita eram, simplesmente, afastados e ficavam sem classes de aulas.

                                 Governos, mesmo reacionários, progressistas, radicais, liberais ou reformistas, adotam sempre o conservadorismo, posição que defenderia, pois, a continuidade e a estabilidade das instituições por eles criadas ou mantidas e dos costumes por eles impostos, opondo-se a qualquer tipo de mudanças. 

                                   A meu ver, portanto, o substantivo conservador é bastante diferente do adjetivo conservador, que é uma característica inerente ao modo de pensar dos seres humanos.

                                   Partidos de tendência socialistas, comunistas, capitalistas, fascistas e nazistas são sempre conservadores depois de instalados no governo, e fazem uso do conservadorismo para se perpetuarem no poder; muito embora a esquerda procure dar a mesma conotação entre o conceito de pensamento conservador, adjetivo, e o de conservadorismo, substantivo, tentando confundir ambas as coisas.

                                   Os indivíduos cujos pensamentos são conservadores, como eleitores, procuram votar em partidos que tenham programas de governo de acordo com aquilo que pensam e que imaginam ser o melhor para si mesmo e para o seu país. Todavia, muitos partidos, de tendências marxistas, apresentam vários itens em seus programas de governo que sensibilizam eleitores conservadores em alguns de seus aspectos; porém, que estes partidos não pretendem realizar, caso cheguem ao poder.  Desejam, apenas, angariar votos de eleitores da direita.

                                 Assim, partidos de esquerda apresentam itens de interesse da direita em seus programas e vice-versa, para iludir os eleitores e angariar votos de prováveis opositores. Não existe, em nosso país, nenhum mecanismo que obrigue os partidos políticos e os candidatos a cumprirem aquilo que prometeram, por escrito ou verbalmente, antes das eleições. 

                                   O Código de Defesa do Eleitor ainda não foi inventado por nossos juristas e qualquer candidato ou partido pode mentir a vontade, sem posteriores consequências; muito embora, a meu ver, o mecanismo da eleição se trate de um contrato de fato, não escrito, onde uma das partes, o candidato, promete executar um determinado serviço (fazer leis, apresentar projetos, etc.) e o outro promete pagar seus salários e mordomias (os políticos eleitos vivem de recursos públicos obtidos com a arrecadação de impostos dos eleitores e da população em geral).

                                      Esta relação contratual, de fato, poderia ser objeto de um Código de Defesa do Eleitor, já que este constitui a parte mais fraca após a realização do pleito, muitas vezes ganho de forma fraudulenta e/ou através de propaganda enganosa.


_*/ Economista e doutor pela universidade de Madrid, Espanha.