360. A
Ditadura Legislativa – Como aprisionar uma sociedade e limitar a ação do
governo através das leis
Jober
Rocha*
Foi
Charles Montesquieu (1689-1755), uma das figuras mais importantes do iluminismo
francês, quem se propôs a organizar o modelo político que caracterizaria o denominado
Estado Democrático de Direito. Esse modelo também ficou conhecido como o modelo
dos Três Poderes e foi proposto em sua obra O’ Espírito das Leis’, publicada em
1748.
Segundo Montesquieu, no quadro geral da divisão
do poder, em qualquer república democrática (menos as comunistas), de forma
independente, o Executivo se encarregaria de gerenciar o Estado e colocar em
prática as leis aprovadas; o Legislativo se encarregaria da elaboração das leis
e o judiciário ficaria incumbido de apreciar e julgar, segundo um ordenamento
jurídico pré-estabelecido.
Conforme propunha o filósofo e pensador
francês, os três poderes mencionados deveriam ser equilibrados, de modo que
qualquer um deles, embora independentes entre si, poderia e deveria fiscalizar
os demais e todos seriam amparados e regulados por uma Constituição
Democrática, fonte popular de todo o poder. Esse modelo político começou a ser
aplicado em diversas repúblicas democráticas a partir do século XIX.
No Brasil, após a Proclamação da República
em 1889, o país que antes era uma monarquia com quatro poderes, passou a ser
uma república com apenas três, tendo perdido o Poder Moderador exercido pelo
imperador.
A constituição atualmente em vigor data de
1988 (elaborada por constituintes com viés de esquerda que nela incluíram, segundo muitos juristas, inúmeros vícios de origem) e atribuiu a cada poder brasileiro as seguintes responsabilidades:
Poder Executivo - Exercido pelo Presidente
da República com o auxílio de seus ministros de Estado, tem a responsabilidade
de governar a administração, executar as políticas e o orçamento público. O
presidente também sanciona leis aprovadas pelo Legislativo, pode vetar leis
ordinárias, ou trechos delas, e emitir Medidas Provisórias.
Poder Legislativo - Exercido pelo
Congresso Nacional, composto pela Câmara dos Deputados e pelo Senado Federal. O
Legislativo é responsável por propor e aprovar leis. É competência exclusiva do
Legislativo processar e julgar o Presidente da República, ministros de Estado e
ministros do Supremo, quando estes são denunciados.
Poder Judiciário - Exercido por tribunais
de diversas instâncias, cuja instância máxima é o Supremo Tribunal Federal.
Exerce função de controle, analisando e julgando suspeitas de descumprimento de
leis. Os juízes são responsáveis pela condenação e absolvição de réus e por
decidir sobre conflitos entre grupos da sociedade. O Supremo é considerado o
órgão judicial responsável por fiscalizar o cumprimento dos dispositivos
previstos da Constituição.
Por sua vez, a chamada Proposta de Emenda
à Constituição - PEC, que tem sido frequentemente aplicada em nosso país,
consiste em uma modificação da constituição, resultando em mudanças pontuais do
texto constitucional, que são restritas a determinadas matérias, não podendo
ter como objeto a abolição das chamadas cláusulas pétreas (forma federativa de
Estado; voto direto, secreto, universal e periódico; separação dos Poderes; e
os direitos e garantias individuais dos cidadãos).
A proposta de emenda à constituição tem
que ser apresentada por um terço dos senadores ou dos deputados. Pode ser
também apresentada por mais da metade de todas as assembleias legislativas e
pelo Presidente da República.
Inicialmente, após apresentada, é
observada a sua admissibilidade, isto é, se não viola as cláusulas pétreas.
Depois é analisado o seu mérito. A seguir é votada, bastando três quintos dos
votos favoráveis dos senadores ou dos deputados. Aprovada em uma das casas
legislativas (senado, por exemplo), segue para a outra (Câmara dos Deputados).
Aprovada pelas duas casas é produzida, então, uma Emenda à Constituição que
entra logo em vigor com força de lei, não podendo ser vetada pelo Presidente da
República. A partir de então o executivo e o judiciário têm que a aceitar e
fazer cumprir a referida emenda. Com isto, depois de algum tempo a constituição passa a ser uma verdadeira colcha de retalhos, bastante diferente da colcha original que cobria a nossa soberania, organização político administrativa e econômica; bem como, as liberdades civis.
Ora, estabelecida uma república
democrática constitucional, as cláusulas pétreas só são mudadas por regimes
autoritários que, muitas vezes, suprimem o Congresso Nacional ou o mantém sob
seu inteiro domínio, o mesmo ocorrendo com o judiciário.
Todavia, também pode ocorrer o contrário,
isto é, um congresso autoritário, aliado ou não ao judiciário, manter sob
controle o executivo. Isto é feito mediante o chamado parlamentarismo branco.
Nos governos brasileiros anteriores
vigorava o presidencialismo de coalizão, isto é, aquele em que o presidente
para formar uma base governista no parlamento, loteava os ministérios, os
cargos de direção das empresas estatais e demais cargos públicos de direção
(com suas verbas) entre os partidos políticos. Era o chamado “toma lá, dá cá”.
Jair Bolsonaro, um presidente honesto e
eleito pelo povo brasileiro para acabar com a corrupção generalizada,
principalmente entre políticos, partidos políticos e empreiteiros de obras
públicas, conforme sobejamente denunciado pela Operação Lava a Jato, que
condenou diversos deles, não aceitou fazer parte deste jogo, tendo nomeado
técnicos para os cargos técnicos do governo, sem atender à demanda costumeira
dos partidos políticos.
Estes, sem poder mais dominar os cargos
públicos e as verbas que tais cargos movimentavam, partiram para o chamado
parlamentarismo branco, buscando levar as verbas do orçamento da união para o
legislativo e retirando poder do executivo, mediante leis e propostas de emenda
constitucional.
Assim, ao votar a Lei de Diretrizes
Orçamentárias o congresso impôs a obrigatoriedade de pagamento, pelo executivo,
das chamadas emendas impositivas (emendas propostas pelos parlamentares para as
quais teria de haver dinheiro no orçamento) e também definiu que caberia aos
parlamentares indicar a ordem dos desembolsos e a destinação dos recursos
públicos. Aos ministérios só caberia liberar as verbas.
O trecho desta lei que mencionava isto,
evidentemente, foi vetado pelo presidente da república, em virtude de o regime
brasileiro vigente ser presidencialista e não parlamentarista, onde tal medida
poderia caber.
O Ministro Chefe do Gabinete de Segurança
Institucional da Presidência, general Heleno, ao falar sobre o assunto, assim
se pronunciou: “Isso, a meu ver, prejudica a atuação do Executivo e contraria
os preceitos de um regime presidencialista. Se desejam o parlamentarismo, mudem
a constituição”. Em cerimônia no Palácio da Alvorada, o general teria
comentado, ainda: “O congresso faz chantagem para ficar com esses R$ 30 bilhões
do orçamento”.
Os parlamentares, desejam com essa manobra
apoderar-se de R$ 30 bilhões de um total de R$ 80 bilhões do orçamento da
união, para ser gasto por eles mesmos e pelas bancadas junto às suas bases
eleitorais, isto é, em seus Estados e Municípios, sem nenhum controle. O
legislativo deseja, assim, o controle de parte substancial do orçamento da união
para indicar onde deve ser gasto e, até mesmo, selecionar quais as empresas que
fariam as obras que fossem indicadas como beneficiárias dos recursos.
Conhecendo o nosso passado recente, onde a
Operação Lava a Jato desnudou o submundo das maquinações entre políticos, seus
partidos e empreiteiros públicos, julgou e condenou diversos deles, dos quais
muitos conseguiram livrar-se das grades até agora, graças a casuísmos judiciários
das altas instâncias, é um grande risco para o futuro do país está medida que o
parlamento quer ver aprovada, notadamente por constatarmos que grande parte dos
nossos políticos responde a processos judiciais por malversação de recursos
públicos, muitos deles parados na justiça em virtude de seus foros
privilegiados.
Vejam, pois, meus caros leitores, que quando
temos um país democrático, republicano, com políticos e autoridades patrióticas
que só pensam no bem do país e no de sua população, estamos, sem dúvida alguma,
no melhor dos lugares e no melhor dos mundos, como costumava dizer o físico e
matemático alemão Gottfried Leibniz em seu trabalho de 1710, “Essais de
Théodicée sur la bonté de Dieu, la liberté de l'homme et l'origine du mal. Todavia,
não é isso que vemos em nosso país. Muitos políticos egoístas pensam apenas em
si, em seus grupos e em seus partidos. Assim, na impossibilidade, até agora
apresentada, de mudarem a constituição para implantarem o parlamentarismo, onde
os políticos seriam os donos autocráticos do poder, contentam-se em impedir o
presidente de governar, estabelecendo leis e propostas de emenda constitucional
que tolhem os movimentos deste e sua capacidade de realização, aprisionando-o
em uma teia legal da qual não consegue se libertar.
No primeiro ano de governo de Jair Bolsonaro o congresso já derrubou nove de suas medidas provisórias. As medidas valeram apenas durante quatro meses, sendo, a seguir, derrubadas pelo parlamento, gerando reflexos na vida dos cidadãos e empresários e criando um cenário de instabilidade jurídica. Esta é outra maneira de dificultar ou impedir o governo de agir.
O povo, desconhecendo o que se passa nos bastidores e clamando por mudanças, incentivado pela grande mídia hoje na oposição por ter perdido as verbas públicas que a sustentava, passa a considerar o presidente fraco e omisso por não conseguir implementar as reformas que são necessárias.
No primeiro ano de governo de Jair Bolsonaro o congresso já derrubou nove de suas medidas provisórias. As medidas valeram apenas durante quatro meses, sendo, a seguir, derrubadas pelo parlamento, gerando reflexos na vida dos cidadãos e empresários e criando um cenário de instabilidade jurídica. Esta é outra maneira de dificultar ou impedir o governo de agir.
O povo, desconhecendo o que se passa nos bastidores e clamando por mudanças, incentivado pela grande mídia hoje na oposição por ter perdido as verbas públicas que a sustentava, passa a considerar o presidente fraco e omisso por não conseguir implementar as reformas que são necessárias.
E assim, com estas manobras de bastidores,
aqueles parlamentares praticantes da velha política do “É dando que se recebe”,
buscam dificultar o trabalho do Poder Executivo para obter o insucesso do novo
governo, com vistas ao eventual impeachment do presidente e a próxima eleição de
alguém que seja totalmente confiável, de acordo com os baixos padrões destes políticos, e disposto
à tradicional negociação de cargos e de verbas públicas.
_*/
Economista e doutor pela Universidade de Madrid, Espanha.
A Continuação de 1988 tem vícios de origem
ResponderExcluirAnálise clara, inteligente e sucinta. Parabéns.
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
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